Chefs contam histórias de receitas que desandaram e outros perrengues na cozinha

Confira algumas histórias de situações desesperadoras vivenciadas por chefs de cozinha que os clientes nunca ficaram sabendo

  • Foto do(a) author(a) Ronaldo Jacobina
  • Ronaldo Jacobina

Publicado em 23 de maio de 2020 às 08:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: .

Reza a lenda que um dos clássicos da cozinha francesa, a Tarte Tatin nasceu de um erro da cozinheira Stéphanie Tatin que encantava os clientes do seu restaurante, no Vale do Loire, com uma torta de maçã supimpa. Certa feita, a moça teria se distraído enquanto preparava a receita e, quando se deu conta, havia colocado a torta no forno sem a massa. Com a casa cheia e o desespero instalado, jogou a massa por cima das maçãs caramelizadas e decidiu servir o “desastre” ainda quentinha. Os clientes amaram! Esperta, no dia seguinte lá estava o “erro” no cardápio. 

A história da culinária mundial é recheada de erros. Não há cozinheiro que não tenha um perrengue no seu cardápio. Receitas que desandaram, esquecimentos de ingredientes, episódios tragicômicos no salão, e uma série de desacertos na cozinha, chegaram a inspirar a jornalista e crítica gastronômica do jornal O Globo, Luciana Fróes a registrar em livro, relatos de chefs estrelados sobre situações inusitadas vividas entre o fogão e o salão. Longe de querer repetir o feito literário da autora do Tô Frito (Editora Rocco), nos inspiramos na obra - que reuniu causos contados por Claude Troigros, Alex Atala, Roberta Sudbrack e Thiago Castanho – e fomos atrás de relatos de algumas de nossas estrelas da cozinha.  (Divulgação) Laurent Rezette conseguiu enganar comensais com receita que deu errado O belga Laurent Rezette (Chez Bernard), assim como a chef Tatin, “assassinou” outro clássico da confeitaria francesa, a Bavaroise. “Participava de uma confraria que reunia chefs amadores e profissionais, e neste dia, me coube fazer a sobremesa que levava morangos frescos. Na hora de preparar, a mousse de morango desandou e ficou com um fracasso”, conta. Como não dava tempo de preparar outra, ele resolveu bancar o cara de pau, e aproveitar a mistura. Colocou a mousse sobre a massa de biscoito e, com um martelo, bateu sobre cada prato, espalhando tudo. “Foi uma explosão de mousse que fez um efeito artístico maravilhoso. Aí me animei, acrescentei o chantilly, quebrei o biscoito, joguei por cima, passei açúcar glacê e fui levar ao salão explicando ser aquela uma receita, que aprendi com minha avó”, conta às gargalhadas. Rezette diz que os confrades adoraram e não desconfiaram de nada. “Saberão hoje aqui, lendo o Correio”, brinca.  (Divulgação) Danilo Fernandes levou ingredientes e esqueceu as panelas  Errar uma receita é grave, mas cozinhar sem panela, é difícil! Foi o que aconteceu com o chef Danilo Fernandes, hoje no comando da cozinha do Amado. Ele conta que, certa vez foi contratado para um evento num clube e, quando foi preparar a comida, percebeu que havia esquecido as panelas. “Entrei em desespero porque não dava tempo de voltar ao restaurante para buscar”, lembra. Enquanto os convidados circulavam pelo salão, Danilo corria em busca de ajuda que veio de um colega que chefiava o restaurante do clube. “No final deu tudo certo, mas foi desesperador”. (Divulgação) Lisiane Arouca derrubou uma torta sobre a cliente Desespero mesmo viveu a chef confeiteira Lisiane Arouca tempos antes de ter uma cozinha só para ela nos restaurantes Ori e Origem “Era 2005 e eu fazia bolos por encomenda em casa. Num sábado, depois de ter passado a madrugada trabalhando, muito cansada, a cliente veio buscar a torta de morango que tinha encomendado e, quando fui à porta entregar, tropecei e joguei o bolo em cima da cliente. Ela ficou toda suja, e sem o bolo. Fiquei arrasada, mas ela foi muito querida e, como a festa era à noite, deu tempo de preparar outra. Mas chorei muito e, durante muito tempo, sonhava com esse episódio”. Não é fácil pra ninguém.

A chef Tereza Paim coleciona boas histórias de bastidores. “Hoje a gente ri, mas na hora...”, diz. Um destes episódios aconteceu numa cidade do interior onde ela foi preparar um jantar para quase mil convidados. “Convidei a chef Monica Rangel pra fazer a cozinha mineira e eu fiquei com a baiana. Quando chegamos lá, descobrimos que o purê de banana dela se misturou com a mandioca do meu bobó. Ficamos loucas, porque não tínhamos como fazer outros, estava em cima da hora. Experimentamos a mistura, a consistência estava boa, então resolvemos arriscar e servir a mistura. Nascia ali o Bobó Quietinho (numa referência a Minas Gerais, terra de Mônica), que virou um sucesso que já levamos até pra fora do país!”. (Divulgação) Angeluci Figueiredo esqueceu de colocar sal na comida Quando dá pra perceber o erro e, de alguma forma consertar, tudo bem, mas só se dar conta depois que a comida foi servida, é grave! Foi o que aconteceu com Angeluci Figueiredo no restaurante Preta. “Abri o restaurante neste dia só para receber uma importante crítica de gastronomia e dois artistas baianos, preparei um banquete. Depois que eles comeram tudo, sem reclamar, constatei que não havia colocado sal em nada. Fiquei tão sem graça que não cobrei a conta. Fiquei muito mal com a situação”. (Divulgação) Fabricio Lemos subiu no telhado para consertar goteira do salão  É. Vida de restaurante não é moleza. O chef Fabrício Lemos diz que perrengue é o que não falta quando se trata de cozinha. “Certa vez, restaurante lotado, muita chuva, apareceu uma goteira no salão. Subi no telhado para verificar e descobri que estava cheio de folhas, tentei limpar, mas com o volume de água, desceu tudo e desabou parte do teto de gesso. A sorte é que, embora o restaurante estivesse lotado, não atingiu nenhuma mesa, mas foi um desespero para tirar a água do salão”.   (Divulgação) Falta de energia quase estragou noite de convidados de Guto Lago  Agora imagine só a cena: um jantar especial, com todos os lugares vendidos, e a energia elétrica vai embora! Foi o que vivenciou o chef Guto Lago, no Villa Bahia. Horas depois, convidados chegando, velas iluminando o salão – que os comensais acharam tratar-se da proposta da noite – e a cozinha em clima de desespero. Boa parte dos pratos carecia de equipamentos elétricos para o preparo. Vinho daqui vinho dali e nada do serviço andar. A noite se alongou e os pratos demoraram horas para sair, mas no final, o chef tirou de letra, aguentou firme, e apresentou todo o menu programado. Depois de tomarem conhecimento do acontecido, a competência do chef foi reconhecida e ele chegou ao salão esbaforido, e foi recompensado com aplausos.