Carlos Brasileiro: ‘O São João é um fator econômico muito forte’

Senhor do Bonfim tem prejuízo de R$ 10 milhões com cancelamento dos festejos juninos; leia entrevista com prefeito da cidade

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Publicado em 25 de junho de 2020 às 05:30

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Carlos Brasileiro, prefeito de Senhor do Bonfim (Foto: Divulgação) A pandemia provocou o cancelamento das festas juninas, muito tradicionais na Bahia, o que gerou um prejuízo milionário, especialmente para as cidades onde osfestejos são mais fortes. Senhor do Bonfim é uma delas. Por lá, noutros tempos, os últimos dias teriam sido de festa no Espaço Gonzagão.

Mas, diante do cenário de avanço da covid-19, o município não realizou aquele que é o seu principal evento em termos de movimentação econômica. Segundo o prefeito Carlos Brasileiro, a festa movimenta em média R$ 10 milhões. “O comércio perde, a hotelaria perde, as lanchonetes, os restaurantes, mas acho que tudo isso passa”, diz ele.

Nesta entrevista exclusiva para o Site Alô Alô Bahia e para o Jornal CORREIO, Brasileiro fala sobre as ações do município para impedir o avanço do novo coronavírus e também sobre o prejuízo com o cancelamento do São João. O prefeito ainda revela que estuda, em 2021, realizar oito dias de festa em vez de quatro, para compensar a ausência de 2020. Ele, contudo, descarta realizar um São João fora de época quando a pandemia estiver controlada. Confira:

Segundo dados da prefeitura, Senhor do Bonfim tem hoje 103 casos confirmados da covid-19, com uma morte e 66 recuperados, mais da metade. Acredita que a situação está controlada? Diante dos números, do fato de sermos um polo regional e do crescimento dos casos no Brasil e na Bahia, eu diria que estamos na dianteira, reagindo. Só tivemos uma morte, mas foi porque o cidadão tinha outros problemas e não procurou auxílio médico no tempo certo, foi hospitalizado em um hospital particular e já estava muito comprometido. Temos feito testes rápidos, uma das poucas cidades da Bahia. Foram mais de 2 mil testes rápidos, o que tem ajudado a gente a identificar e zonear as áreas de contaminação, envolver os parentes e amigos que a pessoa teve contato.

Quais ações o senhor destaca como mais importantes para evitar o avanço mais severo da doença? Fizemos barreira em toda a cidade, que é um polo regional, com mais de 27 acessos. Deixamos dois acessos para a cidade com barreiras móveis por 24 horas para manter o devido controle de moradores de outras cidades, principalmente quando o comércio está aberto. O comércio tem duas semanas fechado, porque houve um crescimento em 72h há cerca de 15 dias. Nós tínhamos ainda 3 casos por semana, e aí tivemos 15 casos em 72 horas. Então decidimos fechar o comércio de novo. Dentro dessa estratégia de controle de barreiras sanitárias, trabalhamos muito também com a fiscalização até dos serviços essenciais, a gente tem conseguido esse controle.

Como o senhor lidou com a questão do fechamento do comércio? A gente começou a fechar o município logo no início, nas primeiras notícias da pandemia chegando à Bahia. Fechamos por três semanas o comércio, depois a gente viu que os números estavam bem estabilizados, registrando um caso por semana, dois no máximo. E estes casos controlamos em casa porque a gente tem uma equipe de monitoramento, formada por médicos, enfermeiros, eles acompanham o paciente três vezes por dia, ouvindo as queixas dele sobre febre, tosse, falta de ar... Então, abrimos o comércio por um mês e se manteve em um nível controlado. Depois, começou a aumentar, principalmente com casos assintomáticos, porque aí passou a ser a transmissão comunitária. Aí a gente voltou a fechar por 15 dias, depois abriu. E agora fechou mais 15.

Com esse fechamento do comércio é possível que os casos tenham parado de subir, o senhor pretende reabrir o comércio? Geralmente os nossos decretos são de 15 dias, mas com possibilidade de mudança de 7 em 7 dias. Nesse último mês, a gente baixou um para 15 dias, ele vence domingo, e sábado a gente fez uma reunião e avaliou que só tivemos 3 casos sintomáticos, bem diferente de 15 dias atrás. Então cresceu o número de casos, mas em compensação também a recuperação aumentou. No sábado a gente faz uma nova avaliação, se o quadro nos der uma segurança de que os assintomáticos também não estão evoluindo, aí a gente pode pensar na abertura. Não tem como não fechar se houver um crescimento. Mesmo se o crescimento for leve vamos ter que manter fechado.

Qual a estrutura do município para atender às pessoas com covid-19? A gente criou um centro com 32 leitos com 12 respiradores e 6 monitores para casos graves. Se não estabilizar, a gente faz o trabalho de enviar para Salvador ou para Juazeiro, Petrolina. Já enviamos dois para Salvador, que já foram curados e o de Petrolina também foi curado, só tivemos 3 mais graves. A gente leva de ambulância se for para Petrolina e se for para Salvador vai de avião via Petrolina.

