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Em dificuldade, Naldinho receberá ajuda do Bahia

'Terror' dos adversários, ex-jogador sofre de diabetes e está desempregado

  • Foto do(a) author(a) Vitor Villar
  • Vitor Villar

Publicado em 1 de agosto de 2018 às 05:00

 - Atualizado há 2 anos

. Crédito: Acervo Pessoal e Antenor Pereira/CORREIO

No início dos anos 1990, o Brasil só tinha olhos para Romário. Com 1,68 metro de altura, tinha tamanho suficiente para amedrontar os adversários.

Na Bahia, porém, o baixinho referência era outro. Dez centímetros menor que Romário, Naldinho causava estrago. Sobretudo, na torcida rival: “Ele foi o terror da minha infância na Fonte Nova”, admite o jornalista e torcedor do Vitória Alexandre Lyrio.

Sua especialidade era servir quem vestisse a camisa 9 do Esquadrão. Quem mais se beneficiou foi Charles. “Em 1990, ele foi artilheiro do Brasileiro com 11 gols. Metade, de passes meus”, orgulha-se Naldinho. A dupla ajudou o Bahia a chegar ao terceiro lugar da Série A naquele ano.

Quem tem o baixinho tricolor como ídolo precisa saber: hoje, ele segura uma barra de gigante. Natural de Alagoinhas, mora em Marília, no interior paulista, onde constituiu família, desde 2006. Deixou o futebol naquele ano. Está desempregado desde então.

Do futebol, Naldinho trouxe lesões nas costas e nos joelhos, que o afastam de qualquer trabalho com esforço físico. Pouco depois de parar de jogar, descobriu que era portador de diabetes. Para ter alguma renda, aposentou-se por invalidez aos 40 anos.

“Não consigo engatar nada por conta da diabetes. Estava trabalhando numa escolinha de futebol aqui em Marília, atendia 200 alunos, mas tive uma infecção urinária em decorrência da doença e fui internado. Tive que largar o trabalho”, conta.

Naldinho mora no fundo da casa dos sogros. Passa a maior parte do dia cuidando da casa e com as três filhas Vitória, de 16 anos, Geovana, de 21, e Júlia, de 23. Sua esposa, Rosiley, ajuda nas contas da família trabalhando como diarista.

“Já tive até problema cardíaco por causa da diabetes. Comecei um curso para treinador, mas também tive que largar por conta da doença. É algo que me preocupa, porque o auxílio do governo não é certo. Tenho que passar por reavaliação o tempo todo”, completa o ex-atacante.

Há alguns anos, o ex-atacante sofreu outro baque. Sua filha mais velha foi diagnosticada com uma rara doença: “O olho dela começou de repente a sangrar. A gente levou para a médica, que disse que ela precisava de um transplante de córnea com urgência. Poderia até parar de enxergar”, conta, sem lembrar o nome do problema.

“Graças a Deus, conseguimos um transplante para ela. Mas ainda precisa de colírios caríssimos (da marca Restasis) como tratamento. Gasto cerca de R$ 400 todo mês com isso”, completa.

A ajuda É evidente que Naldinho precisa de auxílio. E se um dia ele ajudou tanto o Bahia a se erguer, nada mais natural que o clube o faça agora. O ex-atacante foi um dos cinco escolhidos para participar do programa Dignidade ao Ídolo. A partir de agosto, receberá do tricolor um benefício mensal entre um e três salários.

“Vi uma matéria sobre isso na internet. Fred do Chame-Chame (pesquisador do futebol baiano), com quem ainda converso, foi quem me enviou. Entrei em contato com o Bahia e falei tudo sobre a minha situação. Abri o jogo, mesmo”, conta Naldinho.

“Fui sincero. Não morro de fome, tenho casa, mas é difícil. Nunca entrei em desespero, sempre orei, e veio o Bahia. Vou ser grato ao clube pelo resto da minha vida. Não é só por essa ajuda que vão me dar. É pela minha história de vida. Sou conhecido em todo o Brasil como ‘Naldinho do Bahia’”, completa.

A ajuda veio curiosamente 20 anos depois de Naldinho deixar o clube do coração. Ele chegou ao tricolor em 1989, logo após o título brasileiro. Inicialmente, por empréstimo da Catuense. Seguia assim os passos de outros ídolos, como Bobô e Zanata.

Naquele ano, ajudou a salvar o Bahia do rebaixamento com direito a golaço de calcanhar na Fonte Nova num 2x0 sobre o Sport. Em 1990, foi comprado da Catuense ao lado de Luís Henrique. Assinou contrato de oito anos.

O auge da carreira veio com três títulos baianos, de 1991, 1993 e 1994, o lendário ‘Ba-Vi de Raudinei’, no qual ele estava em campo . Nos seus últimos anos no Fazendão foi emprestado para o Marília em 1995 – quando conheceu sua esposa –, São José em 1997 e Criciúma em 1998.

