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Da Redação
Publicado em 25 de outubro de 2017 às 03:10
- Atualizado há 2 anos
Uma evolução emblemática do acordo global do clima de 2015 foi reconhecer que o reflorestamento em grande escala é essencial e uma das melhores relações custo-benefício para reduzir a concentração de gases de efeito estufa (GEE) na atmosfera. Alavancados por essa percepção, compromissos de reflorestamento ao redor do mundo chegam a 350 milhões de hectares até 2030, incluindo o Desafio de Bonn e a Declaração de Florestas da Cúpula de Clima de Nova Iorque. O papel do Brasil é o de reflorestar 12 milhões de hectares, como expressou em suas metas no Acordo do Clima.>
A localização tropical dá a nosso país uma vantagem competitiva, devido à maior velocidade no crescimento das árvores. Nesse contexto, o Brasil pode se tornar protagonista na produção sustentável de madeira de reflorestamento, mas precisamos desenvolver modelos economicamente viáveis, que priorizem a biodiversidade e possibilitem a restauração das funções do ecossistema.>
Como as árvores ajudam o clima? Uma árvore adulta, com uma copa de 20 metros de diâmetro, irriga a atmosfera com mais de mil litros d’água por dia. A Amazônia, sozinha, produz 20 bilhões de litros diariamente. Eles alimentam o rio Amazonas (responsável por 20% da água doce do planeta) e formam os chamados “rios voadores”, que transportam chuva para as regiões Centro-Oeste, Sudeste e Sul.>
São da Amazônia também as cerca de 6 milhões de toneladas de madeira consumida por ano no Brasil na construção civil e movelaria, mas ainda seguimos o modelo extrativista do século 16, responsável pela destruição quase total da Mata Atlântica. O mercado mundial de madeira, de acordo com a FAO (a Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura) movimenta mais de 500 milhões de toneladas anuais e cresce, desde a década de 1980, a uma taxa real anual de 3%. A demanda global é em função do aumento da população e da renda, mas a participação brasileira ainda é irrisória — pouco mais de 400 mil toneladas por ano, pois o comércio internacional restringe madeira de florestas naturais.>
Renovável e carbono neutro, a madeira deve aumentar sua participação na construção civil. Enquanto a produção de uma tonelada de aço emite quase duas toneladas de GEE e a produção de uma tonelada de concreto emite outra tonelada desses gases, a produção de uma tonelada de madeira retira em média meia tonelada de GEE da atmosfera. O uso de madeira tem crescido no Hemisfério Norte com o desenvolvimento de novos materiais compostos, como o Glulam, placas coladas de alta resistência e à prova de fogo usadas em estruturas de casas e prédios.>
A ciência ecológica também avançou muito nos últimos quarenta anos. Novas tecnologias comprovam que a floresta é um sistema complexo, que integra plantas, animais, solo e microrganismos em uma relação de mútua dependência e cooperação. A floresta plantada não é diferente. Estudo recente, publicado por Daniel Piotto, Dylan Craven, Florencia Montagnini e Federico Alice, com base em dados de dezesseis anos de pesquisa em áreas tropicais, confirma que uma floresta plantada com objetivos comerciais, mas com múltiplas espécies, desenvolve-se melhor, mais rapidamente e com maior resiliência a eventos climáticos do que plantios monoculturais.>
O plantio de eucalipto era visto como o único comercialmente viável, pela alta velocidade de crescimento. O que muitos ignoram é que quando chegou ao Brasil, há mais de cinquenta anos, sua produtividade era um quarto da atual. A performance atual é resultado de melhoramento genético. Por que esperar, então, que as árvores das nossas florestas venham “prontas” para plantio em escala comercial?>
No sul da Bahia, a Symbiosis está domesticando 22 espécies madeireiras da Mata Atlântica de alto valor comercial, com a implantação de áreas de População Base e reserva genética “Ex-situ” para a conservação dessas espécies. Todas têm potencial de aumentar a produtividade no médio prazo, e aquelas com produtividade superior já estão sendo clonadas, constituindo o primeiro programa de clonagem de árvores nativas em nível comercial.>
Desenvolvemos ao longo de dez anos um sistema florestal que combina espécies de crescimento moderado, chamadas “fins”, com outras de crescimento rápido e exóticas tropicais, chamadas “acessórias”. A função das últimas é preparar o microclima com um sombreamento rápido, reduzir o custo no controle de plantas invasoras e antecipar receitas. As espécies fins são mais valiosas, têm ciclos longos e, em geral, precisam crescer à meia sombra.>
A viabilidade do negócio é comprovada por uma taxa interna de retorno (TIR) de 11,7% ao ano. Com melhoramento genético e ganho de escala, estima-se que salte para 17,3% anuais. Esse resultado foi auditado, com projeções de produção calculadas por consultoria externa, baseada em dados de plantios próprios e em literatura acadêmica. Para o cálculo de rentabilidade, foram utilizados o preço da madeira com série de 20 anos e estimativas do valor da terra nos últimos 10 anos. >
Seguindo a linha de trabalho de análise de modelos para replicação com sucesso, o Projeto Verena - Valorização Econômica do Reflorestamento com Espécies Nativas vem acompanhando a Symbiosis, entre outras experiências de ponta. Ele é uma iniciativa do WRI Brasil e da União Internacional para a Conservação da Natureza (UICN), com apoio financeiro da Children’s Investment Fund Foundation. Até o fim deste ano, os dados e oportunidades de investimento serão publicados.>
O cultivo de florestas plantadas com espécies nativas pode posicionar o Brasil entre os grandes produtores mundiais de madeira de reflorestamento, recuperando áreas degradadas, proporcionando o retorno da fauna, melhoria da conectividade da paisagem, da conservação do solo e da água. As florestas são essenciais para o nosso futuro.>
*Bruno Mariani é sócio fundador, CEO da Symbiosis Investimentos e ex-presidente do Funbio - [email protected] - Especial para o CORREIO SUSTENTABILIDADE>