Um Nobel caótico

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  • Marcio L. F. Nascimento

Publicado em 6 de outubro de 2021 às 16:24

- Atualizado há um ano

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Os laureados com Prêmio Nobel de Física de 2021 tem em comum um assunto cada vez mais presente no dia a dia das pessoas: a complexidade do caos. Klaus Ferdinand Hasselmann (n. 1931, alemão), Syukuro Manabe (n. 1931, japonês) e Giorgio Parisi (n. 1948, italiano) analisaram curiosos aspectos da física de sistemas complexos envolvendo o clima (os dois primeiros), quanto desde a escala atômica até a planetária (o último).

O Júri da Real Academia de Ciências da Suécia reconheceu que Hasselmann e Manabe “estabeleceram a base de nosso conhecimento sobre o clima da Terra e como a humanidade o influencia.” Já Parisi tornou “possível entender e descrever muitos materiais e fenômenos diferentes e aparentemente inteiramente aleatórios.”

Em termos bastante amplos, tais contribuições estabeleceram “o desenvolvimento de modelos matemáticos para entender a mudança climática e a responsabilidade humana nesse processo global.”

Manabe é pioneiro na proposta de modelos climáticos que permitem entender a complexidade do clima e eventualmente projetar como será o futuro. Por exemplo, ele demonstrou como o aumento dos níveis de dióxido de carbono (ou seja, a molécula de CO2) na atmosfera promove a elevação das temperaturas no planeta, uma discussão cara aos negacionistas da ciência, boa parte deles terraplanistas.

Já Hasselmann propôs um modelo que une as condições do tempo ao clima – demonstrando que os modelos climáticos podem ser considerados confiáveis apesar de as condições do tempo serem mutáveis e caóticas. Seu método identificou “impressões digitais” que podem determinar a participação eventual da atividade humana no clima. Assim como Manabe, Hasselmann demonstrou que a Terra está esquentando devido ao aumento da quantidade de gases pela humanidade, promovendo o efeito estufa e as extraordinárias mudanças climáticas em curso vivenciadas pelos habitantes do planeta. Já Parisi vem sendo reconhecido como um pensador original, tendo seu trabalho impactado em diversos ramos das ciências nas últimas décadas.

Infelizmente, tais estudos não estão próximos das pessoas comuns, pois não atingem os bancos escolares. Eventualmente, são acessíveis apenas em algumas universidades e centros de pesquisa, entre elas, instituições brasileiras.

Afortunadamente, existem alguns exemplos simples de sistemas caóticos. Um deles foi proposto pelo matemático alemão Lothar Collatz (1910 – 1990). Para entender, pense em um número inteiro qualquer positivo, e aplique apenas duas regras: i) se este for par, divida por dois; ii) e se for ímpar, multiplique-o por três e some a unidade. Ao continuar aplicando estas duas regras, surge uma sequência de números que sempre finaliza em 1.

Senão, observe. Digamos que o número seja 24. A sequencia obtida por meio destas duas regras será: 24, 12, 6, 3, 10, 5, 16, 8, 4, 2, 1.

O último número da sequência é denominado atrator, um componente da teoria matemática do caos. Testes e mais testes foram feitos, e até hoje a conhecida Conjectura de Collatz mostrou-se verdadeira. Algo surpreendente das ditas teorias caóticas é que elas têm regras, algo aparentemente paradoxal para a maioria das pessoas. Trabalhos como os dos merecidamente laureados com o Prêmio Nobel 2021 chegaram a conclusões extraordinárias de novas regras do caos.

Num mundo em constante movimento, é preciso entender, compreender e respeitar as regras da natureza. É muito significativo (e simbólico) que o Prêmio Nobel 2021 tenha sido direcionado a estes renomados pesquisadores – um claro sinal aos negadores da ciência. Ciência esta para o bem e a sobrevivência da humanidade.

Marcio Luis Ferreira Nascimento é professor da Escola Politécnica, Departamento de Engenharia Química da UFBA e membro do Instituto Politécnico da Bahia

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