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As 'coisas de rico': saiba quem e o que movimenta o mercado de luxo em Salvador

Inspirado pelo lançamento de bestseller, especialistas apontam points do luxo em Salvador

  • Foto do(a) author(a) Thais Borges
  • Thais Borges

Publicado em 2 de novembro de 2025 às 08:00

Fasano Salvador
Fasano Salvador Crédito: Divulgação

Quando o antropólogo Michel Alcoforado estudou o luxo e o comportamento dos ricos no Brasil, ele se debruçou principalmente na alta sociedade do Rio de Janeiro e de São Paulo. Mas, na Bahia e, mais especificamente, em Salvador, o consumo desse mercado tem contornos próprios, points locais e preferências regionais.

Apesar da existência de famílias tradicionais no estado, teria sido apenas nos últimos anos que a Bahia começou de fato a absorver esse público, segundo o gestor de fortunas Rafael Bastos, co-founder e CEO da MAM, um Multi Family Office.

"Acaba que a oferta de serviços é mais moderna. Agora que Salvador está começando a ter um clube de negócios no Lativian, as primeiras lojas de carros de luxo surgiram há cinco, seis anos. Tem pessoas com patrimônio, principalmente no interior do estado, que não são acessadas por clubes de negócios ou sociais. O ultra-high-net-worth (UHNWI) tem muito menos utilizações do patrimônio do que outras cidades".

Por UHNWI, ele se refere a famílias que têm patrimônio acima de US$30 milhões. De acordo com Bastos, na Bahia, há menos indivíduos por mil habitantes do que no eixo Rio-São Paulo. Não existe um conceito fechado do quanto dinheiro é necessário para alguém ser ‘rico’. “Tecnicamente, uma pessoa é rica quando os rendimentos passivos são maiores do que as despesas inflacionadas e uma reserva de valor. Se eu gasto R$100 mil, guardo R$100 mil e meu rendimento é de R$300 mil, sou uma pessoa rica", explica Bastos.

Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o 1% da população baiana que tem maior rendimento per capita ganha R$ 14.185 mensais. Em 2024, cerca de 153 mil pessoas se enquadravam nessa parcela.

Confiança

Um aspecto é comum no comportamento dessa parcela de baianos: a confiança nas indicações de quem admiram. "Quando uma pessoa que ela considera que tem embasamento, conhecimento naquela área ou até certo poder aquisitivo alto, indica, as pessoas vão nessas indicações. Se a gente está falando do mercado de luxo, vou perguntar a quem consome o mercado de luxo, muito mais do que propaganda", avalia a publicitária e designer Sandy Najar, fundadora da marca By Sandy Najar.

Na avaliação do gestor de fortunas Rafael Bastos, na última década, Salvador passou a ter boas ofertas de espaços para clientes com esses rendimentos, especialmente no setor gastronômico. Em outros segmentos, contudo, ele ainda não vê opções como em outros estados - em especial, para esses clientes com patrimônio acima dos US$ 30 milhões.

"Nosso tíquete continua sendo muito ordinário. Um jantar nesses restaurantes premiados aqui vai ser R$300, R$400 por pessoa. São locais para alta renda, mas que os UHNWI também usam. Aqui, não tem um clube como o Fasano, em que só o título para entrar é R$1 milhão. Aqui não tem uma academia de luxo, por exemplo", cita. Em estados como São Paulo, mensalidades de academias e centros de treinamento de luxo chegam perto dos R$6 mil.

Além disso, ele diz que há diferenças de comportamento entre as famílias tradicionais e os chamados popularmente de ‘novos ricos’. "Os emergentes têm uma predisposição maior às redes sociais, às assessorias de imprensa. As famílias tradicionais ultramilionárias têm mais discrição. O que posso dizer é que esses grupos todos são de famílias já globalizadas. O impacto econômico de pegar um carro e ir para a Praia do Forte é o mesmo de pegar um avião e ir para Dubai", aponta.

