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Carol Neves
Publicado em 21 de julho de 2025 às 15:00
Uma droga com uso reconhecido na medicina e histórico sombrio fora dela voltou ao radar no Reino Unido. A escopolamina, popularmente chamada de “sopro do diabo”, tem ganhado espaço em relatos de crimes no país. O composto, derivado de plantas da família das solanáceas, é legalmente usado para tratar náuseas, enjoos e espasmos, mas fora do ambiente clínico tem sido associado a roubos, agressões e até homicídios, tudo isso por conta de seu efeito mais temido: apagar a memória das vítimas.>
Embora casos envolvendo escopolamina sejam mais comuns em países da América do Sul, como a Colômbia, o Reino Unido começa a registrar ocorrências preocupantes. O primeiro assassinato relacionado à substância no país ocorreu em 2019, quando o dançarino Adrian Murphy foi envenenado em Londres. Mais recentemente, uma mulher afirmou ter sido atacada em um transporte público, apresentando sintomas compatíveis com os efeitos da droga.>
Segundo artigo de Dipa Kamdar no The Conversation, a escopolamina atua bloqueando a acetilcolina, neurotransmissor essencial para funções como memória e equilíbrio. A interrupção dessa via neurológica explica a amnésia e a confusão que a droga provoca. Os efeitos colaterais incluem visão turva, alucinações, sonolência, aceleração dos batimentos cardíacos e desorientação. Em doses elevadas ou fora do uso médico controlado, os riscos aumentam, podendo levar à morte mesmo em quantidades inferiores a 10 mg.>
Seu apelido popular, “sopro do diabo”, se deve à forma como às vezes é administrada: em pó, inodora e insípida, pode ser dissolvida em bebidas ou mesmo soprada no rosto da vítima. Em fóruns da internet, há relatos de preparo artesanal a partir de flores, raízes e sementes de plantas que contêm o composto, uma prática que aumenta ainda mais o risco de intoxicações graves.>
Apesar dos riscos, a escopolamina ainda é usada em consultórios e hospitais. No Reino Unido, é encontrada sob nomes como Kwells e Scopoderm, sendo comum em adesivos contra enjoo. No Brasil, a versão mais conhecida é o Buscopan, indicada para dores abdominais. Além disso, é usada para reduzir a salivação antes de cirurgias, tratar crises de vômito e, em alguns casos, auxiliar no combate à depressão e ao tabagismo, sempre com prescrição médica.>
Historicamente, a substância já era usada em rituais por comunidades indígenas da América do Sul, que conheciam bem seus efeitos alucinógenos. Hoje, o mesmo princípio ativo virou ferramenta de criminosos. Na Colômbia, é conhecido como “burundanga” e aparece com frequência em denúncias de roubos e abusos, geralmente cometidos enquanto a vítima está em estado de total submissão, sem controle ou lembrança do que aconteceu.>
Especialistas apontam que a escopolamina afeta áreas do cérebro ligadas ao controle e à memória, o que explica o comportamento passivo das vítimas. Muitas relatam sensação de sonho, obediência automática e lacunas completas nas lembranças. Com efeito rápido e curta permanência no corpo - cerca de 12 horas -, a droga ainda apresenta outra vantagem para quem a usa de forma criminosa: é difícil de detectar em exames toxicológicos de rotina.>