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Da Redação
Publicado em 1 de agosto de 2022 às 05:00
A série de assaltos a bares e restaurantes durante o segundo trimestre deste ano em bairros nobres da capital é apenas continuidade do número de roubos em estabelecimentos comerciais em 2021. Segundo dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, lojas, mercados, shoppings entre outros exemplos tiveram alta de 64,2% nos registros de roubo na Bahia. Foram registradas 1.795 ocorrências do tipo em 2021, contra 1093 assaltos a pontos comerciais em 2020.>
A gráfica XColorum, no Canela, já foi assaltada cinco vezes, sendo duas apenas neste ano. O prejuízo para compra, instalação e manutenção da fiação que liga os equipamentos já chegou a R$ 5 mil, isso sem contar com o reembolso que a gráfica teve de fazer para os clientes que não receberam as encomendas devido ao assalto. >
Proprietária do estabelecimento, Zenab Mohamad enumera as perdas. “Temos que parar nossos maquinários, ficar sem atender clientes, desembolsar fortuna para comprar fiação cara, chamar eletricista, pedreiros e devolver 50% do que o cliente já tinha pagado na gráfica. O movimento está muito parado depois do último ocorrido, foi no período próximo do São João. Caiu em média 30%”, afirma. >
A tendência é mudar de bairro por conta dos constantes roubos. Sócia da XColorum, Graça Santiago diz que a ronda acontece normalmente, mas a polícia não visitou a gráfica nas duas primeiras ocorrências deste ano. Ela também é membro de uma associação que tem o intuito de aumentar a segurança do bairro, mas reitera que não tem a assistência devida. Conforme mostra o Anuário Brasileiro de Segurança a Bahia ainda está em décimo lugar entre os estados com mais registros de roubos em estabelecimentos comerciais. O número estadual ainda segue tendência de alta vista nos registros do Brasil. O país teve 46.661 assaltos em 2020 e 50.055 em 2021. É um crescimento de 7,2%.>
BARES E RESTAURANTES >
Coordenador do grupo de trabalho de segurança pública no Conselho Consultivo de Entidades Empresariais da Bahia (Consempre), Luiz Henrique do Amaral afirma que a violência tem impacto na circulação de pessoas, sobretudo, no comércio de rua e setor de bares e restaurantes. “Acaba afetando como um todo a atividade comercial. Em todos os aspectos. Tem pesquisas que indicam algo de 20% a 30% de impacto na circulação de pessoas e negócios por consequência [da insegurança], diz se referindo a levantamento informal feito pela Consempre. >
Dono do restaurante Di Lucca, na Pituba, Lucas Presas conta que teve uma queda de 30% da clientela durante os meses seguintes a abril, quando o estabelecimento foi invadido por assaltantes. O empresário diz ainda estar recuperando o movimento, que cresceu apenas 10% após o episódio. Ou seja, ainda há saldo negativo de cerca de 20% em relação a antes do crime. >
O empresário acredita que a ação da polícia no bairro tem reanimado a movimentação dos estabelecimentos comerciais. “O mercado inteiro teve queda, o movimento está voltando agora. O trabalho da polícia foi bem efetivo, não escuto mais relato [de assalto]”, elogia. >
A Rotina também não tem sido fácil para a proprietária de uma loja de bolsas em Itapuã. Apenas esse ano o estabelecimento já foi assaltado duas vezes. Por medo de retaliações, ela preferiu não divulgar seu nome nem o nome do comércio, mas conta que já pensou em fechar o local por causa da insegurança e dos prejuízos que sofreu. “A gente fala para que a situação melhore, porque é duro montar um negócio durante anos para depois ver parte disso se perder em minutos. Por aqui, o medo tem andado junto com o prejuízo”, conta a empresária.>
