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Larissa Almeida
Publicado em 27 de novembro de 2024 às 06:06
Por muito tempo, a rotina da servidora pública Márcia Rodrigues Araújo, 56 anos, contava com dedicação às tarefas domésticas pela manhã, expediente das 12h às 19h, e atividades físicas à noite. A partir de 2018, no entanto, tudo mudou. Foi naquele período que ela começou a sentir dores nas costas, algo que, a princípio, não assustou, visto que já tinha histórico de problemas na coluna. Só que a dor persistiu por pelo menos dois anos, e veio acompanhada de encurvamento da coluna, além de diversas crises. O ponto mais crítico se deu em setembro de 2020. >
“No dia 29 de setembro, eu tive uma dor aguda na lombar quando me levantei pela manhã. Eu não aguentei, gritei de dor e senti que ia cair, daí me agarrei na parede. Chamei minha filha, que me socorreu e me ajudou a deitar na cama. [...] A dor piorou ao longo daquele dia e eu fui à emergência. O médico passou analgésico, e não melhorou. Quando ele passou morfina, a dor não cedeu. Foi quando eu disse: ‘tem algo errado aí”, narra Márcia. >
Realmente havia algo errado, mas Márcia só veio descobrir isso dias depois. Na madrugada do dia 30 de setembro, o médico chegou a lhe dar alta, mesmo sob protestos dela e da filha. Resistente, em vez de ir para casa, a servidora pública pediu para ser internada novamente quando chegou à recepção. Por acaso, um médico residente em Ortopedia passava pelo local enquanto ela relatava o que estava sentindo à recepcionista. >
“Ele disse que eu poderia voltar para a poltrona de observação e que ele mesmo me internaria. Assim foi. Por volta das 2h, foi admitida para a internação e, mais tarde, o residente foi junto com o médico ortopedista especialista, que solicitou a ressonância magnética e exames de sangue. No final da tarde, eles disseram que a ressonância tinha indicado múltiplas faturas em toda a extensão da coluna e que suspeitavam de doença no sangue”, conta. >
A doença em questão era o mieloma múltiplo, um tipo raro de câncer no sangue, e o diagnóstico foi confirmado no dia 1º de outubro. Na sequência, Márcia descobriu que tinha lesões nos ossos que iam do pé até o crânio, de modo que não havia explicações médicas para o fato de ela estar viva. Por isso, o cuidado foi intenso dali em diante: ela foi proibida de se levantar, andar e se sentar, porque qualquer movimento poderia ocasionar a quebra de uma vértebra, o que pioraria a situação. >
Por uma semana, a servidora pública ficou restrita ao leito do hospital, fazendo uso de um colete cervical. Foi quando a cmpreensão quanto a gravidade da doença veio. “Eu pensei que era o fim da minha jornada. Pedia a Deus que ele tivesse misericórdia de mim e me ajudasse a ver meu filho que estava fazendo Medicina se formar, e que eu pudesse ver minha filha, que estava com 19 anos na época, encaminhada na vida”, diz Márcia. >
Na semana seguinte ao diagnóstico, a servidora começou a quimioterapia, que promoveu o controle das dores. Em fevereiro, ela fez o transplante autólogo – terapia que consiste no recebimento de medula óssea vinda do próprio paciente – e teve sucesso no tratamento. Como efeito colateral, passou 100 dias com uma dieta restrita, enquanto ainda fazia uso de terapia oral. >
Em maio de 2023, o mieloma múltiplo voltou mais agressivo. Foi quando Márcia foi convidada a fazer parte de uma pesquisa clínica com bioespecíficos, um tipo de tratamento que combina medicações para combater o mieloma. Ela aceitou e passou a fazer o tratamento no Hospital São Rafael. Em menos de três meses, teve remissão total da doença. >
“Foi muito bom ter entrado nessa pesquisa clínica pela eficácia da medicação. O líder da pesquisa, o médico Edvan Crusoé disse que eu estava no lugar certo e na hora certa. Eu tive uma resposta excelente e agora faz um ano e seis meses que dou continuidade ao tratamento”, relata. >
Como efeito colateral, Márcia teve enfraquecimento do sistema imunológico, o que reativou o citomegalovírus no organismo. Como resultado, ela teve catapora em 2023, que foi tratada com a ajuda da farmacêutica, que também ajudou a custear a internação e o deslocamento da paciente nos dias de consulta. Neste ano, no fim de fevereiro, outro baque: Márcia foi diagnosticada com Covid-19. >
Com todas as vacinas contra o coronavírus em dia, a servidora pública não teve complicações, mas precisou ficar internada por 35 dias até que o teste desse negativo para o vírus. Em maio, ela teve outra surpresa desagradável ao ser diagnosticada com herpes-zóster e, em junho, teve uma bronquite. Apesar de todos os problemas, Márcia quis dar continuidade ao tratamento do mieloma, que agora acontece a cada dois meses. >
“Conviver com os impactos doença não é fácil por conta das limitações. Eu não posso pegar peso e preciso evitar o risco de fraturas e quedas. Alguns serviços domésticos que eu fazia antes do mieloma múltiplo já não consigo mais fazer, como estender a roupa no varal. Como eu perdi seis centímetros da minha estatura, não posso usar salto e é difícil dirigir. Mas, apesar disso, eu procuro ter uma vida normal. Afinal, é a minha nova etapa: com restrições, mas com vida”, finaliza. >