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Da Redação
Publicado em 13 de março de 2015 às 02:31
- Atualizado há 2 anos
Em 14 de março de 1815, duzentos anos transcorridos nesta semana, o Conde dos Arcos, governador da Bahia, em meio a uma plateia de convidados ilustres, pegou um feixe de cana e o introduziu na máquina movida a vapor instalada no engenho Ingá-Açu, de Itaparica. Duas horas e vinte minutos depois, conferia o resultado: “Caldo para cinco pães de açúcar”, assim noticiou o jornal Idade D’ouro do Brasil na sua edição de 28 de março do referido ano. Pães de açúcar era a medida correspondente ao preenchimento de uma forma de barro cônica, utilizada para o transporte do produto, vasilhame de grande porte que pelo seu formato inspirou o nome do famoso cartão-postal do Rio de Janeiro.O gesto do governador da Bahia coroava cinco anos da iniciativa de um grupo de empreendedores que se dispôs a introduzir no Brasil a máquina a vapor com o objetivo de racionalizar os procedimentos para a produção de açúcar nos engenhos. Iniciativa esta que teve inicialmente o brigadeiro Felisberto Caldeira Brant e o comendador Pedro Rodrigues Bandeira como promotores; consta que chegaram a encomendar a Dash & Bolton uma bomba a vapor e desistiram diante da dificuldade de contar com mão de obra hábil e treinada para operar o equipamento. Em 1813, o coronel Pedro Antônio Cardoso, proprietário da fazenda aqui mencionada, se dispôs a importar a traquitana e assim tornou-se o pioneiro da introdução da máquina a vapor no país.>
Dias após a solene inauguração da máquina, o Conde dos Arcos enviava um ofício ao Ministério do Reino, datado de 2 de abril de 1815, cujo original se encontra no Arquivo Nacional, relatando as suas impressões e no ensejo sugerindo que o governo pagasse o salário de Mr. Falkner, o técnico inglês que instalara a máquina do engenho Ingá-Açu; seria “útil ficar por qualquer preço ao serviço de Sua Alteza Real”. Segundo o argumento do governador, de nada valia a introdução de máquinas a vapor nos engenhos sem um técnico capaz de operá-las, fazer os reparos necessários, orientar a fabricação de peças de reposição e formar mão de obra. Tinha razão.Não foi pacífica a introdução da máquina a vapor nos engenhos e não tenho conhecimento - algum especialista pode esclarecer -, mas a minha percepção é a de que não deu certo e o trabalho braçal executado pelos escravos continuou a ser a rotina nas fazendas de cana. Uma das evidências é a de que no ano seguinte ao fato aqui relatado, o coronel Pedro Cardoso anunciava no jornal a venda de uma máquina a vapor que deve ter sido a mesma adquirida na Inglaterra. Mas quais eram as vantagens apregoadas pelo fabricante? O Jornal Idade D’Ouro do Brazil elenca alguns desses benefícios: “Poupa um engenho oito escravos tangedores e oitenta cavalos que as vezes morrem todos em um inverno”; “os cilindros da moenda estão em posição horizontal e no espaço de vinte e quatro horas dão caldo para quarenta e oito, até cinquenta pães de açúcar”.A propósito dessa produção referida para um dia de trabalho, explicava: “A despesa da lenha que conserva o vapor da máquina por todo este espaço não excede nunca a dois carros”. Todos os argumentos falavam em economia de tempo e de recursos: “Daqui fica evidente que a safra do melhor engenho que ordinariamente gasta seis meses, por este método, se abrevia em dois”. E sugeria outros usos, além da moagem da cana: “Concluída a safra, o préstimo da máquina não fica por isso concluído. No mesmo lugar em que está plantada ela serve para serrar madeiras, descascar arroz, moer farinha, tabaco e tudo aquilo que depende de grande força e movimento”. Bela teoria. Não foi assim na prática. >