Castelo Branco é território africano

Projeto Estúdio África promoveu sessão de fotos ao ar livre neste domingo (8) e inseriu moradores do bairro no cotidiano de cidades africanas

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  • Raquel Saraiva

Publicado em 8 de outubro de 2017 às 18:27

- Atualizado há um ano

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Para muita gente, o domingo é dia de descanso. Mas não se você morar em Castelo Branco. No bairro, todo domingo é dia de feira. E dia de engarrafamento, ruas movimentadas, lojas abertas, carro de som e barracas montadas na calçada vendendo de carne a bolo. E neste domingo (8) um estúdio fotográfico montado na praça Praça Mestre Gude agitou ainda mais o bairro!

Os modelos eram os próprios moradores e frequentadores do bairro: bastava chegar, escolher o fundo da foto e posar livremente para as lentes da fotógrafa Arlete Soares. Ela contou que pouco interferiu para as fotos e elogiou as performances “Foi maravilhoso, incrível. O povo é sempre disponível e genial”. “O evento envolve imagem e som e tem como protagonista as pessoas comuns, que fazem esse bairro acontecer”, definiu Cristina da Mata, diretora da escola Escola Municipal Dona Arlete Magalhães, onde as fotos serão expostas.

O projeto Estúdio África contou com três cenários artísticos inspirados em paisagens de cidades do continente africano. A ação foi organizada pela antropóloga Goli Guerreiro e financiada pela Prefeitura de Salvador, através da Fundação Gregório de Mattos. “Tá muito lindo isso aqui, eu amo a África e carrego ela no meu sangue”, conta a doméstica Maria Helena de Sousa, 67 anos, moradora do bairro. “Os murais parecem muito com Salvador, as cores são as mesmas”, ela observa, após participar da sessão de fotos.

Os moradores e frequentadores de Castelo Branco aprovaram o projeto “Eu achei o máximo, mostra a nossa cultura, a nossa beleza, o que a gente é. E mostra que na favela não tem só violência: tem muita cultura, muita arte e tudo de bom”, opina a estudante Samara Martins, 17 anos.

O vendedor ambulante Jonatas Brandão, 24 anos, trabalhava na praça quando resolveu olhar de perto os murais e acabou posando para foto.  “O que me atraiu foi o som! Tava tocando um reggae, que todo baiano gosta”, disse. A música vinha do carrinho multimídia de Ana Dumas, auto-intitulada “Animadora, DJ e Mc” do evento. No repertório da artista, músicas africanas, além de músicas baianas dos blocos afro e até o reggae de Edson Gomes, colocaram muita gente para dançar em volta do carrinho e foram o convite perfeito para a aproximação dos modelos por um dia. O carrinho multimidia de Ana Dumas também esteve presente em Castelo Branco (foto/Mauro Akin Nassor) Antônio César, mais conhecido no bairro como Paicel, se aproximou da praça para saber o que era “aquele fuzuê” e quase chamou mais atenção que os murais. Homem alto, forte, usando vestido, colares, turbante e sandálias de pelúcia com estampa de onça, ele contou que com o figurino busca chamar atenção para o feijão que vende no bairro. “Todo domingo ando assim, eu sou folclórico. Queria ter colocado uma saia mais curta, mas minha esposa não deixou”, contou ele, que atua como “motorista, vigia, eletricista e o que pintar” de segunda a sábado.

Paicel explica o que vê nos murais: “Demonstra a cultura baiana. Vejo a negritude, o acarajé, a Feira de São Joaquim, caldo verde, uma ladeira no Pelô com mulheres fazendo tranças, os casarões históricos...”. Quando descobre que os painéis retratam na verdade cotidiano de cidades do continente africano, ele se surpreende com a semelhança. “Arrepiei até a espinha dorsal agora!”, diz, mostrando os pêlos do braço eriçados.

“A gente se vê dentro dos murais, a gente faz parte disso”, explica Goli Guerreiro, mentora do projeto. Ela explica que o sentimento de pertencimento e o gosto pela cultura da África, além da semelhança entre a cidade e o continente levaram à ideia de fazer as fotos em Salvador. A utilização de Castelo Branco como palco para a ação foi sugestão do artista plástico Eder Muniz, morador do bairro, mais conhecido como o grafiteiro Calangos. Ele também foi autor dos fundos decorativos utilizados no projeto. O artista não acompanhou a ação por estar em New York, nos Estados Unidos, a trabalho.

As fotos vão fazer parte de uma mostra, com curadoria de Goli Guerreiro, no Espaço Cultural Barroquinha, dia 21 de outubro, e no dia 27 na Escola Municipal Dona Arlete Magalhães, em Castelo Branco. Na ocasião das exposições, os retratados terão acesso à sua fotografia impressa. Um minidocumentário com direção de Diogo Nonato, que registrou o processo da criação dos fundos decorativos e a tomada de fotos, também será apresentado.