ESCOLAS DE SAMBA

Escolas de samba resgatam tradição secular no Carnaval de Salvador

Desfiles eram a principal atração do carnaval soteropolitano nas décadas de 60 e 70

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  • Gilberto Barbosa

Publicado em 6 de fevereiro de 2024 às 05:00

A Escola tem no bairro que batiza a agremiação a principal inspiração para manter a formação de novos sambistas
A Escola tem no bairro que batiza a agremiação a principal inspiração para manter a formação de novos sambistas Crédito: Arisson Marinho

O ano era 1961 quando a “Ritmistas do Samba” venceu a primeira disputa dos desfiles no carnaval de Salvador. Formada por dissidentes da batucada “Nega Maluca”, a agremiação foi a primeira escola de samba criada na capital. Nos anos seguintes, composições de sambistas como Nelson Rufino, Roque Fumaça, Ederaldo Gentil e Walmir Lima disputavam os títulos dos desfiles realizados no centro da cidade.

As escolas de samba tiveram origens nas charangas e batucadas que desfilavam no carnaval. A primeira agremiação de Salvador foi a Ritmistas do Samba, criada em 1957, na Ladeira da Preguiça. Com o passar dos anos, outras escolas de samba foram criadas. Em 1961, as primeiras disputas entre os desfiles foram organizadas pela prefeitura. Ao todo, 15 escolas de samba atuaram na capital, com destaque para os Filhos do Tororó, os Diplomatas de Amaralina e a Juventude do Garcia.

Durante as décadas de 60 e início dos anos 70, os desfiles foram a principal atração do Carnaval soteropolitano. A chegada dos trios elétricos e as dificuldades financeiras reduziram as atividades das escolas de samba no final da década de 70 até o último desfile, realizado em 1985.

Atualmente, três escolas de samba atuam em Salvador. São elas: a Unidos de Itapuã, criada em 2007, a Filhos da Feira de São Joaquim, que surgiu em 2006, e a escola Diamante Negro, criada em 2018, na região do Novo Marotinho.

A Unidos de Itapuã foi criada na Primeira Travessa do Gravatá, no bairro que batiza a agremiação, por cinco amigos que queriam ensinar percussão aos jovens da comunidade. Dos fundadores, dois seguem até os dias de hoje na escola e são acompanhados por ex-alunos do projeto que, hoje, fazem parte da direção e participam dos desfiles.

O compositor Alexandre Menestrel conta que a escola surgiu a partir do desejo de ter um lugar para falar sobre o samba. “A gente sentia a necessidade de um lugar onde fosse possível resgatar as histórias do samba da Bahia e não víamos esse espaço aqui na região. Na escola, nós pudemos juntar os compositores e formar uma nova geração de percussionistas”.

Segundo o gestor da agremiação Nailton Maia, além do projeto educacional, um dos objetivos da Unidos de Itapuã é resgatar a cultura de escolas de samba na capital baiana. “O nosso objetivo é a valorização do samba em Salvador. Vários sambistas daqui foram compositores de escolas de samba e nós viemos com a missão de mostrar a nossa força e colocar o samba daqui onde ele merece”, afirmou.

Durante o ano, a escola realiza cursos de iniciação musical e percussão. As aulas são gratuitas e acontecem aos sábados. “Qualquer pessoa pode participar. Nós ficamos, de abril até dezembro, ensinando os alunos e, a partir de janeiro, começamos os ensaios para a Lavagem de Itapuã. Todo mundo da escola participa do desfile”, afirmou Rafael Jorge, mestre de bateria.

Alexandre conta que apesar das composições terem o bairro de Itapuã como ponto de partida, a abordagem da escola não se limita a região. “A maneira como a gente trata os temas tem produzido uma centralização do bairro como base do olhar da escola, dos problemas e das questões que a gente discute. Itapuã por si só é um enredo. Mas nós já falamos de muitas outras coisas”.

Para a rainha de bateria da Unidos Joyce Marília, a escola representa uma conexão com a ancestralidade. “Eu faço parte da escola da minha comunidade. Eu cheguei, em Itapuã, do Rio Grande do Sul, como uma amante do samba. Eu desfilo desde os meus nove anos, poder trazer todo o meu legado e representar o bairro de Itapuã é muito gratificante”, afirmou.

Com o tema “Itapuã, um mar que não tem tamanho”, a escola já desfilou na Lavagem de Itapuã, na quinta-feira (01) e no Fuzuê, no sábado (03). “Trabalhamos o ano pensando na Lavagem de Itapuã, porque é o momento que todo o bairro está vendo o nosso trabalho”, disse Rafael.

“Itapuã é isso, um gigante que, assim como o mar, você não vê o final. Nesse ano, conseguimos desfilar na lavagem falando dos pescadores, de Caymmi, da Lagoa do Abaeté e das coisas que compõem o bairro”, afirmou Nailton.

Nailton conta que há mais uma saída planejada para o sábado no Circuito das Águas, em Itapuã. “A gente ainda depende de algumas questões logísticas para confirmar o desfile, mas a intenção é firmar esse circuito que é tão importante para a comunidade”.

O projeto ficou três anos parado por conta da pandemia. Para manter as atividades, Nailton, Rafael e outros gestores investiram do próprio bolso para manter a sede da Unidos de Itapuã funcionando. Nailton conta que, recentemente, foram aprovados em dois editais, o que garantiu um maior conforto financeiro para a escola.

O grupo também faz shows em festas particulares. O plano para 2024 é organizar mais eventos com a comunidade do bairro. “Vamos fazer o festival, onde damos o tema do ano para os compositores participarem. A gente também quer voltar com os eventos que mantinham a escola, como a feijoada e o bingo”, afirmaram.

O Correio Folia tem apoio institucional da Prefeitura Municipal de Salvador.

Com orientação da chefe de reportagem Perla Ribeiro.