Produtores estão mais confiantes para investir nas fazendas baianas

Inovação e soluções para o agronegócio baiano são discutidos em evento em Vitória da Conquista

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  • Mario Bitencourt

Publicado em 11 de novembro de 2019 às 11:45

- Atualizado há um ano

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Durante anos, a visita de um agente do Ibama numa propriedade rural era precedida do medo de uma multa ou da negativa para a realização de um determinado serviço, como licenciamento ambiental, outorga de água, ou vistoria para supressão de vegetação nativa. Hoje, com a mudança de postura por parte de órgãos ambientais federais, como o Ibama e o ICMBio, esse medo tem ficado para trás, segundo relatam produtores rurais que promovem o desenvolvimento do agronegócio da Bahia. O sentimento atual é o de que os órgãos ambientais estão mais próximos do setor.

Um desses produtores é Fabiano Borré, responsável por tocar um projeto de enoturismo que envolve a construção de um complexo que reunirá hotel, restaurante e vinícola (o total do investimento ultrapassa R$ 50 milhões) em Mucugê, município de 9 mil habitantes, na Chapada Diamantina. “Antes, a gente tinha medo do pessoal do meio ambiente, mas a mudança de postura que vemos hoje, com os órgãos ambientais procurando nos atender, dentro da lei, nos dá mais segurança para fazer os investimentos”, disse Borré durante o I Fórum de Inovação e Sustentabilidade para a Competitividade (FISC), realizado no sábado (9), em Vitória da Conquista. 

No FISC, que fez parte da programação da e-Agro, feira de inovação e tecnologia voltada para o agronegócio iniciada na sexta-feira passada e finalizada ontem, Borré contou a história da Fazenda Progresso, localizada no pé da Serra do Sincorá e onde são produzidos batatas e cafés especiais vendidos em onze países. Borré faz parte da terceira geração da família que está à frente da fazenda e aposta na diversificação das atividades econômicas no campo para fortalecer o desenvolvimento dos negócios. E para que essa diversificação ocorra, ele diz que “tem de haver sintonia entre os órgãos públicos, sejam ambientais ou ligados à agricultura”.

Também presente na FISC, onde realizou palestra com o tema “Desafios e Oportunidades”, relacionando as atividades de meio ambiente com o agronegócio, o superintendente do Ibama na Bahia, Rodrigo Alves, afirmou que a mudança de postura do Ibama é reflexo de uma sociedade que deseja um estado mais eficiente e que apoie o desenvolvimento, com sustentabilidade e respeito ao meio ambiente, “mas de uma forma mais humana, próxima, não ideológica”.

“Pode até parecer, mas a forma como estamos atuando, dentro da legislação, não é novidade. Estamos apenas pondo em prática a legislação que já existe, e ela diz que a política de meio ambiente envolve a proteção ambiental com o desenvolvimento da vida”, disse Alves. “A legislação ambiental impõe aos órgãos ambientais a cooperação e a aproximação com os setores produtivos, seja o agronegócio, a indústria, as academias. Estamos cumprindo a legislação sem as amarras ideológicas”, completou o superintendente. 

Ele também defende um fortalecimento maior do Sistema Nacional do Meio Ambiente (Sisnama). Regulamentado pelo Decreto Federal 99.274, de 06 de junho de 1990, e constituído por órgãos da União, Estados, Distrito Federal, Municípios e fundações, o Sisnama, na opinião de Rodrigo Alves, é um dos caminhos para criar uma legislação ambiental mais moderna e próxima do produtor rural. “Já vimos, no passado que a atuação de órgãos ambientais em situações que não são de sua atribuição gerou um conflito, então, a partir do momento que cada um dos entes se mantém firme em atuar de acordo com os limites de suas competências, há um fortalecimento do Sisnama e toda a sociedade sai ganhando”, comentou.

Sem medo e sem assistência Mas, se por um lado a área ambiental tem deixado de ser um fator que trava o desenvolvimento dos produtores rurais, há outro fator essencial para que ocorra um mínimo de progresso e que favorece ao acesso a tecnologias e novas formas de lidar com a atividade agrícola: a assistência técnica, sobretudo a pública.

Durante o FISC, a falta de acesso à assistência técnica por parte dos produtores rurais foi um dos temas mais falados. Hoje, esse tipo de assistência praticamente inexiste.  O presidente da Cooperativa Mista Agropecuária Conquistense (Copmac), entidade que reúne produtores de café arábica no Planalto da Conquista, o produtor rural Jaymilton Gusmão, é um dos principais críticos desa ausência.  “Pesquisa, fomento e assistência técnica têm de ser compartilhado com a sociedade”, disse. “Hoje não existe assistência técnica na Bahia, quem faz é o meio particular, com as associações e cooperativas, diferente de outros estados, como os do Sul do país, onde vemos agências de assistência técnica pública fazendo trabalhos enormes e de grande valor. Aqui na Bahia, o governo deixou isso se acabar”, criticou.