Depois de deixar o Fazendão, virou um andarilho. Defendeu Ceará, Comercial-MS, Anapolina. Seu último clube foi o Gaúcho-RS em 2006. Naldinho foge de marcação durante clássico Ba-Vi (foto: Antenor Pereira/CORREIO) Sonhador Apesar das dificuldades, Naldinho sonha com dias melhores. Diz que usará o auxílio do Bahia para manter a filha Geovana, que está no terceiro ano de Direito. “Ela conseguiu uma bolsa integral no Prouni por conta da nota que teve no Enem. É  um orgulho muito grande pra gente. Agora está procurando estágio. Tenho certeza que daqui a dois anos, quando ela se formar, vai dar muito mais alegrias pra gente”, conta.

“Já pensei em voltar para a Bahia, mas por conta dela a gente não pode deixar Marília, a faculdade é aqui. As outras duas estão estudando para concurso, tenho certeza que também vão passar. Oro muito por isso”, conta Naldinho, que é evangélico. “Tenho certeza que vivi muita coisa boa no Bahia e o clube agora está me ajudando. Vou usar isso para ajudar outras pessoas. Vou levar essa força para o resto da minha vida”, promete.

Projeto beneficia outros ídolos Naldinho faz parte da primeira turma de ídolos que receberão o auxílio mensal do Bahia. Além dele, foram escolhidos o ex-atacante Jorge Campos, o ex-meia Alberto Leguelé e o ex-lateral direito Zanata. Mailson, também ex-lateral direito, e que sofre de Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA), foi o ídolo que motivou todo o projeto e também será beneficiado. Os valores dos auxílios variam de um a três salários mínimos (atualmente R$ 954), a depender da situação de vulnerabilidade social de cada ex-jogador.

Outros ídolos devem passar a receber o benefício nos próximos meses. Segundo o projeto, o clube pode usar até 0,31% do seu orçamento anual para destinar ao pagamento dos auxílios. Em 2018, o tricolor terá quase R$ 120 milhões de orçamento. Isso significa que R$ 372 mil podem ser usados para benefícios. Com os cinco aprovados, serão usados pouco mais de R$ 7,5 mil.

A triagem dos candidatos ao benefício é realizada pelo gerente de relações institucionais do Bahia, Humberto Netto, e pela comissão de futebol do Conselho Deliberativo, presidida pelo conselheiro Ricardo Maracajá. A comissão entrevista ex-jogadores, recolhe documentos e vê se eles são compatíveis com as exigências do projeto. Depois, emitem um parecer sobre o valor a ser recebido, que é posto para aprovação do Conselho.

'CAUSOS'

'Ajudou' a revelar Marcelo Ramos Com sua facilidade para servir os centroavantes,  conta que ajudou outro ídolo, Marcelo Ramos, a iniciar a carreira. “Foi num jogo com a Catuense, em 91. Luiz Antônio (então técnico) chegou pra mim e disse: ‘Naldinho, tá todo mundo machucado. Tô pensando em puxar aquele menino da base, Marcelo. O que é que você acha?’. Eu disse ‘beleza, chefe, acho que o estilo dele combina bem comigo’”, conta o ex-atacante. “Depois, no vestiário, eu cheguei pra ele e disse ‘olha rapaz, você me conhece, sou rápido. Vou entrar na área e cruzar naquele canto ali. Fica ali que você vai fazer muitos gols e não vai sair mais’. Rapaz... O moleque era iluminado. Ele fez isso mesmo, ficou no poste e eu cruzei certinho. Resultado: Marcelo fez dois ou três gols naquele jogo e surgiu pro Bahia. No dia que você falar com ele, pode perguntar. Ele me agradece até hoje!”.

Quase foi pra Seleção Naldinho diz que, ainda em 1991, quase foi convocado pelo técnico Paulo Roberto Falcão para a Copa América, no Chile. “Luís Henrique era nosso colega de time e foi pra lá. O pessoal do Bahia me disse ‘se cuida aí que a gente recebeu a informação que você também está na lista de Falcão e pode ser chamado. Mas era a pré-lista. Mesmo assim, foi um orgulho enorme”, diz.Briga pela Bola de Prata Na campanha do 3º lugar em 90, Naldinho brigou ponto a ponto pela Bola de Prata da Revista Placar, principal premiação do futebol da época. “Pra mim, foi a minha melhor temporada. Cheguei a liderar a pontuação por algumas rodadas. Fiquei na frente de Bebeto, Romário, Dener, Renato Gaúcho... Só tinha fera e eu estava lá. Pena que a gente não foi campeão”, conta.Bahia de 1988 e os gols de cabeça Com 21 anos, Naldinho trocou a pequena Catuense pelo Bahia, que havia acabado de ser bicampeão brasileiro. “Eu acompanhei todos os jogos do Bahia em 88 pela televisão, lá em Alagoinhas. Paulo Rodrigues, Zé Carlos, Bobô, Paulo Robson, só tinha craque. E de repente, tô eu, lá, treinando com esses caras... Pensei que ia ser difícil, mas era fácil demais jogar com esses caras. Apesar da gente não ter feito boa campanha em 89, eles conheciam muito de bola e facilitavam pra mim. Como eu era veloz e habilidoso, encaixei fácil. Era o que o time precisava”, conta. “Não vou dizer que não fiquei nervoso, é claro que eu fiquei. Mas sempre fui um cara de muita personalidade”, disse. Com pouco mais de um metro e meio de altura, Naldinho sabe exatamente quantos gols de cabeça fez no Bahia: “Foram 15. Com essa altura, como é que esquece desses gols?”.