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"Eu sou amor", comemora Egbomi Nice ao lançar biografia

Livro é assinado em conjunto com o babalorixá e antropólogo Vilson Caetano e ouviu mais de 50 pessoas

  • Foto do(a) author(a) Vinicius Nascimento
  • Vinicius Nascimento

Publicado em 14 de dezembro de 2022 às 06:30

 - Atualizado há 2 anos

. Crédito: Foto: Jamile Coelho

Ao ser perguntada como se define, Mãe Nice de Iansã, 80 anos, surpreende com a resposta: “Eu sou amor. A minha força está no amor e eu sei que nunca vou morrer porque  tenho muito amor. Quem ama nunca morre. Só vai ali do outro lado”, afirma a egbomi do terreiro da Casa Branca. 

Do outro lado da linha, era possível perceber que sua voz estava sorridente e nem os pequenos cortes no sinal telefônico conseguiam esconder a euforia de quem realizou o sonho de lançar um livro contando sua vida. E bem do jeitinho que ela queria, com várias fontes, num trabalho de costuras, escutas e descobertas do que reza a filosofia do Ubuntu: eu sou porque nós somos. 

O livro Oloyá, Egbomi Nice e o Bailar das Borboletas será lançado quinta-feira (15), às 19h, no Museu de Arte Moderna da Bahia. Ela mesmo garante que o trabalho, assinado em conjunto com o babalorixá e antropólogo Vilson Caetano, professor da Universidade Federal da Bahia (Ufba), é mais do que uma autobiografia. Justamente por ouvir diversas fontes que conviveram com a egbomi.

Ao todo, 50 pessoas indicadas por ela foram escutadas. O trabalho começou a ser construído no segundo semestre de 2019 e foi impactado pela pandemia, por isso está sendo lançado após três anos. “Neste exato momento, eu nem sei como estou. Ainda não caí em mim. Pra mim, falar com o ser humano é falar com Deus. Estou muito feliz por ver as pessoas falando de mim neste livro e falando de coração”, diz com voz dengosa. 

Irmã mais velha

Conhecida como egbomi Nice de Iansã, as duas palavras em iorubá que antecedem o seu nome a definem no mundo do candomblé e na sociedade em geral. A expressão egbon, significa “irmão mais velho” e “irmã mais velha” e  mi é um pronome possessivo. Logo, egbomi significa minha irmã mais velha.

Mais do que uma maneira de tratamento, o termo, além de significar um lugar de destaque na hierarquia do candomblé, é um signo de nobreza e distinção para poucas mulheres. “Egbomi Nice é na atualidade umas das mulheres que mais tem se destacado e exercido influência no debate nacional sobre temas como religiões de matrizes africanas, intolerância religiosa, racismo institucional e diálogo interreligioso”, afirma Vilson Caetano. 

Ele explica que Mãe Cida é considerada símbolo da luta pela garantia de direitos e livre expressão da fé, com assento no Conselho Religioso de várias comunidades de terreiro. Também já teve sua trajetória reconhecida através de prêmios e distinções como Madrinha Vitalícia do Bembé do Mercado; Doutora Honoris Causa pela Faculdade Hebraica e Ordem dos Capelãs do Brasil; Medalha Zumbi dos Palmares e os Títulos de Cidadã Cachoeirana e Santamarense; além de signatária do Estatuto da Igualdade Racial na Bahia.

Nos últimos três anos, Vilson conviveu intimamente com a religiosa. No primeiro encontro, percebeu que ela demorara um pouco para recebê-lo. Até que depois de sentir o cheiro de alfazema e ser autorizado a entrar no cômodo onde ela estava, entendeu tudo. Egbomi Nice estava à vontade no lugar onde recebia pessoas queridas, dentro de sua casa no Terreiro Casa Branca. Ali, ofereceu um pouco de ambrosia (doce que ele não gosta, mas não conseguiu rejeitar) e ouviu mais do que falou. 

Ela detalhou que não queria ser a única escutada. Aos poucos, ia passando uma lista de pessoas importantes para ouvir e isso ia totalmente de encontro com a ideia de livro que Vilson tinha em mente.   Vilson e Mãe Nice 'costuraram' o livro à base de escutas, idas e vindas durante três anos (Foto: Ismael Silva) Coletivo

O livro possui nove capítulos porque nove é um número que remete a um dos títulos de Iansã. O trabalho da fotografia foi completado pelas ilustrações de Rodrigo Siqueira, que também fez uma pintura a óleo sobre tela representando a autora, ao lado de oito borboletas. A nona borboleta é a imagem da autora, “porque Iansã confunde-se com a borboleta”. 

Uma das pessoas ouvidas  é o historiador e escritor Jaime Sodré, entrevistado por Vilson um mês antes de sua morte, em 6 de agosto de 2020. Jaime, que também assina o prefácio da publicação, foi escolhido por Mãe Nice porque era filho de uma grande amiga sua, egbomi Cidália, conhecida como uma enciclopédia do candomblé.

“Elas eram muito amigas e trocavam muitas informações sobre o candomblé, ocasião em que eu aprendia muita coisa, não só do campo do segredo do sagrado como também de outras questões relacionadas ao fuxico do candomblé”, escreveu bem-humorado Jaime Sodré num trecho do prefácio.

Vilson conta que, na introdução, perguntou a ela o porquê de escrever um livro. Sem titubear, Mãe Cida explicou que é importante que seus filhos, netos e toda a posteridade saibam o que se falava sobre ela. Valorizando o poder da oralidade, tão importante para a sobrevivência e difusão do candomblé ao longo dos anos, a religiosa diz que é importante ter um livro sobre sua trajetória porque, diferente da voz, a letra não se deixa perder com o vento - como ela mesma explica.

No final das contas, a ideia é mostrar que a egbomi Nice é mais do que uma integrante da Irmandade de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos e da devoção de Santa Bárbara, onde foi uma das precursoras do caruru hoje oferecido na Igreja da Barroquinha no dia 04 de dezembro. Mais do que os próprios títulos que acumula. No final das contas, egbomi Nice é amor. Esse mesmo, que não morre. E fica. Ficha  Oloyá, Egbomi Nice e o Bailar das Borboletas

Editora: Brasil com Artes

Preço: R$ 150 ( 504 páginas)