Na Bahia, assim como em outros estados do país, a assistência técnica vem sendo realizada pela Confederação Nacional da Agricultura (CNA), em parceria com o Sistema Nacional de Aprendizagem Rural (Senar), que promove também cursos diversos voltados para o desenvolvimento no campo.

Vice-presidente administrativo-financeiro da Federação da Agricultura e Pecuária da Bahia (Faeb), Guilherme Moura disse, durante o FISC, que “entende que qualquer segmento econômico tem que inovar e ser competitivo, e a única forma de a inovação chegar ao produtor é por meio da assistência técnica”. “Então, nós como sistema Faeb/Senar, entendemos que é questão prioritária ter acesso à tecnologia e poder inovar. Se outros órgãos públicos puderem se aproximar de nós para fazer esse trabalho, ótimo. Mas nós também tomamos a decisão de não depender deles. Essa é a decisão nacional, estamos aportando muitos recursos para viabilizar a assistência técnica, e mesmo sem eles [governos] a gente vai avançar”, declarou.

Outras oportunidades Além de apontar ações necessárias e mudanças em curso para o bom desenvolvimento do agro, o FISC também apresentou oportunidades de negócios e de inovação voltados para a área rural, a exemplo do  Aqualuz, um equipamento que purifica a água de cisternas a partir da exposição ao sol e à incidência dos raios ultravioleta.

Uma das novidades para o setor é o Senar AgroUp, uma Rede Nacional de Inovação para o Agronegócio que está sendo desenvolvida desde maio na Bahia, Mato Grosso do Sul, Rio Grande do Sul, Rondônia e Minas Gerais, pela CNA, em parceria com o Senar.

Em cada região, é desenvolvido um tipo de trabalho, com a reunião de demandas específicas, coletadas junto a diversos atores e parceiros, sobretudo ligados aos sindicatos rurais associados à Faeb. 

O AgroUp reúne dados sobre inteligência analítica, criativa e visão empreendedora, para contribuir ativamente com a transformação tecnológica no campo, por meio da identificação das reais necessidades dos produtores rurais e da busca de soluções.

Segundo informou Matheus Ferreira, coordenador de Inovação do Sistema CNA/Senar, o AgroUp já coletou informações sobre nove cadeias produtivas em 31 cidades, nas culturas de arroz, bovinocultura de corte e leite, cafeicultura, fruticultura, milho, piscicultura, soja e trigo. Ao todo, 317 produtores rurais relataram 897 problemas.

Uma das percepções com esse levantamento é que produtores que recebem capacitação e assistência técnica estão mais propensos a adotar tecnologias e avançar com a produção. “É notável a evolução vista, por exemplo, de áreas que são de pastagens e foram recuperadas com base nas nossas orientações. Elas se tornaram muito mais produtivas”, afirmou.

Diretor da WWI-Worldwatch Institute no Brasil, Eduardo Athayde, que no FISC realizou uma palestra com o tema “e-Agro na eco-nomia digital”, observou que o mundo dos negócios está “na palma das nossas mãos”. “O que temos de buscar é estar conectados com o mundo e perceber as oportunidades, ter mais visão de futuro, pensar grande, em fazer negócios não só locais, mas internacionais. Isso que podemos desenvolver melhor quando temos boas tecnologias em nosso favor”, comentou. 

É esse tipo de pensamento tem a pesquisadora baiana Anna Luísa Beserra, de apenas 22 anos. O Aqualuz, criado por ela e que até o final do ano deve ser instalado em quase mil cisternas no semiárido do Nordeste, já está sendo procurado por pessoas de outros países. “E nossa ideia é, aos poucos, internacionalizar nosso equipamento, aperfeiçoá-lo e criar outros que tragam soluções também para problemas como o saneamento e a dessalinização da água”, disse.

O I Fórum de Inovação e Sustentabilidade para a Competitividade - edição Vitória da Conquista é uma realização do Ibama e WWI, com apoio editorial do Jornal CORREIO e apoio institucional da FAEB/SENAR. A próxima edição do evento ocorre em 22 de novembro, em Barreiras, no oeste da Bahia, e terá como foco principal das discussões o uso sustentável da água pelo agronegócio.