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Da Redação
Publicado em 29 de dezembro de 2018 às 05:00
- Atualizado há um ano
A morte de Mãe Stella de Oxóssi abriu o chão sob nossos pés neste final de ano. Como se saído de um dos romances escritos por Jorge Amado, o impasse sobre o seu enterro ganhou ares de realismo fantástico. O povo de santo reivindicou na Justiça o corpo para que os ritos sagrados fossem feitos de acordo com as tradições do Candomblé. A família impôs o velório e o sepultamento longe do terreiro, ameaçando embargos.
Enquanto escrevo é com pesar e perplexidade que acompanho as notícias sobre este dilema, em nada belo ou mágico. Não se sabe, não sei, qual desfecho. E não me refiro logicamente ao rumo exato dos acontecimentos, que a esta altura já viraram parte importante da história recente do nosso povo seja qual for o resultado. Pois, sim, há uma importância inegável nesses fatos, que têm (e terão) uma dimensão imensa.
Minimizar esta importância, penso, é negar a luta de séculos dos filhos de santo pelo respeito inalienável às suas crenças. A quem pertence nossos corpos? A quem pertencemos quando mortos? Deixo esta análise aos iniciados e aos antropólogos. O Tempo, senhor indomável, soprará em nossos ouvidos todas as respostas no momento certo. Salvador é uma cidade devastada pela alegria, é fato e já disseram.
Há tempos desisti de descobrir o verdadeiro autor da frase. A confirmação de autoria, diga-se, serve sobretudo aos censores e aos carrascos. Então deixemos que a frase se espalhe livremente e sem autor próprio, enquanto nos reinventamos para 2019. Entre antônimos e sinônimos, talvez outra palavra nos sustente naquilo que hoje somos, naquilo que seremos. Força? Coragem? A Bahia não se entrega a quem a define.
Mais que mera paráfrase de um verso de Mario Quintana, realismo fantástico é o que aqui se vive como cotidiano, e este ano será para a eternidade um divisor de águas. Corre entre nós agora mesmo este rio infindável a que chamamos história. Observamos como ele segue ao mar, e a força devastadora de seu fluxo. Uns de um lado, outros do outro, todos estamos à margem, ribeirinhos. O ano de Xangô na Bahia, surreal de resto em todo o país, finda com esta última sexta-feira de 2018.
Mãe Stella de Oxóssi é muito maior que todo este triste imbróglio em torno de seu corpo. Que Xangô feche este ciclo com Justiça, é só o que desejo.