Ilê Axé Opô Afonjá denuncia ao MP mais um ataque a Mãe Stella de Oxóssi

Ofensa foi feita nas redes sociais após nome de ialorixá batizar avenida em Stella Maris

Publicado em 3 de janeiro de 2019 às 04:00

- Atualizado há 10 meses

. Crédito: Foto: Betto Jr/CORREIO

A ialorixá Mãe Stella de Oxóssi, uma das maiores representantes do Candomblé no país e que morreu há uma semana, foi alvo de injúria racial nas redes sociais. A agressão foi publicada por uma mulher identificada como Taiane Fragoso, na página do prefeito de Salvador, ACM Neto, no Instagram, após post do gestor sobre a inauguração da Avenida Mãe Stella de Oxóssi, na manhã dessa quarta-feira (4).

No comentário, publicado por Taiane com o próprio perfil, a agressora chama a homenagem de "absurdo" e ofende Mãe Stella. "Absurdo colocar o nome de uma avenida o nome dessa macumbeira (sic). Em vez de procurar a Deus, vai procurar fazer macumba para o mal dos outros", afirmou. Em contato com o CORREIO, o ogã Ribamar Daniel, do Ilê Axé Opô Afonjá, responsável pela solicitação da representação ao Ministério Público do Estado da Bahia (MP-BA), disse que a mulher é uma professora da rede privada da capital. A publicação chegou ao conhecimento do terreiro após contato de um pai de santo, que teve acesso ao post.

Em contato com a assessoria de imprensa do colégio citado na representação do terreiro, a reportagem foi informada de que se trata de outra instituição, também privada. Na página da mulher no Instagram, de onde ela fez o comentário ofensivo, não é possível enviar mensagem - já que o perfil, que é privado, permite que apenas seguidores entrem em contato.  Taiane ofendeu Mãe Stella em publicação no Instagram (Foto: Reprodução) Representação No perfil do Facebook, Taiane afirma que já trabalhou no Colégio Mendel de Vilas do Atlântico e que é formada pela Universidade Federal da Bahia (Ufba). O CORREIO tentou contato, mas a mulher não respondeu as mensagens. 

A representação (veja PDF abaixo), endereçada à promotora de Justiça Lívia Vaz, coordenadora Grupo de Atuação Especial de Defesa da Mulher e da População LGBT, representantes do Ilê Axé Opô Afonjá denunciam a agressão e, em texto de três páginas, lembram que "a discriminação religiosa é crime no Brasil, constitucionalmente um Estado Laico, desde 27 de dezembro de 2007" e, ainda, que no dia 21 de janeiro é celebrado o Dia Nacional de Combate à Intolerância Religiosa.

A reportagem também procurou a assessoria de comunicação do MP-BA e a promotora Lívia Vaz, mas não conseguiu contato. O documento, assinado pelo próprio Ribamar, solicita que o MP-BA "proceda com as medidas cabíveis" contra o ataque à mãe de santo, que morreu aos 93 anos, vítima de falência múltipla dos órgãos, na tarde do dia 27 de dezembro, no município de Nazaré das Farinhas, no Recôncavo. 

Ódio O ogã Rimbar Daniel disse que leu com tristeza o comentário de Taiane Fragoso e que o desejo da comunidade do Ilê Axé Opô Afonjá é de que a mulher se retrate. "Procurei o Ministério Público logo que tive acesso aos prints na página do prefeito. Porque é algo muito sério, especialmente em se tratanto de uma personalidade como nossa Stella", comentou.

O modo como a agressora se refere à mãe de santo, segundo Daniel, age como um "acelerador de raiva e serve apenas para criar e disseminar o ódio entre as pessoas. Nós vivemos um momento tão triste e de dificuldade para fazer o enterro, precisamos acionar a Justiça, o que foi péssimo. E agora isso". Ribamar Daniel comentou que falou diretamente com Lívia Vaz, que, segundo ele, está responsável pela apuração do caso. "O Brasil é um país laico, todos nós temos o direito de expressar e viver nossa religião. Nos sentimos ofendidos mais uma vez, não podemos e não vamos aceitar isso de jeito nenhum", acrescentou o ogã.  Em perfil privado, Taiane não permite mensagens de não seguidores (Foto: Reprodução) "Somos de uma religião espiritualizada, aceitamos a morte, mas a ausência fisica dela nos faz muito tristes, ela faz muita falta", lamentou o ogã. 

Durante coletiva de imprensa realizada no Festival Virada Salvador, onde se apresentou na segunda-feira (31), o cantor Márcio Victor, líder do Psirico, comentou a morte da ialorixá e falou sobre intolerância religiosa:"O Candomblé é uma religião muito bem resolvida, de gente unida. Se for o caso, sentamos na mesa e divide o mesmo bife. Vou guardar Mãe Stella em vida, sempre. Pessoas que criticam, reclamam, falam dos nossos costumes, elas não são felizes. O Candomblé é o meu motivo de ser feliz", disse Victor, que cantou Firme e Forte em homenagem à mãe de santo. Para o ogã Rimabar Daniel, Mãe Stella merece ser lembrada como um símbolo de afeto, respeito e luta contra a desigualdade.