Em geral, a programação cultural também é muito tradicional. "Não frequentam o Santo Antônio Além do Carmo", diz uma fonte que tem empreendimentos de luxo, referindo-se ao bairro boêmio que ganhou o coração dos alternativos e dos artistas nos últimos anos. Ainda que seja procurado por artistas de televisão até para comprar casas, por exemplo, não entra na rota da maioria dos pertencentes às classes mais altas. "Por medo de violência e sequestro, muitos fazem muitas coisas em suas casas", acrescenta a fonte.

Apesar de uma certa reclusão, em alguns aspectos, são grupos que gostam de socializar entre si. "Todos vão para a Praia do Forte. É muito comum ter casa em Praia do Forte", afirma a pessoa. "Também moram nos mesmos lugares: edifícios específicos no Horto Florestal e no Corredor da Vitória. Em geral, gostam de estar juntos". Além disso, os redutos culturais têm desde espaços tradicionais, como o Yatch Clube, quanto o Palacete Tira-Chapéu, que conta com restaurantes, charutaria, chocolateria e rooftop.

Escola ficará no segundo andar do Palacete Tira-Chapéu por Lucas Assis

Gastronomia

A chegada do Fera Palace Hotel e do Fasano ajudou a movimentar a cena gastronômica em Salvador. Os restaurantes dos dois hotéis na Rua Chile são os mais lembrados pelos especialistas ouvidos pela reportagem. São os preferidos, mas não os únicos. A eles, somam-se outros points, como os restaurantes Origem e (especialmente) o Orí, e os restaurantes Soho e Mistura. O Orí acaba sendo um dos mais lembrados pela localização privilegiada e estratégica, no Horto Florestal. Nesses locais, é possível fazer conexões e encontrar amigos e conhecidos do mesmo ciclo de forma casual.

O Preta da Ilha dos Frades é conhecido pelo ambiente acolhedor e charmoso
O Preta da Ilha dos Frades é conhecido pelo ambiente acolhedor e charmoso Crédito: Divulgação

Outra parada obrigatória para muitos, entre os hits gastronômicos, é o restaurante Preta da Ilha dos Frades, um dos mais badalados do verão. "Todos os ricos de verdade têm que ter uma lancha, com no mínimo 52 pés. Essas lanchas ficam na Bahia Marina ou no Yatch Clube. De lá, o Preta é de lei, porque quando recebem alguém de fora, eles pegam a lancha maravilhosa, reservam para o Preta e passam o dia todo lá", conta uma empresária que não quis se identificar.

Lazer e viagens

Um aspecto comum nas classes mais altas é a disposição por viagens. Alguns destinos já se tornaram tão básicos até para atividades do cotidiano, como fazer compras ou ir ao médico, que são quase uma extensão de casa - esse é o caso de São Paulo. Mas, mesmo entre os internacionais, cidades como Londres (Inglaterra) e Paris (França) já se tornaram habituais.

Esse comportamento ficou ainda mais acentuado após a pandemia da covid-19, quando a circulação entre países ficou extremamente restrita. "Viagem está uma coisa enlouquecedora. (O setor) Está competindo com tudo no mercado, porque as pessoas querem estar viajando o tempo todo. As pessoas estão viajando muito, experienciando muito", opina a publicitária e empresária Sandy Najar.

Essa circulação voltou, inclusive, a impulsionar o consumo de marcas internacionais. "Antes da pandemia, teve um movimento de valorizar muito as marcas locais. Depois, as marcas de luxo viraram febre de novo", acrescenta.

Moda Masculina

Mesmo entre os homens, a preocupação maior dos mais abastados, na moda, é ter altíssima qualidade. Não importa o preço. Foi pensando em oferecer um serviço exclusivo e personalizado que Jean Trombini se firmou como um dos principais nomes da alfaiataria na Bahia com sua marca Jean Trombini Bespoke.

"Tenho uma percepção que o mercado de luxo foi abandonado em Salvador, especificamente. Percebo que esses clientes de altíssimo padrão foram migrando para outros estados para adquirir seus produtos, porque o serviço ao cliente é impreterível num cenário de alto nível", avalia ele, que faz ternos e camisas sob medida. Desde o início da marca, em 2017, Jean atende até na casa dos clientes. Mas a maioria dos atendimentos - sempre com hora marcada - é no ateliê, que fica no Caminho das Árvores.

