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Publicado em 15 de junho de 2014 às 21:43
- Atualizado há 2 anos
Sair de casa ainda de madrugada para garantir uma consulta e a realização de um exame, ou ainda buscar uma clínica da rede credenciada do plano de saúde que só tem vaga para um mês depois do dia que você tenta incessantemente marcar. Se por um lado, o Sistema Único de Saúde (SUS) não atende a contento, por outro, as queixas relativas ao atendimento e à oferta de serviços pelos planos de saúde são cada dia maiores, assim como as taxas de reajustes aplicados pelas seguradoras.A aposentada Maria José Serpa Santos não abriu mão do seu médico de confiança e preferiu pagar a consulta em uma clínica popular (Foto: Evandro Veiga)Maria José Serpa Santos, de 59 anos, tem um plano de saúde que não cobre a consulta com o médico dela. Na última semana, ela escolheu uma clínica no bairro da Liberdade, a Sim, para realizar os exames e o atendimento que precisava. Se fosse pagar por uma consulta ao cardiologista sem o plano de saúde, a funcionária pública aposentada desembolsaria, no mínimo, R$ 200. Em uma clínica popular, o valor caiu para R$ 80.“O preço é muito acessível, eu economizo 100% ou até mais” (sic), contou. Além das consultas com o neurologista e o cardiologista, fez também exames, incluindo uma ressonância magnética que custou R$ 600. Em outras clínicas, a soma de todos os serviços poderia ultrapassar R$ 1,2 mil.Nos bairros mais populares da capital, há dezenas de outras clínicas desse tipo. O conceito delas é quase sempre o mesmo: oferecer serviço médico de qualidade, a preços populares, atendendo principalmente uma clientela que não possui plano de saúde ou que não aguenta mais as filas e a longa espera pelo SUS.Demanda“Há uns dez anos, eu fui a uma palestra em que falavam que os planos de saúde iriam falir, acabar. Só que ninguém dava uma solução. Foi quando eu tive uma sacada e pensei: ‘é isso, clínicas populares’”, contou a proprietária da Clínica Nordeste de Amaralina, Ana Andrade. Para abrir a clínica no bairro, ela fez um investimento inicial de R$ 200 mil. A unidade funciona há sete anos e só agora começa a dar resultados. “É viável do ponto de vista econômico, mas tem que esperar. No começo, você precisa bancar os médicos, até que os pacientes apareçam”, assegura.Para o presidente do Sindicato dos Médicos (Sindmed-BA), Francisco Magalhães, a tendência sempre existiu, mas a demanda aumentou com a precarização do SUS e a insatisfação da população com os planos, cada vez mais caros e limitados quanto à oferta de serviços. “A tendência é satisfatória para o profissional, já que no plano ele leva até 60 dias para receber o valor da consulta, enquanto com o atendimento particular em uma clínica popular, o dinheiro vai diretamente para o bolso”. Francisco acrescenta que a intermediação do plano precariza a relação com o paciente. “Os planos de saúde não têm apresentado satisfação nem para os médicos nem para os usuários”, observa. Outras clínicas não revelam o valor aplicado, mas concordam que o retorno não é imediato. A DN Master Clínica funciona em Cajazeiras há dois anos e meio. A administradora da clínica, Luciana Almeida, diz que a previsão é de mais quatro anos de investimentos até que comece a dar lucro.Lá, além de especialidades médicas e odontológicas, há também um pequeno centro cirúrgico e um parque tecnológico. A clínica trabalha com um cartão fidelidade. Com ele, o paciente recebe descontos nas consultas, que, hoje, custam R$ 60. Somente no mês passado, a clínica atendeu a 4,7 mil pacientes. “É viável economicamente e é um setor que tem crescido bastante em Salvador”, disse Luciana.OfertaJá em funcionamento, as clínicas devem pouco a muitas das de alto padrão da capital. No bairro da Liberdade, a Sim, a clínica onde Dona Maria José fez seus exames, foi inaugurada há menos de 15 dias e cobra R$ 80 por consulta com qualquer especialista – preço praticado pelos demais consultórios populares da capital.Clínica opera com capacidade para atender 10 mil pacientes por mês(Foto: Evandro Veiga)Na Sim, além de exames de laboratório, o paciente também pode fazer pequenas cirurgias, tomografias e ressonâncias magnéticas a preços bem abaixo do mercado. Uma tomografia, por exemplo, custa R$ 375. A capacidade de atendimento é de dez mil pacientes por mês. “A gente pretende oferecer uma medicina de qualidade em uma clínica localizada numa região em que a população é carente. Esse serviço de qualidade precisa ter um preço acessível”, é o que afirma o diretor médico da clínica, Allan Brito.A poucos metros dali, a Clínica, Laboratório e Farmácia Ventura, há 15 anos no mercado, tem estrutura de grande porte. Segundo o gerente, Flávio Brito, cerca de 60% dos atendimentos são particulares enquanto que 40% são feitos via plano de saúde.Para os pacientes particulares, as clínicas oferecem economia de tempo e de dinheiro. E também a possibilidade de