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Luiza Gonçalves
Publicado em 25 de junho de 2024 às 05:00
Pedaço de Mim é a nova produção nacional da Netflix, protagonizada por Juliana Paes e Vladimir Brichta, que estreia na próxima sexta-feira (5). A obra tem autoria de Angela Chaves (Éramos Seis, 2019) com direção artística de Maurício Farias. Descrita como melodrama, os 17 episódios unem emoção, reviravoltas e tramas familiares da telenovela com a modernidade e ousadia das séries na condução de sua narrativa. >
“É uma obra compacta em que toda cena faz a trama correr. E tem uma coisa muito legal para nós atores: a gente sabe o início, o meio e o fim, assim como um filme. Por outro lado, ela se vale de elementos que são do folhetim, das novelas como a gente conhece em geral, muito pautado nas relações familiares”, pontua Vladimir Brichta, que dá vida ao personagem Tomás.>
“No próprio tema, se você parte do plot inicial, já está dada a situação dramática”, exemplifica Juliana Paes. Na série, sua personagem Liana é uma terapeuta ocupacional que sonha em ser mãe, mas acaba tendo sua trajetória atravessada por uma violência que afeta seu casamento com Tomás. Após descobrir a infidelidade do marido, a protagonista sofre um estupro e, em uma raridade científica, ocorre uma gravidez de gêmeos de pais diferentes, chamada de superfecundação heteroparental.>
Liana, disposta a lutar para manter a situação em segredo, se vê em meio a uma confusão de sentimentos, sem saber se conseguirá amar igualmente as duas crianças e manter suas relações familiares. Um dos temas de destaque na série está no ato de ser mãe, em suas complexidades, conflitos e decisões, como pontua Juliana Paes: “A série vem falar não só sobre maternidade, mas sobre como temos pouca liberdade de escolha, de se colocar. Como a gente se sente culpada, cobrada, às vezes achamos que temos rede de apoio e não temos. E aí vem a violência sexual e o machismo estrutural permeando toda a trama do comecinho até o fim”.>
A falta de rede de apoio mencionada por Juliana também é ressaltada por Vladimir, que descreve seu personagem, o advogado Tomás, como um homem que à primeira vista deseja um casamento, um filho e, com o avançar da trama, se revela cada vez mais egoísta.>
“Claro que um casal pode estar em crise e que um caso extraconjugal, em uma relação monogâmica, é uma infidelidade, é um ato doloroso, mas não se trata só disso. Ele tem dificuldade de se colocar no lugar do outro e com Liana é uma loucura porque as coisas têm que ser do jeito dele. A mulher dele sofre um abuso e ele bota em xeque se foi isso realmente, se ela não quis, ele questiona o tempo inteiro. Ele é uma pessoa egocêntrica e isso vai ficando cada vez mais evidente”, diz o ator.>
Violência Sexual >
O debate sobre a violência sexual é latente em Pedaço de Mim, não só com a personagem Liana, mas também com uma ocorrência de estupro de uma jovem numa balada na série, que acarreta uma investigação policial. É possível ver os efeitos físicos e psicológicos nas vítimas, para além do ato em si, mas também como essas violências refletem em suas relações interpessoais, suscitando novas violências.>
“Pedaço de Mim sensibiliza no sentido de fazer com que as pessoas entendam que a questão não é preto no branco, o abuso não está só no lugar do entendimento racional, existem muitas sutilezas nesse processo que precisam ser vistas e respeitadas. Quando você assiste, é inevitável não se colocar na pele daquela mulher. E dessa maneira a gente pode contribuir para um debate mais saudável, mais voltado para a saúde pública e ouvindo-se mais as mulheres”, defende Juliana Paes.>
Também é posta em cena a banalização do estupro pelos abusadores, as reações daqueles que relativizam ou tentam acobertar os crimes e o acolhimento de profissionais da saúde, como acontece com a personagem Sílvia, interpretada por Paloma Duarte. A médica e irmã de Tomás descobre a circunstância por trás da gravidez de Liana, demonstrando apoio desde o início e é a primeira pessoa a nomear o ocorrido como um estupro.>
“O que me alegra é constatar que a série está cumprindo a sua função primordial como arte, que é trazer temáticas difíceis para reflexão, principalmente coincidindo com esse momento, em que assuntos como aborto e violência sexual estão na ‘pauta’. Eu gosto de frisar que a Liana tem status social razoável e, se tivesse só o filho do estupro, ela teria tirado, ela verbaliza isso e ela teria resolvido de maneira privada. E essa não é a realidade da maioria das mulheres brasileiras. É importante a gente lembrar que cada mulher tem a sua história, tem direito ao seu sentimento e a sua decisão só cabe a ela e mais ninguém”, declara Paloma Duarte.>
*Com orientação do repórter Roberto Midlej>