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Tailane Muniz
Publicado em 8 de novembro de 2019 às 13:59
- Atualizado há 2 anos
Antes de ser morto com uma facada no pescoço, Rodrigo Abreu Santos, 23 anos, pagou um litrão de cerveja para o assassino. O bandido, que ainda não foi identificado pela polícia, também pediu R$ 10 ao jovem, que bebia no Bar da Negona, em Fazenda Coutos, no Subúrbio Ferroviário de Salvador. >
Rodrigo havia acabado de retornar de Madre de Deus, na Região Metropolitana, acompanhado do amigo, Herick Deivid Santos, 22, na noite da última quinta-feira (31). Decidiram “tomar uma cerveja”. Chegaram no bar por volta das 23h, quando só havia a proprietária e a companheira. >
À reportagem, Herick conta que viu quando o bandido surgiu, já na madrugada, e cerca de duas três horas depois, matou o amigo. Em seguida, quando as vítimas buscavam ajuda com policiais que passavam em uma viatura, disse ao policial: “Que nada, isso é briga de viado”, revela a testemunha, ao defender que o crime foi motivado por homofobia. Rodrigo tinha 23 anos e trabalhava com serviços de estética (Foto: Acervo Pessoal) “Ele e outro deram boa noite quando chegaram e, pouco depois, pediram uma cerveja. Nós pagamos por educação. Em seguida, mais R$ 10 e falamos que a gente não ia dar, porque já havíamos dado a cerveja”. A partir daí, lembra, o criminoso, que aparenta 28 anos, iniciou uma sessão de agressões verbais.>
À reportagem, a Polícia Civil voltou a afirmar que o crime é investigado pela 3ª Delegacia de Homicídios Bahia de Todos os Santos (DH/BTS). “A autoria e motivação a serem esclarecidas”, resumiu a pasta.>
‘Briga de viado’ Antes da morte, e após a série de xingamentos, os jovens chegaram a se explicar ao agressor: “A gente não tem obrigação de pagar mais nada, temos a nossa conta, também, não vamos dar. E ele: O que é que você quer, viadinho? Hein, viadinho?”, falou para ele [Rodrigo]”. >
Herick destaca que embora não tenha tantas informações sobre o homem, “todo mundo disse que não foi a primeira vez que ele tratou um gay assim, tanto que judiou, falou ao policial que a briga tinha acontecido entre nós, e fugiu”. >
Ele conta que tudo aconteceu muito rápido. No momento em que foi até o caixa pegar o cartão de crédito, ouviu gritos: “Era a mulher do bar. Ele já estava ferido”, lamenta, ao resumir o momento em que viu o amigo implorar por socorro. “Ele disse: ‘Me ajuda, por favor’”. Herick estava com Rodrigo no momento do crime (Foto: Tailane Muniz/CORREIO) E resolveu quebrar uma garrafa para atingir o agressor, que correu com a faca na mão. Quando viu que não alcançaria o homem, apoiou Rodrigo no ombro e foi até a pista principal do bairro, onde abordou uma viatura da Polícia Militar. >
Comoção A vítima foi levada para o Hospital do Subúrbio, mas teve morte cerebral. Rodrigo foi enterrado na manhã desta sexta-feira (8), sob clima de pesar e comoção. Filho mais velho de dona Geovania Maria, Rodrigo estava feliz, segundo Herick Deivid. >
Atualmente, dividia o tempo entre fazer unha e ir ao terreiro de candomblé onde era “feito”. “Nós éramos irmãos de axé, mas nos aproximamos na vida adulta. É muito triste ter visto e vivido aquilo”. >
Inconsolável, a mãe do jovem preferiu não falar com a reportagem. Consolada pelos familiares, Geovania, que também tem uma filha de 21 e um garoto de quatro, permaneceu debruçada no caixão do mais velho durante todo o sepultamento, realizado nesta manhã, no Cemitério Municipal de Plataforma.>
Por todos os lados, cartazes estampavam o sentimento de dor e indignação daqueles que perderam o jovem para por razões que sequer conseguem compreender. “Por que? Eu só queria saber o porquê? A gente que façam alguma coisa, porque nada, neste mundo, vai trazer meu menino de volta, mas esse homem precisa pagar”, desesperou-se. >
Ao final do cortejo, familiares e amigos chegaram a realizar um ato na via principal de Plataforma. Apenas os pedidos de justiça sobressaíram em meio às lágrimas. (Pedidos de justiça estampavam cartazes (Foto: Tailane Muniz/CORREIO) Secretaria de Justiça lamenta A Secretaria de Justiça, Direitos Humanos e Desenvolvimento Social da Bahia (SJDHDS) emitiu nota de pesar pela morte do jovem e da transexual Ana Paula dos Santos, encontrada sem vida em Jequié, também na semana passada.>
"A SJDHDS lamenta profundamente a perda de duas vidas por crimes de ódio. Na última segunda-feira (04), a jovem Paula dos Santos, mulher transexual, foi encontrada morta no município de Jequié. Nesta quinta-feira (07), o jovem Rodrigo Santos, vítima de um ataque brutal no bairro de Fazenda Coutos, também faleceu. A SJDHDS, por meio da sua Superintendência de Direitos Humanos, está acompanhando os casos junto ao Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP), da Secretaria de Segurança Pública (SPP-BA). Mais uma vez, reafirmamos o compromisso do Governo do Estado com a promoção da igualdade, do respeito e da cultura de tolerância. Estes fatos devem ser investigados e punidos de maneira exemplar. Preocupa o aumento expressivo da violência contra a população LGBT motivadas pelo discurso de ódio, que teve um crescimento exponencial no último ano. Novamente, lembramos que desde junho de 2019, por decisão do Supremo Tribunal Federal, a homofobia é considerada crime. Os ministros do Supremo determinaram que a conduta passe a ser punida pela Lei de Racismo (7716/89), que hoje prevê crimes de discriminação ou preconceito">