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Priscila Natividade
Publicado em 3 de agosto de 2024 às 05:00
'Isso não é humanamente possível'. É como muita gente pode pensar ao assistir alguma das apresentações da ginasta Simone Biles. Superestrela da ginástica artística, aos 27 anos, Biles se tornou a mais vitoriosa norte-americana da história das Olimpíadas na modalidade. Até aqui, são 30 medalhas em campeonatos mundiais (23 de ouro). E não para por aí. Bicampeã no individual geral em Jogos Olímpicos, desde que estreou, foram 9 medalhas ao todo, destas 6 douradas. A toda poderosa da ginástica é ela. Mas o que pensar quando uma heroína desiste? >
Os bastidores da renúncia nas Olimpíadas de Tóquio em 2020 e os relatos da própria Simone sobre o impacto da sua saúde mental nesta decisão se destacam na narrativa do documentário O Retorno de Simone Biles (Netflix, 2024). Dirigido por Katie Walsh, o lançamento recente se aproveitou (e muito) da expectativa em torno do mundial da França-2024. A produção, que permanece por semanas no topo dos 10 títulos mais assistidos na plataforma, já alcançou 4,7 milhões de views globais na semana de 15 a 21 de julho, dias antes do início das Olimpíadas.>
Há quatro anos, Simone Biles sofreu ‘twisties’, fenômeno que provoca uma perda repentina de orientação espacial ao girar no ar. “Tive que lutar contra demônios, dia após dia nos treinos. Eu realmente tenho que provar a mim mesmo que posso fazer isso”. A ginasta respirou fundo, mas incomodou o mundo esportivo quando, ao invés de conquistar medalhas levantou o debate sobre cuidado com a saúde mental dos atletas de alto rendimento – e os efeitos colaterais - de estar sempre além do melhor, o tempo todo, como destaca o psicólogo especialista em Psicologia do Esporte e sócio da Rede Naurú de Saúde Mental no Esporte, Matheus Vasconcelos:>
“A saúde mental sempre foi um tabu no mundo dos esportes. De um lado, existe esse imaginário de alguém que alcançou potenciais que estão além da população em geral, o que acaba trazendo a concepção de que atletas não precisam de suporte, pois já são ‘extremamente fortes’. Porém, encarar e demonstrar vulnerabilidades também é uma condição para maior crescimento e construção de força psicológica”. >
Na primeira temporada, a produção dividida em dois episódios traz a jornada de Biles ao lidar com o peso da perfeição, o rigor da execução correta e o desafio de equilibrar corpo, mente, vida pessoal e ginástica. Até mesmo tirar o collant do guarda-roupa que vestiu nas últimas olimpíadas causava desconforto em Simone, que precisou enfrentar a ansiedade e a depressão.>
Após a pausa de dois anos, Biles voltou com tudo e a redenção veio com mais um ouro na vitória por equipes em Paris, além da conquista de outra medalha dourada na prova geral individual, na quinta-feira (01). Até segunda-feira (05), ela enfrenta outras três decisões como favorita ao primeiro lugar do pódio no individual na modalidade salto, trave e solo. >
“Simone mudou o mundo da ginástica no seu país. É importante cuidar, proteger e criar melhores condições, seja qual for a carreira. Isto inclui saber escutar, acolher, às vezes esperar que alguns desafios sejam superados no tempo e no planejamento de cada um. Isto também é trabalhar com performance e, talvez, Simone seja um dos principais símbolos desse movimento no mundo esportivo hoje”, defende ainda o psicólogo Matheus Vasconcelos.>
Matheus Vasconcelos
psicólogo esportivoNa disputa individual, Biles está de olho na brasileira Rebeca Andrade: “Ela é a que mais me dá medo”, confessou no documentário sobre a adversária, que nessas Olimpíadas se isolou como maior medalhista olímpica entre as mulheres do Brasil. A norte-americana também traz relatos sobre a relação com a família, o casamento com o jogador da NFL Jonathan Owens, do Chicago Bears, amigos, companheiras de treino e treinadores.>
O racismo, os padrões, sua representatividade para a história da ginástica, além do ataque que sofreu nas redes sociais quando deixou Tóquio são mais alguns fatos que o documentário acompanha de perto, inclusive, ouvindo outras atletas da ginástica que vieram antes de Simone (veja abaixo uma lista com outros 10 documentários esportivos disponíveis nos streamings).>
