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Portal Edicase
Publicado em 10 de maio de 2024 às 16:28
Ser mãe e ter uma carreira não é algo simples – muito por conta da própria maternidade, que carrega imensos desafios, mas também por outro fator relevante nesta equação: a falta de preparo e empatia do ambiente corporativo.
De acordo com um estudo recente da Fundação Getúlio Vargas, quase metade das mulheres que usa a licença maternidade se afasta do mercado de trabalho após 24 meses – uma tendência que pode se manter até aproximadamente 47 meses depois. Além disso, das 247 mil mães ouvidas pela pesquisa, 50% passaram pela demissão após cerca de dois anos de usufruto da licença.
Para Julia Ades, sócia fundadora da APOEMA, ateliê de pesquisa que aproxima o universo corporativo de diferentes realidades, esse cenário gera alguns questionamentos. “As empresas entendem o que é o puerpério e conseguem dar as mãos para as mães? Essas profissionais são, de fato, acolhidas quando precisam sair mais cedo para buscar seus filhos? São compreendidas quando estão exaustas e pedem um dia a mais de prazo? O ambiente corporativo consegue, de fato, escutar essas mulheres?”, pontua.
Segundo a especialista, por mais que seja um tema em constante debate, ainda há muita resistência ao acolher a maternidade na prática. “Já ouvi, em muitos dos estudos que conduzi, mães relatando sentimentos de solidão e deslocamento dentro do universo corporativo, especialmente quando são as únicas ali dentro”, afirma.
Assim, alguns benefícios oferecidos pela empresa não são suficientes para essas mulheres. “Ao viver essa realidade, benefícios como salas de amamentação, auxílio-creche e kit de boas-vindas para o bebê perdem muito do seu significado quando são apenas vantagens vazias, que não conversam com a forma como a empresa acolhe aquela mulher”, completa.
Quando uma mulher se torna mãe, suas prioridades são realocadas. O que antes era importante para ela, perde lugar para seu foco principal: o filho. “Isso é um processo natural e não há como lutar contra”, reforça a executiva.
Nesse sentido, a especialista em pesquisa de comportamento destaca que a maternidade precisa ser, antes de tudo, mais estudada, compreendida e discutida no mercado de trabalho. “Uma visão 360º sobre o tema, que integra as diversas esferas desse contexto, é essencial para abrir espaço para as mães e, assim, compreender que a maternidade não é um impeditivo para o crescimento profissional”, destaca.
Com isso, as empresas precisam entender que adaptações terão de ser feitas para poderem continuar contando com o bom desempenho de determinada pessoa. “E o cuidado com a maternidade não é apenas uma questão de humanização, mas um aspecto fundamental quando se pensa em consolidar e reter times. Quanto menos as pessoas forem vistas, menos vontade elas terão de se manter nesse lugar”, complementa Julia Ades.
Nesse cenário, apesar de a liderança ter um papel muito importante dentro da organização, dificilmente há um planejamento de adaptação de uma mãe. “Ela simplesmente volta ao trabalho como se nada tivesse acontecido”, reforça a executiva.
Para a especialista, é aí que entra a abertura de espaço para que essas mulheres possam, a partir do acolhimento, mostrar seu poder no ambiente corporativo. E a empresa pode colocar isso em prática de algumas maneiras:
Poder sair um pouco mais cedo, entrar um pouco mais tarde, bloquear um ou outro horário na agenda, por exemplo, são ações que ajudam uma mãe a conciliar demandas pessoais e profissionais e, assim, aumentar a dedicação às atividades.
“Talvez ela precise sair às 16h para buscar seu filho, mas estará às 20h fazendo aquilo que precisa no trabalho. Flexibilidade, para mulheres que se tornaram mães, ao menos por algum tempo, pode ser uma grande aliada da saúde mental e do desenvolvimento na carreira “, revela Julia Ades.
Segundo a especialista, quando uma mulher se torna mãe e volta ao trabalho, é natural que esteja extremamente cansada, com menos energia, mas, ainda assim, pode estar feliz em voltar.
“Isso quer dizer que, por um período, é preciso pensar no retorno: como remanejar seu escopo? Como fazer com que, aos poucos, ela se adapte novamente? Como aliviar a sobrecarga dessa profissional para que ela consiga focar no que é mais importante? Como aproveitar seu desempenho da melhor forma e não a esgotar ainda mais? Como ajudá-la emocionalmente para que ela se sinta bem? Essas são perguntas que devem ser feitas pelas empresas”, afirma.
De acordo com a executiva, as mães só podem ser incluídas se forem bem recebidas por sua própria liderança. Nesse intuito, as empresas devem apostar em mais líderes mulheres que tenham filhos, em conteúdos sobre maternidade e treinamentos para pensarem em ações que considerem retornos e permanência na empresa.
“É preciso falar sobre a adaptação, realizar follow ups para entender como as mães têm se sentido e o que tem de ser adaptado. Também fazem parte da humanização da liderança as conversas sobre as famílias: perguntar como estão os filhos, incentivar que possam buscá-los na escola, entender como, afinal, essas mães estão se sentindo naquele ambiente. Não há como ignorar temas tão presentes na vida dos colaboradores”, reforça.
A possibilidade de trabalhar de casa também pode ajudar as mães. “Isso não quer dizer que o home office é algo simples para as mães que, muitas vezes, acabam trabalhando até mais do que no modelo presencial. Mas, nesse formato, podem parar para ajudar o filho, amamentar ou até mesmo tirar um rápido cochilo se estiverem exaustas”, pontua a especialista em pesquisa de comportamento.
Estar em casa, dependendo do contexto social e familiar, pode permitir maior flexibilidade para que uma mãe possa manejar seu dia e, assim, focar no trabalho a partir disso.
Para a executiva, uma pessoa que já se destacava, muito provavelmente continuará tendo um bom desempenho após ser mãe – a partir das adaptações necessárias , as empresas devem encorajá-las e garantir suas posições, promoções e, principalmente, confiar nessas mulheres.
“Não há nada que motive mais do que a confiança. Aqui, a liderança também é essencial: é preciso conversar, ter um plano, se dedicar àquela mulher e lembrar essa profissional que ela é competente no que faz. Se uma empresa der as mãos para uma mãe, ela irá segurar”, conclui.
Por Isabela Rodrigues