dividir esses serviços no cartão de crédito em até 10 prestações. A dona de casa Viviana da Silva, 28 anos, já frequenta a Clínica Ventura, há muitos anos. “Aqui eu chego, faço na hora e pego o resultado também”, diz. Lá, o exame mais caro, uma ultrassonografia morfológica do 2º trimestre, custa R$ 160. Com essa prática, a clínica atende de cem a 150 pessoas por dia, vindas não só da Liberdade, mas de outros bairros e de cidades do interior. “Para fazer a diferença, a gente combate um pouco o mercado de hospitais, que é grande e tem preços exorbitantes”, diz Flávio Brito.Empreendedorismo De acordo com o presidente do Conselho Regional de Medicina da Bahia (Cremeb), José Abelardo Garcia de Meneses, o segmento tem crescido. “A população está cada vez mais desassistida pelo SUS e pelos planos. Então, a alternativa é ir para essas clínicas que cobram mais barato”, analisa.O mercado de clínicas médicas populares está tão aquecido que atraiu a atenção dos empresários que investiram no Centro Odontológico Sorrir, inaugurado essa semana na Fundação Politécnica. “Escolhemos o centro porque tudo que está aqui é mais popular e o local é bem específico para atingir esta fatia de mercado”, explica a gerente Marcela Portela. Só no primeiro dia, a clínica chegou a registrar 70 atendimentos. A expectativa de início é atender a 300 pessoas diariamente. “Ganhamos na quantidade. Quanto mais a gente consegue trazer, mais barato conseguimos fazer”. Na Vamos Sorrir, a consulta inicial é gratuita, justamente para atrair mais pacientes. Os serviços variam de R$ 25 - a exemplo de uma restauração -, até R$ 1 mil, como no caso de implantes dentários. “Cobramos até 70% mais barato do que as clínicas odontológicas convencionais”, garante Marcela. O centro odontológico aceita cartão de crédito e divide o preço dos serviços em até 10vezes. Possui também um crediário feito sem consulta ao SPC/Serasa. “Com a nossa carteirinha de sócio, em que a adesão é gratuita, o paciente vai pagando as parcelas conforme o tratamento, por cada procedimento que é feito”. O historiador Paulo Roberto Silva Lima pegou o panfleto enquanto passava pela Avenida Sete e foi conferir a oferta. “Faço pesquisa em várias clinicas, mas o valor daqui está bom, dentro das minhas possibilidades”. Desconfiado, ele faz questão de visitar o local antes de fechar qualquer procedimento. “Para charlatão eu não vou não, por isso escolho com cuidado. Sempre levo em conta a qualidade do atendimento, o preço e forma de pagamento”./tr> Sindicalista lista cuidados para que consumidor não seja prejudicadoA estudante de fisioterapia Luana Souza pesquisou bastante antes de escolher uma clínica popular onde pudesse fazer seu exame preventivo. “Teve algumas que eu não gostei muito do atendimento, que eram até mesmo mais baratas”, justificou. Acabou optando por uma onde pagou R$ 170 pela consulta com o ginecologista e realização dos exames. “Faço uma pesquisa na internet e quando eu vou, pergunto às pessoas que vão fazer o exame se eles gostaram da clínica. Também busco recomendações de amigos e familiares que já foram atendidos lá”, afirma. De acordo com o presidente do Sindicato dos médicos (Sindmed), Francisco Magalhães, Luana está correta em atentar a esses detalhes ao optar por um serviço médico de qualquer especialidade. “Existem pessoas que se utilizam de má fé com o argumento de um serviço a preços populares para praticar a medicina de forma indevida”, justifica o médico, que recomenda: “o paciente que sentir algum comportamento estranho, ou algum procedimento que não é o habitual, ou a insegurança do profissional, deve ter cuidado e denunciar imediatamente ao conselho dos médicos (Cremeb)”. O presidente do Cremeb, José Garcia de Meneses, acrescenta: “certifique-se se a clínica tem registro no Conselho. No próprio site do Cremeb é possível verificar esta informação. Esta consulta também pode ser feita por telefone”. E se, mesmo assim, ainda tiver dúvida, peça a identificação do médico. “Com a tecnologia é muito fácil fraudar esses documentos”. Clínicas particulares apostam em ampliaçãoPara competir diante deste cenário, clínicas particulares tem apostado em infraestrutura, ampliação e oferta de um "mix de serviços", como acontece com a Clínica Santa Helena. “Independente de classe social do público, atendemos a todos com a mesma infraestrutura e qualidade de serviços médicos”, justifica a Gestora de Comunicação Institucional da clínica, Waleska Rochat.O grupo SH Brasil possui 11 sedes entre clínicas, laboratório e hospital completo. No último ano foi investido R$ 10 milhões na instalação de duas novas unidades em Salvador. “Nós verticalizamos os serviços com a oferta de laboratório clínica e hospital, ou seja, o médico faz a consulta, solicita os exames e também opera no próprio hospital”. A Clínica localizada na Avenida Tancredo Neves realiza em média 14,500 atendimentos por mês, que corresponde a 80% da sua capacidade total.>