A ginasta tem, atualmente, cinco movimentos homologados com o seu nome, sendo dois saltos, dois movimentos de queda livre no solo e um na trave de equilíbrio. Em Paris, Simone Biles inscreveu na Federação Internacional de Ginástica (FIG), um novo elemento inédito na execução da performance de barras assimétricas que deve ainda aumentar essa lista. Outros dois episódios do documentário estão sendo gravados pela Netflix, durante as Olimpíadas de 2024, que segue acompanhando seu desempenho no mundial.>
E a saúde mental dos atletas não deve sair mais dos holofotes. Pela primeira vez, o Comitê Olímpico do Brasil (COB) nos Jogos Olímpicos de Paris conta com um psiquiatra na equipe que acompanha os 273 atletas representantes do país na competição. O psiquiatra Helio Fádel e os psicólogos especializados em psicologia esportiva Aline Wolff, Carla Di Pierro, Carla Ide, Eduardo Cillo, Marisa Markunas também fazem parte do grupo, que conta ainda com outros 12 profissionais atuando de maneira remota e mais os psicólogos das Confederações Brasileiras de modalidades olímpicas. Segundo informações do COB, o número é superior ao registrado em Tóquio-2020.>
Para o psicólogo e coordenador nacional do NAAP (Núcleo de Apoio e Acompanhamento Pedagógico) da Wyden, César Augusto Lessa, Biles desmistifica a ideia de perfeição que o atleta de alta performance acaba carregando com todas as conquistas, disciplina e histórias de superação. O NAAP oferece suporte aos alunos, inclusive esportistas, em unidades do grupo no Brasil.>
“Já tivemos nestes jogos que estão acontecendo em Paris, alguns atletas manifestando publicamente algum tipo de catarse emocional - choro ou grito - após o resultado não satisfatório. Ninguém está imune. Somos todos vulneráveis em maior ou menor grau, e ao identificarmos os sintomas, precisamos cuidar de nós mesmos, procurando ajuda profissional, quando necessário”.>
Depressão, ansiedade e a busca incessante pela excelência. Altos níveis de estresse e autocrítica. O medo de falhar ou de perder a posição de titular. O professor do curso de Psicologia da Unijorge, especialista em Terapia Cognitivo-Comportamental, Vitor Mascarenhas, concorda: >
“A decisão de Simone Biles inspirou outros atletas e pessoas em todo o mundo a priorizarem sua saúde emocional, ao falar abertamente sobre o tema e mostrar que atletas não são super-humanos. Isso humaniza o sucesso e nos lembra que todos têm desafios”, completa o especialista. >
. 03/08 - Sábado - 11h20 - Salto >
. 05/08 – Segunda-feira – 7h38 – Trave de equilíbrio>
. 05/08 - Segunda-feira – 9h23 - Solo >
1. Naomi Osaka: estrela do tênis (Netflix, 2021) - Filha de mãe japonesa e pai é haitiano, Naomi Osaka já foi atleta número 1 do tênis mundial, quando se tornou a tornou a primeira jogadora asiática a alcançar o topo do ranking de simples. Antes mesmo de Simone Biles, Osaka já havia abandonado uma competição por questões de saúde mental, quando admitiu sofrer de depressão. A >
2. Sprint (Netflix, 2024) - O documentário acompanha velocistas de elite, seus treinamentos, a cobertura da mídia e a concorrência para serem reconhecidos como os mais velozes do mundo.>
3. O dia em que o esporte parou (Max, 2021) - O documentário relembra o impacto da paralização das competições esportivas em 2020, devido a pandemia de covid. >
4. Legacy: A Verdadeira História dos Lakers (Disney+, 2022) - A série documental narra a história da ascensão do Los Angeles Lakers após a ser comprado pelo magnata do setor imobiliário Jerry Buss, em 1979. >
5. Atleta A (Netflix, 2020) - O documentário traz fatos sobre as ginastas que sofreram abusos de Larry Nassar, médico da equipe de ginástica dos Estados Unidos.>
6. No coração do ouro (Max, 2019) - Mais um documentário que traz fatos e entrevistas sobre o escândalo da Seleção Brasileira de Ginástica envolvendo o médico da equipe, Larry Nassar.>
7. Matildas, A caminho do Mundial (Disney+, 2023) - A história conta os bastidores das Matildas – a seleção nacional de futebol feminino da Austrália. >
8. Pódio para todos (Netflix, 2020) - O documentário traz depoimentos de atletas de elite, dirigentes e ativistas que recontam a história dos jogos paraolímpicos e como isso mudou a forma de como as pessoas enxergam a deficiência. >
9. Losers (Netflix, 2019) - A produção traz histórias de atletas que transformaram derrotas em grandes vitórias. >
10. É Ouro! O Brilho do Brasil em Tóquio (Globo Play, 2021) - A série acompanhou por 17 dias a rotina de campeões olímpicos brasileiros nas Olimpíadas de Tóquio, no Japão, em 2020. O primeiro episódio é dedicado a ginasta Rebeca Andrade.>