Vida de 'cão': em um ano gasto com cachorro pode passar de R$ 2 mil

Dois em cada dez tutores gastam mais do que o orçamento permite com seus animais de estimação, aponta SPC

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  • Priscila Natividade

Publicado em 13 de agosto de 2018 às 06:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: Foto: Evandro Veiga/ CORREIO
. por CORREIO Gráficos

Ela tem uma poupança no seu nome, vai à creche, só come ração super premium, frequenta festinhas e tem um círculo social de amigos bem movimentado. Vida Maria Golden vive muito bem, melhor do que muita gente por aí. Ainda que o amor não tenha explicação, ele tem um custo. E, no caso de Vida, ultrapassa um salário mínimo. 

“Nunca me imaginei tendo um cachorro, mas Vida foi amor à primeira vista. Adotamos ela após ser abandonada cheia de problemas de saúde. Gastamos na época sete vezes mais do que hoje. Ela é minha filha e por isso tem que ter a mesma qualidade de vida que eu tenho”, afirma o empresário e tutor da cadela, Narcizo Neto.

O cão não é mais só o melhor amigo do homem, mas se tornou um membro da família, inclusive mais presente em alguns lares baianos  que crianças. Segundo os dados mais recentes da Pesquisa Nacional de Saúde (PNS), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), na Bahia, quase 1,7 milhão de domicílios tinham ao menos um cachorro, o que representa pouco mais de 1 em cada 3 residências no estado. 

Considerando o mínimo de apenas um cachorro por domicílio onde havia esse animal, o total de cachorros (1,691 milhão) era 60,7% maior que o total de crianças até quatro anos (1,052 milhão em 2013 e 1,002 milhão em 2017). Porém, o fato de ter mais cachorro do que criança em casa não implica redução de gastos. A importância do animal de estimação é tanta que também obriga os tutores a fazerem cortes e muitas vezes apertar as despesas para manter o padrão de vida do bichinho. 

A última pesquisa feita pelo SPC Brasil e o Portal Meu Bolso Feliz que analisou o perfil do consumidor pet e o reflexo disso nas finanças identificou que 30% deles já deixaram de comprar algo para si mesmo por conta do animal de estimação. Outros foram além: 14% ficaram com o nome sujo por conta de gastos com o pet e pelo menos 20% costumam gastar mais do que o orçamento permite. 

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“Apesar de parecer estranho para alguns, a humanização dos pets é uma realidade. Isso faz com que o comportamento dos donos mude com relação ao animal, fazendo com que surjam despesas extras que fogem do básico cuidado com a saúde e alimentação”, analisa o educador financeiro da SPC  Brasil, José Vignoli. 

O levantamento aponta também que o gasto médio mensal com animal chega a R$ 198,17, e a alimentação é a despesa que mais pesa, isto porque mais da metade só compra ração premium (52%). “O pet não pode ser um fator de desestabilização das contas pessoais por não haver limite de gastos para a manutenção do animal. Daí a importância também de saber escolher o pet certo diante da realidade financeira do tutor”, completa. 

Bom pra cachorro

A publicitária Tereza Assis é uma das pessoas que dobraram os gastos após adotar um cão e, inclusive, ficou no vermelho por conta disso. A compensação, no entanto, vem em forma de carinho.  “Gasto 40% do meu salário com Bob porque ele teve o azar de enfrentar duas doenças mortais no período de oito meses. Desembolsei cerca de R$ 1,7 mil com consulta, remédio e internação. Foi um baque.  Até hoje pago o dia que ficou internado”. 

Os custos maiores são com veterinário, remédios, creche, ração, banho e adestrador. “Vale cada centavo. E agradeço todos os dias por ter esse companheirão comigo. Cortei despesas como a com a faxina, lazer e passei a pesquisar mais no supermercado para conseguir me reequilibrar”, conta. 

