Quanto vale 100 conto? Fomos ao mercado ver o que consumidor sente no bolso. Tá tudo caro

Fit, vegano, viciado em limpeza ou sedento por uma cervejinha? Fizemos um kit para todo perfil, mas não está fácil para ninguém

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  • Da Redação

Publicado em 13 de março de 2021 às 16:00

- Atualizado há um ano

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Sabadão de folga e sem sair de casa por conta do coronavírus: dia perfeito para maratonar em uma série na TV. Hora de ir ao mercado como se não houvesse amanhã e comprar todas as “porcarias”  que seus 100 conto permitem. Quase nada, amigo. Nesta pandemia, levar apenas a nota do peixe-boi para o mercado é risco iminente de passar vergonha no caixa e ter que deixar algo para trás. 

A imagem de um carrinho de mercado com um peito de frango congelado, alguns sabonetes, dois pacotes de ketchup e pouco mais do que isso ao preço de R$ 100 viralizou nas redes sociais há pouco tempo.  E no embalo o CORREIO resolveu fazer uma feirinha para cada perfil de brasileiro confinado em casa, com esse valor. Pode ser fit, vegano, fã de séries, ter mania de limpeza ou gostar de tomar uma cervejinha no fim de semana; não está fácil para ninguém. 

A primeira dica para quem pretende levar o dinheiro contado ao mercado é ter uma calculadora sempre por perto. O carrinho não vai encher, isso é fato. Entretanto, pelo menos evitará imprevistos na hora de pagar as compras. 

“Com cem reais? Não dá nem para assistir uma temporada toda no Netflix. Aqui em casa cortamos a batata Ruffles e comemos Micos ou Mikão, de R$ 1,50. A gente come mais salgadinho, chocolate e pipoca de microondas, os mais baratos. Não era assim antes da pandemia. O coronavírus alterou as prioridades, já que afetou demais essa área de alimentos, pelo menos aqui em casa. Sem falar que está tudo mais caro, né?”, conta Alessandra Batinga, que aproveita os tempos em casa para ver filmes e séries com o marido Lucas Vasconcelos.

Após uma ida a um mercado na Avenida Centenário, levar oito guloseimas para casa, com direito a salgadinhos, batatas fritas, refrigerante e sorvete, custou R$ 99,63. Sobraram ainda R$ 0,37 de troco. 

Se as coisas já estavam caras, a pandemia acentuou a situação. Segundo o professor de economia Antônio Carvalho, a inflação geral chegou a 5,2% em 12 meses de pandemia. Se contar apenas alimentos, o índice sobe para 15%. Em Salvador, a taxa anual dos alimentos foi um pouco menor que o índice nacional: 14,04%, segundo o IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo), divulgado pelo IBGE.

Na prática, é como se os R$ 100 de março de 2020 virassem R$ 94,80 hoje. “Essa perda média pode ser bem maior, dependendo da cesta de produtos adquirida, pois é comum os mercados inflacionarem os itens que identificam maior procura. É a denominada inflação de demanda”, explica Antônio. “A forma de não passar vergonha no mercado quando está com um recurso limitado, como uma nota de 100, é pesquisar o melhor preço, somar e ponderar o que cabe no seu orçamento. Procurar marcas mais baratas é uma solução”, completou.

Ou seja, a procura pode aumentar o preço. Se um produto ganha destaque, o empresário experimenta um preço maior. Se a procura continua acontecendo, o preço não diminui. Para quem gosta de tomar uma gelada no final de semana, a inflação de demanda coça forte no bolso e as marcas mais baratas de cerveja ganham espaço.

“Antes 100 conto eram 10 Heinekens no bar. Hoje nem quente no mercado você acha mais. Troquei a marca da cerveja e apelei apenas para uma carninha do sol com farofinha nos finais de semana. Calabresa e carne de sertão, que eram tachadas como comida de retirante, hoje são artigo de luxo. Não dá nem para fazer um feijão para três pessoas com R$ 100. Troquei a cerveja verdinha pelo latão mais barato”, desabafa Afonso Batista. 

O combo carne e cerveja pesa. Um quilo de carne do sol pode custar até R$ 40. Colocando uma cerveja puro malte e outros petiscos, a conta pode bater R$ 99,75. Isto sem manteiga e tempero verde para fritar o tira-gosto. Segundo a pesquisa do IBGE, o preço da carne subiu 29,51% durante este primeiro ano de pandemia. Mas ele não é o vilão. 

Salada salgada Se para o carnívoro não está fácil, por incrível que pareça veganos e vegetarianos sofrem até mais. O IPCA revelou que produtos naturais se tornaram os vilões na alta dos preços dos últimos 12 meses. A taxa acumulada no aumento dos cereais, leguminosas e oleaginosas chegou a 57,83%. Frutas, 27,09%. Hortaliças e verduras chegaram a 23,3%. A dificuldade do vegano é dobrada. Além dos preços, não é em todo lugar que é possível comprar produtos voltados para o consumo desta parcela da população. Nos mercados comuns, pouca coisa além de verduras, frutas e grãos. 

