Dia da Mulher: 6 profissionais indicam vinhos e estilos que elas adoram

E eis que algo curioso aconteceu: todas indicaram vinhos brancos, mas completamente diferentes entre si

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  • Paula Theotonio

Publicado em 9 de março de 2024 às 15:30

Até bem pouco tempo eu achava que era lenda urbana, coisa do passado. Mas, numa bela noite atendendo na Oxe Vinhos, minha loja em Petrolina (PE), um heterotop com seus 30 e poucos anos pegou um rótulo da uva pinot noir, conhecida pela sua delicadeza e baixos taninos, e disse que aquele vinho era de mulher.

O ar ficou pesado por alguns segundos: meu marido, Fábio, segurou o riso. A companheira do rapaz, que estava saindo com ele pela primeira vez, ficou sem palavras e ensaiou um sorriso amarelo, mas só conseguiu trocar olhares nervosos comigo. Quanto constrangimento! Desconversei, sugeri outros rótulos e guardei comigo todos os detalhes daquela situação, que, graças aos deuses, ainda não voltou a se repetir.

Se nem todo homem é igual, imagine todos os paladares femininos, tão individuais quanto suas donas? Claro que existem tendências e comportamentos de consumo em determinados nichos, mas não existe nada universal. Quando eu quero saber o que uma mulher gosta, não recorro a generalizações: pergunto-lhe diretamente.

E foi exatamente o que fiz mais uma vez esse ano, questionando profissionais do segmento sobre o estilo de vinho que elas mais amam. Fui mais além e perguntei diretamente o quanto isso se conecta com suas personalidades, carreiras e até propósitos. E eis que algo curioso aconteceu: todas indicaram vinhos brancos, mas completamente diferentes entre si. Preciso dizer mais?

Silvana Aluá
Silvana Aluá Crédito: divulgação

Sou uma pessoa muito ligada ao momento e, no momento atual, tenho apreciado mais vinhos fortificados. São vinhos que me envolvem no prazer de degustar, preenchendo meu paladar. Acredito que harmonizam com esta fase em que estou movendo minha vida em direção a novos desafios profissionais. E se eu pudesse escolher um que reúne o que mais aprecio no momento, seria o Jerez La Guita Manzanilla (R$ 232,30, na Dia Wine). Ao mesmo tempo que me preenche, o faz com leveza e frescor. Adoro ainda as notas de pão e camomila, que tornam a experiência ainda mais interessante. Silvana Aluá, sommelière e fundadora da Confraria das Pretas

Jessica Marinzeck
Jessica Marinzeck Crédito: divulgação

Meu estilo predileto do momento são brancos com muita acidez, que eu amo chamar de brancos elétricos. Eu acredito que tem tudo a ver com minha personalidade e a minha carreira atual. Tudo vibrando, tudo pulsando e aquela pitada boa de acidez! E o vinho que, creio eu, tem tudo a ver com esse momento é o Mel Alsace Quatre Cépages Nobles 2021 (R$ 292, na Cellar Vinhos), um vinho francês biodinâmico. Apesar do nome, é um vinho super cítrico, com boa textura e mineralidade, elaborado com as 4 variedades nobres da Alsácia: Riesling, Gewürztraminer, Muscat e Pinot Gris. Além disso, é feito por uma mulher: Mélanie Pfister, oitava geração da família à frente da vinícola. Seu trabalho foi tão relevante que hoje a empresa leva seu nome: de Domaine Fister passou a ser Mélanie Fister. Jessica Marinzeck, DipWSET e gerente sênior de operações da Cellar Cave.

Keli Bergamo
Keli Bergamo Crédito: divulgação

Meu estilo predileto são os brancos de médio corpo, especialmente de Chardonnay com uma madeira equilibrada. É um tipo de vinho que se adapta facilmente a muitos momentos e harmoniza com uma boa gama de pratos. Essa versatilidade se conecta com minha personalidade, pois estou sempre me reinventando, tenho uma enorme capacidade de conviver com muitas pessoas e não desejo ficar engessada num só perfil. E também se alinha à minha carreira, pois o adaptar-se, o transformar-se, fazem parte do meu jeito de trabalhar. Minha indicação é o Morandé Vitis Única Gran Reserva Chardonnay (R$ 99, na RedeMix), um vinho de grande frescor mas também untuoso, com um delicioso equilíbrio entre frutas e notas mais amendoadas e florais. Keli Bergamo, educadora e sales manager da Morandé Wine Group.

