Arte no cárcere: projeto oferece oficina de cerâmica a presos em penitenciária baiana

Iniciativa atende seis detentos e já teve até um estande fixo de vendas em grande shopping da capital

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  • Carol Aquino

Publicado em 24 de junho de 2017 às 05:45

- Atualizado há um ano

Na entrada da administração da Penitenciária Lemos Brito, um grande painel em mosaico alivia a dureza do lugar. Em outros pontos do Complexo da Mata Escura é possível ver peças semelhantes. A obra de arte é fruto do trabalho dos próprios presos que participam do projeto Libertarte, idealizado pelo artista visual Eliezer Nobre. Na oficina, os internos aprendem a fazer painéis e objetos decorativos, usando como base a técnica do mosaico em pastilhas de cerâmica.“Quero estimular a beleza, a educação. O cárcere é duro. Por que não usar a beleza para contrapor?”, questiona o artista. No projeto, são produzidos quadros, porta-retratos e outros objetos de decoração, além de grandes painéis, com base nos desenhos de Eliezer.O interno mais antigo no projeto é Lázaro Bonate, 67. Participando há dois anos e cinco meses e às vésperas de passar para o regime semiaberto, ele não vê a hora de montar a sua própria oficina. “Quero fazer quadros para vender para as pessoas”, disse.EstreiaO trabalhador rural Benício Nascimento, 65, começou na Oficina de Mosaico no dia da visita do CORREIO ao projeto. Devagar e com paciência, ele vai aprendendo a mexer nas ferramentas e colando as pecinhas que irão cobrir a figura de um carro.A cada três dias trabalhados no presídio, um é abatido da pena; presos aprendem a fazer painéis e objetos decorativos, usando pastilhas de cerâmica (Foto: Marina Silva/CORREIO)Condenado a 12 anos e meio de prisão, ele não contou o que fez, só que cometeu uma “loucura” em 1995. Para ele, a passagem pelos programas de ressocialização é uma chance de aprender uma nova profissão e de ter melhores perspectivas de futuro. “Tô aprendendo alguma coisa aqui e, quando eu sair, vou melhorar as minhas condições. Isso (a oficina) ajuda o dia a passar mais rápido. Ficar encarcerado e sem atividade é muito ruim”, resume.O projeto, que já teve 15 internos e hoje só seis executam o trabalho, já teve até estande fixo de vendas em um grande shopping da capital. Mas ao longo do tempo, foram acabando as parcerias. “Precisamos de matéria-prima, de uma loja para escoar os produtos, de um site institucional, de mais ferramentas”, explica Eliezer.Diminuição da penaA participação no Libertarte é geralmente destinada a detentos mais velhos, já que as outras atividades, como capinagem e trabalho com esquadrias, exigem grande esforço físico. O trabalho na penitenciária ajuda na diminuição da pena - a cada três dias trabalhados, é abatido um dia.Nem todas as atividades são remuneradas - a Libertarte não é. Mas a fila para trabalhar é grande. Atualmente, dos 1.500 internos da Lemos Brito, 400 esperam abrir uma vaga para o trabalho, outros 500 estão em atividade, sendo que pouco mais de 300 são remunerados.Painel feito pelos presos enfeita a entrada da administração da Penitenciária Lemos de Brito(Foto: Marina Silva/CORREIO)“Essa remuneração é muito importante para eles. Mesmo estando aqui, eles podem prover a família”, disse o superintendente de ressocialização da Secretaria de Administração Penitenciária e Ressocialização da Bahia (Seap), Luís Antônio Fonseca. Do total da remuneração (R$ 702,75), 75% ficam com a família do preso e os outros 25% são depositados em uma conta. O valor é liberado após a soltura do detento.Embora não haja estatísticas oficiais sobre a taxa de reincidência criminal dentro da Lemos Brito, Fonseca estima que 95% dos presos que trabalham dentro da cadeia não voltam a delinquir, enquanto que este índice seria de 30% a 35% para os que ficam no regime convencional.Além da oficina de arte, os presos também têm acesso à educação, com aulas de ensino básico e cursos profissionalizantes, mais atividades esportivas e culturais. “Esse homem que passa pela ressocialização se vê de outra forma e passa a ver o mundo de outra forma”, diz o superintendente da Seap. Para ele, essas atividades desenvolvidas durante o cárcere ajudam o preso a resgatar a autoestima e a se sentir integrado novamente à sociedade.O artista visual Eliezer Nobre é o idealizador do projeto Libertarte, que atende detentos na Lemos de Brito e conta com um estande fixo de vendas num shopping da capital (Foto: Marina Silva/CORREIO)