Quantos leitos de UTI Senhor do Bonfim tem? Ainda não temos leitos de UTI, mas acreditamos que até o dia 5 de julho teremos 25 leitos de UTI na estrutura do Hospital Municipal Dom Antônio Monteiro. Desse total, seriam 10 para adulto, 10 para neonatal e 5 para observação, mas com a crise o governador (Rui Costa) autorizou que a gente adaptasse os 25 leitos para covid-19. Quando passar, volta a funcionar conforme planejado, o que irá funcionar em caráter regional com as UTIs funcionando.

As festas de São João em Senhor do Bonfim são sempre muito famosas. Houve um prejuízo grande para a economia do município este ano? Aqui é a capital baiana do forró. Sem nenhum bairrismo, é o melhor São João do Brasil. Campina Grande e Caruaru têm grande circulação de dinheiro, um dia a gente vai chegar lá, mas aqui a força do nosso São João é a tradicionalidade, é uma festa mais cultural, com diversidade de comidas típicas. Somos um polo regional, claro que as pessoas estão sofrendo bastante não só pela saudade dos festejos, que é uma coisa que está dentro das nossas raízes. Mas a gente procurou conscientizar, porque é um dia de muita alegria. Mesmo com a pandemia, tem que festejar dentro das casas, com sua família, obedecendo as regras de distanciamento, mas que não vão pra rua, que não acendam fogueiras, que nesse momento de muito frio a fumaça é um contribuinte forte para quem já tem problema de respiração e também pode ajudar a proliferação do vírus. Agora, é evidente que é uma perda muito grande porque a gente geralmente investe R$ 2 milhões no São João, entre decoração, atrações, festas. Então é natural, o comércio perde, a hotelaria perde, as lanchonetes, os restaurantes, mas acho que tudo isso passa. Nos mantemos firmes, animados, esperançosos e se pudermos no ano que vem, vamos fazer oito dias e não quatro para compensar esse ano.

O São João chega a movimentar quanto na cidade? Gira em torno de R$ 8 milhões, R$ 10 milhões. Em 2018, aqui teve aproximadamente circulação de R$ 10 milhões porque coincidiu com o final de semana, o feriado foi na segunda então foi muito positivo. O ano passado caiu um pouco, a média foi de R$ 8 milhões. A prefeitura investe R$ 2 milhões, capta de patrocínio em torno de R$ 700 mil. A gente investe R$ 2 milhões, arrecada R$ 700 mil, e R$ 1,3 milhão saem dos cofres públicos. É muito positivo para a sociedade toda. É o fator econômico mais forte. Realmente o melhor momento econômico do município é o São João. Porque as pessoas daqui gastam mais, mas também porque os turistas que vem.

Quantos turistas a cidade costuma receber? A gente recebe em média 5 mil turistas fixos, mas tem os flutuantes, que são aqueles que fazem bate-volta. Na nossa região as cidades são todas próximas, com 30 km, 40 km de distância, então tem muita gente das outras cidades que vem para a festa e volta de madrugada. No Espaço Gonzagão, que foi um espaço construído em 2008, temos em média um público de 50 mil pessoas todas as noites. É uma senhora festa mesmo. Isso é importante porque vem artistas nacionais, mas o que mais valoriza o nosso São João é a cultura mesmo de 100 anos, que está no sangue das pessoas, é o forró nas casas, nos sítios, nas chácaras, nas ruas. Nós criamos aqui o forró na feira, muito interessante porque tem duas atrações tocando no meio da feira, com personagens folclóricos, dançarinos, quadrilhas, isso é o que faz o São João diferente, com blocos que saem nas ruas.

O senhor vê a possibilidade de um São João fora de época caso a pandemia dê uma reduzida até o final do ano? Não vejo. Fizemos um levantamento e eu acho que não cabe em Bonfim um São João fora de época. Eu penso em fazer um grande evento em Bonfim, uma festa, mas não com o espírito junino.

Muitos prefeitos têm falado da questão econômica, que tem sofrido um impacto grande. Em Senhor do Bonfim qual é o impacto na arrecadação? Nós até aqui perdemos em média 25% do ICMS e FPM (Fundo de Participação dos Municípios), em torno de 30%. Tiveram leis aprovadas federais de restituição. Bonfim vai receber pouco mais de R$ 6 milhões (com o auxílio do governo federal). Claro que o recurso é importante, mas você sabe que é uma restituição. Não é de agora porque é Covid-19. É importante porque já tem município da região preocupado em como pagar a folha. Os comerciantes e empresários estão sofrendo não só pelo temor da doença mas para manter lojas abertas, o emprego das pessoas.

A população tem cumprido o isolamento? Temos tido uma média de 70% de aprovação das medidas. Mais de 90% das pessoas entendem, mesmo que chateadas. A gente incentivou também a trabalhar no delivery, que nas cidades do interior não chegou tão forte.