Erika Firmo
Erika Firmo Crédito: divulgação

Como mulher negra, encontrei nos vinhos naturais e mineiros uma conexão profunda com minha terra natal e minha história. Os vinhos naturais resgatam a diversidade, autenticidade e ancestralidade, refletindo minha abordagem à vida, enquanto os vinhos mineiros refletem a alma vibrante e potente de Minas Gerais. Cada gole é uma homenagem à resiliência vitivinícola da região e à comunidade que a sustenta. Além disso, tenho uma predileção especial por vinhos brancos e rosés, que combinam com meu jeito vibrante e otimista de ser. Em minha carreira, essa conexão com meus estilos preferidos de vinho vai além do paladar, representando uma jornada de descoberta e apreciação da riqueza cultural e sensorial que o mundo dos vinhos oferece. Cada garrafa é uma história, uma celebração da diversidade e autenticidade que convido meus clientes a explorar. Para degustar um pouco do que me representa, indico o mineiro Bárbara Eliodora Rosé, bastante leve, fresco, com boa textura e encantadores aromas de lichia e flor de laranjeira; e o Guardião da Intuição (R$ 160, na Gira Vinho), um vinho natural laranja bastante leve, equilibrado e com aromas intensos, elaborado pela Vanessa Medin na Serra Gaúcha. Erika Firmo, sommelière da Gira Vinhos.

Deborah Pataxó
Deborah Pataxó Crédito: divulgação

Eu tenho 29 anos, sou uma mulher autista, indígena do povo Pataxó do litoral sul baiano, lésbica e ativista pelo direito humano à alimentação adequada e à soberania alimentar dos povos indígenas. Devido à minha ancestralidade, gosto de incorporar elementos da alimentação tradicional do meu povo, como frutos do mar, na minha prática como chef. Eu cresci numa família de pescadores e muito provavelmente a primeira coisa mais complexa que eu consegui fazer na vida, por volta dos 12 anos, foi uma salada de peixe com camarões. Então, isso meio que definiu e moldou todo o meu estilo de cozinha, que é mais rústico no que diz respeito às tecnologias usadas, com fogão à lenha e fogo de chão, só que com um toque a mais de delicadeza. Então, apesar de eu gostar muito também de tintos, não poderia deixar de escolher brancos e rosés, que tanto combinam com minha história e minha atuação profissional. Minha dica de hoje é o Bee Famous Chardonnay, um vinho orgânico francês da IGP Coteaux du Pont du Gard. Deborah Pataxó, chef de cozinha e ativista.

Ana Clara Matta
Ana Clara Matta Crédito: divulgação

Quando eu digo que meu estilo de vinho favorito é vinho branco botritizado, como os Rieslings TBAs e os Tokaji Aszu, sinto que a reação é sempre de surpresa, como a reação que as pessoas têm ao saber que minha cor favorita é o rosa bebê. Algo na minha postura, nas minhas tatuagens, roupas sociais e sneakers não passa exatamente a imagem de dulçor e delicadeza desses vinhos, e esse atrito me diverte demais. Acho que isso mostra como essas associações entre bebidas e estereótipos podem ser complexas (e até danosas). Mas nada melhor do que o mistério dessa relação entre Botrytis e Uva, essa "Podridão" produzindo algo sublime, infinitamente interessante para estudar - e estudar vinho é o que eu mais amo. Minha dica para que todos conheçam é o Tokaji Aszu Sauska 5 Puttonyos (R$ 629,90 ,na Vivavinho), importado pela Berkmann Brasil. Ana Clara Matta, embaixadora da Viña Haras de Pirque e especialista em insights na Berkmann Brasil

NOTAS AROMÁTICAS - O podcast Aula Aberta de Vinho, criado pela especialista em vinhos Jessica Marinzeck, acabou de estrear sua terceira temporada com um novo formato. Agora, a host é acompanhada pela Keli Bergamo e por mim, a colunista que vos escreve. O primeiro episódio desse novo capítulo já chegou com uma energia questionadora, debatendo a insistência do mercado de vinhos em usar termos como “desmistificar” e “descomplicar”. Afinal, esse esforço é possível? O programa está disponível em todas as plataformas de streaming (Spotify, Amazon e Google Podcasts), além do canal do YouTube da Vinhos Única.