Ele chega a atender clientes às 23h, justamente porque lida com um público que não tem tempo de ir às lojas no horário administrativo, a exemplo de grandes empresários, políticos, médicos e advogados. "O cliente quer ter uma experiência ímpar. Quando ele chega no meu ateliê, escolhe a música que quer ouvir, o café de altíssima qualidade e temos uma adega de vinhos. O atendimento é de uma a duas horas para noivos, até um pouco mais. Acontece muito em Salvador de empresários pecarem numa coisa simples: investir muito na operação, no espaço e no marketing, mas não treinar os funcionários no atendimento".

Moda feminina

Entre as mulheres, a busca por peças de qualidade também move as compras do vestuário. Ainda assim, o comportamento é um tanto diferente da alta sociedade paulista, por exemplo. Lá, o ‘quiet luxury’ (luxo silencioso) já é mais disseminado - o que não quer dizer que as baianas gostem de exibir logomarcas em suas roupas. Ainda assim, elas querem ser reconhecidas pela qualidade do que vestem.

A designer e publicitária Sandy Najar identifica que algumas marcas são muito fortes em Salvador. "As muito tops, que representam o luxo, são Chanel, Hermès, Dior, entre outras poucas", exemplifica.

Outras são, como a Dolce e Gabbana e a Gucci, são consideradas praxe. "Loro Piana é quiet luxury, mas viralizou tanto que entrou. Quando viraliza, entra aqui. No início, quando eu lançava alguma coisa no showroom que ainda não estava se usando, precisava convencer as pessoas de que aquilo ia bombar. Hoje, minha cliente confia no que eu faço, porque consegui antecipar várias tendências. Se você perde a confiança, é dífícil ter credibilidade".

Religião e fé

A religião não deixa de ser importante para os baianos de classes mais altas. Nesse contexto, o padre Luís Simões, pároco da Igreja de Nossa Senhora da Vitória há 23 anos, desponta como uma das principais lideranças religiosas do estado. De acordo com ele, a igreja é buscada para os sacramentos iniciais - o batismo e a eucaristia -, mas também para casamentos, missas comemorativas e missas fúnebres (sétimo, 30 dias e um ano). "É muito cultural. O fato de procurar (a igreja) acho positivo. Tento acolher, porque a fé é importante. Mas se serão assíduos, é diferente. A fidelidade é muito circunstancial, falando no geral. Algumas pessoas são assíduas e tem gente que partilha, pergunta. É um número mais reduzido, mas tem", diz.

A maioria, de acordo com Simões, é tranquila e respeitosa, além de aberta. Ainda assim, há quem tente exercer algum tipo de influência, por ter uma família mais antiga. "Cada um quer segundo sua vontade, que esteja tudo à disposição. Aqui tem uma agenda cheia que nem sempre é fácil", pondera o padre. Já para os que professam religiões de matriz africana, o terreiro de candomblé mais lembrado é o do Gantois, na Federação. Pela tradição e grandiosidade, a Casa tem, entre seus adeptos, muitos representantes da alta sociedade.

Esportes e atividade física

Pode ser em clubes de corrida e triatlo, nos treinos de beach tênis, nos estúdios de pilates ou na musculação com o personal: o importante é cuidar do corpo. Esse virou um dos principais ativos do mercado de luxo na Bahia hoje.

"Tem que cuidar do corpo. O beach tênis, por exemplo, foi um fenômeno não só por causa do exercício, mas porque você se conecta com pessoas. Hoje, tem pessoas que malham três, quatro vezes mais do que antes, porque isso virou uma forma de conexão", explica a empresária e designer Sandy Najar.

Com a busca pelos serviços de saúde e atividade física em alta, houve influência e impactos na moda. Sandy explica que a força do wellness - ou bem-estar - no luxo transformou algumas das marcas de roupas de ginástica e treino em peças de desejo, por valores altos. O maior símbolo dessa tendência é a Alo, marca californiana que abriu uma loja em São Paulo no ano passado. "A Alo trouxe ao Brasil o mesmo estilo ‘wellness premium’ das flagships (lojas conceito) de Los Angeles e Nova York, combinando moda, performance e bem-estar".