Já um dono de bar na Barra que pediu para não ser identificado conta que, apesar do bairro não ter registros de roubos durante a onda ocorrida neste ano, a sensação de insegurança dos clientes afetou a movimentação do estabelecimento. Ele conta que, a depender do dia, a queda da clientela era de 30% a 50%. Para resolver, foi preciso contratar um segurança a fim de dar confiança dos consumidores. >
“Não teve um incidente na Barra, mas tive impacto negativo nas minhas vendas quando começaram a acontecer aqueles assaltos e tomar proporção de informação dentro da mídia e sociedade. Contratei por período de 60 dias um segurança para ficar na porta do bar. Com a colocação do segurança, coincidentemente ou não, as vendas foram retomando para um patamar normal”, afirma. >
No centro da cidade, o proprietário de uma loja de artigos de festas tem a mesma sensação de constante insegurança. Sem se identificar, ele descreve os furtos e assaltos como “normais” de tão corriqueiros na região. Na tentativa de alcançar alguma tranquilidade, ele conta com equipes de segurança particulares. >
“Aqui acontece sempre, o furto aqui é normal. Já perdi a conta de quantas vezes os clientes foram roubados, porque não é só o assalto aqui na loja que acontece. Meu estabelecimento já foi alvo de bandidos três vezes, uma vez esse ano. Isso espanta o cliente, o que só piora quando eles chegam aqui e são furtados na porta”, lamenta o comerciante>
Para Amaral, a alta de roubos mostra que a fórmula da segurança pública não estava tornando o ambiente seguro, sendo necessário revisão nos protocolos. Afinal, ele evidencia que o cenário do setor comercial é apenas reflexo da estrutura social. >
“Esse impacto nos estabelecimentos comerciais nada mais é que espelhamento da sociedade. [O comércio] é onde tem concentração de valores algo que a marginalidade procura e, ao mesmo tempo, encaixa na fragilidade que os estabelecimentos acabam possuindo diante desse quadro”, destaca. >
Apesar do aumento registrado em 2021, além dos casos que repercutiram neste ano, o especialista conta que a retomada do público tem acontecido de forma gradativa. O retorno do público é diretamente proporcional à sensação de segurança sentida. Embora o quadro ainda esteja “delicado”, ações da polícia ajudaram na reconstrução dos modelos de negócio, avalia. >
POLICIAMENTO>
Procurada pela reportagem, a Secretaria da Segurança Pública (SSP), confirmou que houve aumento. Segundos dados da entidade, houve 1.007 roubos a estabelecimentos comerciais em 2020 e 1.781 em 2021. É um aumento de 76,8%. A fim de garantir segurança nos estabelecimentos comerciais, a Polícia Militar da Bahia desenvolveu a Operação Acauã em maio deste ano. Os bairros em foco são aqueles com maiores índices de ocorrências registradas. O tenente-coronel Lucas Palma, do Comando Regional Atlântico, afirma que a ação influenciou a queda de invasões a estabelecimentos. “[Ao comparar com] aquela frequência que estava tendo, diminuiu muito. O que era rotineiro a Operação Acauã travou. Passamos cerca de 30 dias zerados sem ocorrência. Eventualmente passou a acontecer fato esporádico, mas estamos com a mesma determinação [para enxugar os crimes]”, afirma.>
A Polícia Civil também está envolvida em políticas anti-roubo em pontos de comércio, como bares e restaurantes. Através da Operação Visão, desenvolvida para combater crimes contra o patrimônio, existe ações em bairros, sobretudo, com maior movimento de pessoas à noite, afirma em nota. "Durante a Visão, além do trabalho habitual, motoristas por aplicativo e motociclistas entregadores também são alvos de abordagens, não só para apurar a possibilidade de envolvimento destes profissionais em crimes, como para identificar situações em que estejam sendo vítimas", comunica a nota, lembrando ainda a Operação Noite Segura, cujo objetivo é realizar "ações de inteligência e investigação na noite soteropolitana".*Com orientação da chefe de reportagem Perla Ribeiro e colaboração de Emilly Tifanny Oliveira>