'Com ele se foi um pedação de mim', desabafa um dos parentes dos 12 mortos da Vila Moisés

Audiência pública discutiu a federalização do caso

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  • Bruno Wendel

Publicado em 20 de março de 2017 às 20:13

- Atualizado há um ano

A voz e as mãos tremiam. As lágrimas corriam sem parar. “Com ele se foi um pedação de mim”, desabafa uma mulher. Foi preciso um copo com água e uns dez minutos para ela, parente de Evson Pereira dos Santos, 26 anos, se recompor emocionalmente. Ela foi uma das sete pessoas parentes dos 12 mortos da Vila Moisés presentes na audiência pública realizada nesta manhã, 20, para discutir a federalização do caso – a possiblidade de uma nova investigação, mas realizada pelo governo federal.

“A dor imensa, difícil de mensurar. Sonho com ele todos os dias. Todo mudo sente a falta do sorriso de Everson. Era muito brincalhão, assim era conhecido. Ele deixou um cachorro que até hoje espera por ele. Chora pelos quatro cantos. Se sente o cheio do Kaiak, fica desnorteado, indo de um lado para o outro. Era o perfume que ele usava”, disse a parente de Everson.“Vem aí uma lembrança dolorosa. Dia 14, Semana Santa, ele faria 28 anos. É muito difícil. Até hoje não acredito que ele não está entre nós”, complementa.O sofrimento também está presente nos familiares de Caique Bastos dos Santos, 16, um dos mortos. “Pesava 81kg, hoje tenho 52kg. Estou com depressão, fazendo tratamento com um psicólogo. Sofro por não ter conseguido fazer nada. Escutei ele pedindo socorro e quando abri a porta, a casa estava rodeada de policiais e não o vi mais ”, conta.EncontroA audiência começou por volta das às 9h e durou aproximadamente três horas e meia. “Essa audiência é importante por três pontos: o primeiro é uma forma de mostrar a inércia do estado em relação ao caso, para mostrar às famílias das vítimas que elas não estão sozinhas, por fim, para que o Estado repense essas matanças daqui para frente porque estamos de olho”, declara o presidente do Grupo Reaja ou Será Morto, Reaja ou Será Morta, Hamilton Borges. Audiência discutiu a federalização do caso (Foto Betto Jr./CORREIO)Enquanto não há um parecer sobre a mudança de competência de investigação, o Ministério Público Estadual e a Defensoria Pública pediram a continuidade do processo ao Tribunal de Justiça (TJ). “A juíza pulou etapas e resolver anular o processo. Ela não ouviu as partes. Ou seja, não escutou os parentes das vítimas e os sobreviventes e nem os advogados dos policiais”, diz o defensor público Maurício Saporeto, subcoordenador da Especializada Criminal e Defesa de Execução Penal da Defensoria. Segundo ele, a continuação do processo será julgada pelo desembargador Eserval Rocha.O CORREIO procurou o TJ e os Ministérios Públicos Estadual e Federal para comentar a federalização do processo. Por meio de sua assessoria, o MPE informou que se posicionou perante ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) sobre o pedido e irá aguardar retorno do órgão antes de se pronunciar a respeito. Já o TJ e o Ministério Público Federal não comentaram o caso.Segundo o STJ, o deslocamento de competência para a Justiça Federal pode ser solicitado nas hipóteses de grave violação de direitos humanos com a finalidade de assegurar o cumprimento de obrigações decorrentes de tratados internacionais de direitos humanos dos quais o Brasil seja parte. No caso específico da operação policial que culminou com os 12 homens mortos na Vila Moisés, o STJ informou que o relator do processo é o Ministro Reynaldo Soares da Fonseca e que "no momento, o processo está em fase de juntada e análise de informações, a fim de que possa ser instruído".

Apoio à federalização

Na sua fanpage no Facebook, a Campanha Reaja ou Será Morto, Reaja ou Será Morta traz vídeos com depoimentos de militantes de movimentos sociais e acadêmicos se posicionando a favor da federalização do processo.

*Colaborou Juliana Montanha