Quem também teve que fazer escolhas foi a gerente de vendas Karine Trinchão, mãe dos buldogs ingleses Tequila e Dio. O gasto mensal com os dois cachorros - que tem até plano de saúde - chega a R$ 1 mil. “A raça é complicada e tem problema de respiração. Além disso, os meus cães têm problemas congênitos. Tantas idas ao veterinário me fizeram optar pelo plano para economizar”.

Por conta disso, Karine até tentou buscar uma alimentação natural para eles. Porém, o custo com ração dobrou e aí não deu. “Tive que voltar atrás e modificar a ração. Não pude ir para alimentação natural e então optei pelo meio termo com a e  escolha de uma ração sem transgênicos”. O próximo investimento é a castração do macho. “ Meus cachorros são a melhor terapia. É um amor que a gente recebe sem nada em troca”.

Fica a dica

Com todo esse sentimento envolvido, dá para garantir qualidade de vida para o bichinho sem ficar no vermelho. O conselho do educador financeiro e economista Edval Landulfo é colocar o cachorro na planilha. “É possível manter o orçamento no azul com organização e disciplina. Monte grupos de compras com amigos, pesquise descontos, busque organizações de proteção aos animais que ofereçam serviços gratuitos”, aconselha. 

O alerta maior é para os excessos. “É preciso resistir a estes apelos porque todo dia vai surgir um produto novo. Seja prudente e respeite o seu orçamento. O mais importante para o seu cachorro é o seu carinho”, afirma.   

PET FELIZ (E O SEU BOLSO TAMBÉM)

Planejamento Escolha o pet certo diante dos desejos e da realidade financeira de quem pretende ter um.

Pesquisa  Existem várias petshops na cidade e também no mercado online. Pesquise bastante por promoções e clubes de fidelidade antes de comprar. Outra estratégia é propor aos amigos  comprar em quantidade e barganhar  descontos.

Emergência  Para não ter surpresas que possam comprometer as contas tente fazer uma reserva financeira só para o pet. 

INDÚSTRIA PET FATURA MAIS DE R$ 2 BI AO ANO

O status de membro da família conquistado pelo animal de estimação fez o mercado pet faturar R$ 20,37 bilhões no último ano. Os dados mais recentes da Associação Brasileira da Indústria de Produtos para Animais de Estimação (Abinpet) mostram que se houve crise, esse mercado pouco viu. Descontada a inflação do período que fechou em 2,95%, o valor representa crescimento de 4,95% na comparação com 2016.  Na AuAu Creche Canina, em Amaralina, o faturamento do negócio vem crescendo 22% ao mês (Foto: Evandro Veiga/ CORREIO) E a explicação para o desempenho positivo está não só no fato do Brasil ser o terceiro maior mercado do mundo para animais de estimação, mas, principalmente, por uma mudança de comportamento na maneira de enxergar e cuidar do seu pet. “Mesmo em tempos de crise, os tutores diminuem o investimento, mas não deixam de investir no pet ”, destaca o presidente Abinpet, Edson Galvão de França. 

Ainda de acordo com a entidade, o Pet Food (alimentação) continua a representar a maior parte do faturamento, dominando 68,6% do mercado. No entanto, o segmento que mais cresce é o de Pet Serv (serviços) com 15,8% . “Temos um potencial significativo em marketplaces especializados em inovação e fornecimento de novos insumos para a cadeia de alimentação e na prestação de serviços como babás de pets, passeadores de cães, banho e tosa”, diz Edson.

O mercado baiano sente os efeitos deste crescimento que fez surgir serviços como os de creche para cães. A AuAu Creche Canina, localizada em Amaralina, cresce por mês 22% em faturamento. “Ficamos muito surpresos com a aderência do público ao serviço que oferecemos. Estamos conseguindo cada vez mais transmitir a nossa filosofia de trabalho para o mercado e alcançando uma aceitabilidade além do previsto”.

Na Brothers Pet Club, o ticket médio por compra na loja virtual chega a R$ 1 mil, como destaca o proprietário da empresa, Narcizo Neto. “O gasto depende de cada um. Muitas vezes não há um limite, ele é livre de acordo com o tutor e a necessidade do animal”.