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Da Redação
Publicado em 6 de novembro de 2020 às 05:15
- Atualizado há 2 anos
Após as fortes chuvas que atingiram a região sul do estado, na última semana, as praias da Ponta da Tulha, do Cristo e da Avenida, em Ilhéus, foram tomadas por baronesas. As plantas aquáticas chegaram ao mar pelos rios Cachoeira e Almada e, desde quarta (4), a Prefeitura de Ilhéus, por meio da Secretaria Municipal de Serviços Urbanos (Secsurb), iniciou um mutirão de limpeza para a retirada das baronesas da faixa de areia. A operação conta com apoio da Marinha e do Corpo de Bombeiros. A limpeza da praia da Ponta da Tulha já foi concluída e a previsão é que as plantas sejam totalmente retiradas até o próximo sábado (7). >
Segundo o secretário de Meio Ambiente e Urbanismo do município, Mozart Aragão, o aparecimento das baronesas é comum na região sempre que o volume dos rios aumenta. Mas, desta vez o fenômeno foi triplicado. “As baronesas sempre chegaram. O município de Itabuna é um dos principais responsáveis por essa poluição, porque joga o esgoto sem tratamento no rio Cachoeira. Com a enchente, elas desceram”, afirma. >
Aragão também aponta como intensificador do problema a barragem do Rio Colônia, responsável pelo abastecimento de água da região de Itabuna, localizada entre o município e Itaju do Colônia. “Foi preciso abrir as comportas da barragem”, complementa. >
Em resposta, a Prefeitura de Itabuna informou que entre as pontes do Rio Cachoeira não há mais esgoto sendo jogado, e, atualmente, 88% do esgoto é coletado e 33% é tratado. Na gestão anterior, apenas 4% do esgoto era tratado. Para eles, todas as baronesas, ou 90% delas, vêm da barragem de acumulação em Itapé e a contribuição do trecho de Itabuna é pequena.>
A previsão é que cheguem mais baronesas na região. A Prefeitura de Ilhéus informou que a equipe de limpeza ficará de prontidão. A ajuda de populares foi dispensada por conta da presença de animais peçonhentos nas faixas de areias, que foram arrastados junto com as plantas aquáticas. >
Licenciado do cargo de presidente da Associação dos Pescadores de Ilhéus para concorrer a vereador no município, José Leonardo dos Santos, relata as dificuldades impostas a comunidade de pesca da região com a chegada das baronesas nas faixas de areia. Segundo ele, as plantas começaram a surgir já no sábado (31). “Isso é recorrente, principalmente no mês de novembro, por conta das frentes frias. Elas chegam em grande quantidade com troncos de árvores gigantescos, jangadas dos pescadores ribeirinhos, móveis e muitos animais também”, destaca. >
Para o também pescador, os prejuízos são muitos. Além de ficarem impossibilitados de pescar, afetando a atividade econômica, o grande volume das baronesas deixa a água pesada e dificulta a retiradas das embarcações que, por vezes, acabam sendo danificadas. “O peso das baronesas, da água doce misturada com a água salgada e troncos de árvores danificam as tendas das âncoras de amarração. O município de Ilhéus não era mais para estar sofrendo com essas baronesas, já era para ter um plano de ação”, lamenta. >
Apesar da sociedade civil não ter sido convocada ao mutirão de limpeza, Santos conta que os pescadores reuniram forças na manhã desta quinta-feira (5), para retirar as baronesas que se alojaram nas embarcações. Para ele, além do prejuízo na pesca, o turismo da região acaba sendo afetado pela poluição visual, odor deixado pelas plantas aquáticas e pelo lixo acumulado. >
Gerente da Pousada Porto do Sol, localizada em frente a praia da Ponta da Tulha, Cláudio Santos, 36, também sente que a sujeira e o acúmulo das baronesas na areia afetam o turismo local. “De ontem para hoje, tinha muita baronesa. A prefeitura limpou, mas já estão chegando mais. É muita sujeira. Tem cliente que frequenta a pousada há mais de 30 anos e que vem mostrando insatisfação com essa sujeira na beira da praia”, revela. >
Afinal, o que favorece a proliferação das baronesas? De acordo com o coordenador do Laboratório de Ecologia e Conservação da Universidade Federal da Bahia (Ufba), o biólogo Ricardo Dobrovolski, a principal responsável pelo aparecimento das baronesas é a poluição. Dobrovolski explica que em grande parte dos rios do mundo a contaminação se dá por resíduos humanos, tanto da produção agrícola de fertilizante e restos da pecuária, quanto por resíduos urbanos, industriais e domésticos. “Esses resíduos levam a eutrofização da água, um aumento dos nutrientes, e isso leva a multiplicação da vegetação, das algas e da aguapé-de-flor-roxa [como também são conhecidas as baronesas]. Nesse caso, é a parte mais visível da poluição de Ilhéus, mas por trás dessa poluição visual há toda uma poluição química e biológica”, ressalta. >
Segundo o biólogo, o fenômeno é comum em rios que passam por áreas urbanas de alto impacto humano, que recebem os efluentes dessas regiões e acabam se contaminando. Na região de Ilhéus, “parte do rio atravessa uma área urbana que não faz um tratamento adequado (de esgoto), Itabuna, e atravessa também a cidade de Ilhéus, sobretudo a parte agrícola”. >
“A APP [Área de Preservação Permanente] ao longo do rio também não está de nenhuma maneira protegida e isso é fundamental para a saúde, proteção e purificação dos efluentes em torno dele”, complementa. Dobrovolski acrescenta que o excesso de efluentes pode trazer impactos negativos à fauna e flora do rio, os animais e plantas que vivem na região, além da comunidade que pode ter o acesso ao rio prejudicado ou acabar contaminada, em maior ou menor grau, se fizer uso dos seus recursos.>
Para o pesquisador, a saída é investir em saneamento básico, tratamento de esgoto, na proteção da vegetação nativa do rio e no aproveitamento dos resíduos na atividade agrícola. Apesar de ainda não ser o caso da cidade, ele alerta para a ocorrência das chamadas zonas mortas, áreas do oceano onde a quantidade de matéria orgânica que chega dos rios é tão grande que o oxigênio presente na água é consumido no processo de decomposição da matéria orgânica, pelas bactérias, e mata toda a vida presente na região.* Sob supervisão da chefe de reportagem Perla Ribeiro>