“Se for para comer apenas verduras, até dá para gastar R$ 100  no mercado. É aquela história: se vive e sobrevive com as coisas mais baratas. Sem os ‘luxos’ que às vezes a gente se dá, gasto, por baixo, uns R$ 200 todo mês, para uma pessoa”, disse a jornalista Susana Rebouças, que é vegetariana e mora sozinha. “Um tofu custa um rim. É R$ 40 um pedacinho. Uma caixa de almôndega vegana custa R$ 25. Ainda sou intolerante a lactose. Sabe quanto custa uma caixa de leite vegetal? R$ 20!”, completa Susana. Somando só os três produtos citados pela jornalista, a ‘feirinha’ vai custar R$ 85.

Professora de muay thay e fisioterapeuta, Mirelle Magalhães tenta manter sua alimentação fitness, rica em proteína e produtos naturais. Só de ovo, Mirelle gasta mais de 50% de uma nota de 100. “Para toda galera fit, ovo jamais pode faltar. Quase tudo tem ovo. Uma cartela com 30 unidades custa, em média, R$ 14. Eu como 3 ovos por refeição, café e janta. Uma cartela dura 5 dias. Para o mês, precisaria de 4 cartelas, o que totaliza R$ 56. Restam R$ 44. Se contarmos outros produtos, são R$ 100 por dia para quem quer ser fitness”. 

O básico  Adriana Maria aprendeu uma lição para a vida.  “Já fui ao mercado fazer umas compras simples. Levei uma nota de 100, mas deu uns R$ 10 a mais. Precisei tirar produtos e deixar no carrinho. Depois dessa vergonha, só venho com o cartão ou com dinheiro a mais do que pretendo comprar. Eu gasto  R$ 800 todo mês de mercado. Acho que não está fácil nem para os ricos”, diz Adriana. 

De fato, o soteropolitano está fazendo malabarismo para colocar o essencial na mesa. Sem direito ao “supérfluo”, a cesta básica em Salvador teve uma alta de 32,89% em 2020, segundo dados da Dieese. Foi o maior aumento entre as capitais brasileiras. Uma cesta básica para os soteropolitanos saiu, em média, R$ 429,14. Com 100 conto, a cesta é bem regrada. Levar apenas feijão, arroz e farinha pode custar R$ 17,77 na capital.

Mesmo antes da pandemia, a professora Úrsula Almeida tinha mania de limpeza. Com o perigo iminente do coronavírus, estes produtos são peças obrigatórias. Para ela, porém,  é impossível gastar R$ 100 e comprar itens de qualidade. “A pandemia fez os produtos de limpeza dispararem. Muita gente se aproveitou disso tudo e aumentou os preços. Álcool 70%, bactericida, água sanitária, tudo está caro. Estamos mais em casa e precisamos nos cuidar, higienizar tudo. Se você for com R$ 100, não compra quase nada ou só vai levar produtos sem qualidade”, avisa. 

Produtos de higiene pessoal vão na mesma linha. Nove itens, entre saúde dental e produtos para o banho, podem chegar a R$ 98,73, utilizando marcas intermediárias ou populares. Mesmo assim, estes itens tiveram um aumento baixo em 12 meses: 4,67%.

Pouca gente deve se lembrar, mas em 1995 a nota de R$ 100 era considerada nobre. Com menos de um ano de plano real, o salário mínimo era R$ 100. E valia muito. Hoje, se compararmos o poder de compra daquele ano com o atual, a nota com o peixe-boi valeria R$ 16,75. 

Há esperanças do carrinho voltar a ficar cheio para todas as tribos? Depende.  “É difícil fazer qualquer tipo de prognóstico agora. A pandemia ainda não aponta um horizonte claro sobre seu final ou evolução. Depende dela. Infelizmente, ainda teremos alguns meses de crise econômica gerada pela covid. Vamos manter a esperança, mas não podemos fazer previsões agora", analisa Antônio Carvalho.

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Quem é você no confinamento?

1) Confinado que toma uma:

Caixa de cerveja - R$ 34,20 1kg de carne do sol - R$ 40,39 Azeitona - R$ 11,99 Linguiça josefina - R$ 7,99 Farinha - R$ 4,99Total: R$ 99,56

2) Confinado maratonista de séries

2 litros de refrigerante - R$ 6,79 Pote de sorvete - R$ 27,50 Petiscos - R$ 39,46 2 pipocas doces - R$ 8,10 Chocolates - R$ 17,78Total: R$ 99,63

3) Confinado fitness

2 granolas - R$ 15,58 1kg de batata doce - R$ 4,69 1 placa com 30 ovos - R$ 13,50 Uva passa - R$ 11,99 Whey protein - R$ 53,90Total: R$ 99,66

4) Confinado vegano

Leite de amêndoas - R$ 18,99 Arroz e macarrão integral - R$ 19,17 Grãos - R$ 36,80 Banana e maçã - R$ 12,19 Batata doce e cenoura - R$ 12,57Total: R$ 99,72  

5) Confinado com cesta (bem) básica

Itens básicos - R$ 53,36 1 litro de óleo - R$ 8,49 Charque - R$ 20,37 Coxa e sobrecoxa - R$ 11,99 Margarina - R$ 5,29Total: R$ 99,50

6) Confinado da faxina

Limpeza pesada - R$ 46,99 Sabão em pó e barra - R$ 19,08 Bactericida - R$ 8,99 Álcool 70% - R$ 14,99 Outros - R$ 9,88Total: R$ 99,93

7) Confinado cheiroso

Papel higiênico - R$ 15,99 Produtos capilares - R$ 21 6 sabonetes (pacote) - R$ 15,99 Saúde dental - R$ 39,56 Desodorante - R$ 6,19Total: R$ 98,73