Piritiba, capital tecnológica do semiárido

Eduardo Athayde é diretor do WWI-Worldwatch Institute no Brasil

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Publicado em 26 de maio de 2018 às 01:34

- Atualizado há um ano

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O semiárido abrange mais de 20% dos municípios brasileiros (1.135) e ocupa 18,2% (982.563 km²) do território nacional. Historicamente divulgado apenas pela pobreza e a ignorância, está recebendo a luz do conhecimento e começa a inovar sustentavelmente, destravando seus potenciais e exibindo suas imensas riquezas.

Abrigando 11,8% da população do país, 24 milhões de brasileiros vivem na região, sendo 63% urbanos e 37% rurais (IBGE); 42% da população é formada por crianças e adolescentes na faixa etária de 0 a 17 anos - a geração que brevemente estará sentada nas cadeiras de comando. Pensando nesses jovens, os cidadãos da pequena e ousada Piritiba (990,6 km²), situada no Piemonte da Chapada Diamantina, lançaram o Instituto Tecnológico de Piritiba - ITPi.

Suprapartidário, privado e sem fins lucrativos, criado para colocar o semiárido no circuito internacional de inovação, ciência e tecnologia,o instituto busca governanças novas. A eficiência energética, renovável está na mira. O Atlas Solarimétrico da Bahia, produzido para aprimorar o desenvolvimento da energia solar fotovoltaica através de informações de qualidade, foi lançado no mesmo dia, no Senai/Cimatec, em Salvador; e no ITPi, em Piritiba. Sinais dos tempos.

A virada global da velha economia analógica para a eco-nomia digital desperta potenciais adormecidos. A ideia de cidade capital dissolve-se para dar lugar a “ponto do planeta”, antes chamado de “meio do nada”.Os locais que tiverem garra, competência inovadora e tecnológica vão se estabelecer e ganhar primeiro. É isso que está sendo orquestrado pela sociedade civil organizada piritibana, onde os cidadãos, indistintamente de partidos ou tendências, fizeram um pacto em prol das futuras gerações.

Ávido por parcerias que chama de “inusitadas”, o embaixador de Israel,  Yossi Shelley, em recente visita à Bahia, mostrou interesse em conhecer a energia inovadora que vibra em Piritiba. Convênios com o instituto agrícola israelense Volcani [www.agri.gov.il], um dos mais respeitados do mundo, está no radar. Com uma área total de 22.072 km² (Sergipe tem 21.910 km²) e 8.5 milhões de habitantes, 60% do território de Israel é deserto e o resto é árido. Situado às margens do Mar Mediterrâneo, as médias anuais de chuvas diminuíram 50% nas últimas cinco décadas e, no mesmo período, a economia do país cresceu 70 vezes.

Israel obtém 85% de sua água através da dessalinização (em 2020 serão 95%), a um custo de US$ 0,50 por mil litros, para o abastecimento da sua população de 8.9 milhões de habitantes, os 200 mil hectares com 14 mil fazendas irrigadas, e mais de mil complexos industriais, transformando um dos países mais secos do mundo na maior potência hidro-tecnológica do planeta. A viabilidade econômica da dessalinização de águas salobras do semiárido pode ser viabilizada com transferência de tecnologias israelenses.

Inspirado nos agricultores que plantam sementes de feijão, verduras e capim, e sabendo que agora o agronegócio é sinônimo de eficiência e tecnologia, o ITPi, reconhecendo o potencial do semiárido, está buscando parcerias com o Senar e o Sebrae e plantando sementes de um ecossistema local de startups para conectar-se com ecossistemas nacionais, como o All Saints Bay [goo.gl/aQbxoz], em Salvador - Capital da Amazônia Azul; o de Santa Rita do Sapucaí [goo.gl/cyAVzH] e o de São Pedro Valley [sanpedrovalley.org], ambos em Minas Gerais. A nível internacional estão em pauta o Silicon Valley, na Califórnia; Israel, e o Agritech,no Texas.

Na eco-nomia digital, onde, com um simples click no celular faz-se videoconferência a custo zero com o outro lado do mundo, tecnologias são transferidas a “toque de dedo”. Lá do Poço Feio, um lindo ambiente formado pelo canion do Rio Jacuipe, sede natural do ITPi, os cidadãos de Piritiba parecem estar escrevendo a história do nosso futuro, plantando as sementes da capital tecnológica do semiárido.

Eduardo Athayde é diretor do WWI-Worldwatch Institute no Brasil.