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Publicado em 9 de outubro de 2023 às 09:20
Apesar de ser uma doença desconhecida pela maioria das pessoas, o lipedema é uma enfermidade que acomete entre 9% e 10% das mulheres adultas do país, o que soma cerca de 5 milhões de brasileiras. Conhecido também como síndrome da gordura dolorosa, o lipedema é uma doença crônica caracterizada por depósitos de gordura desproporcionais pelo corpo. >
O lipedema acomete os membros, em especial as pernas, e é bilateral, ou seja, atinge os dois lados ao mesmo tempo, causando inchaço e furinhos. Por isso, o problema muitas vezes é confundido com obesidade e celulite. Além de ser bastante incômodo na questão estética, ele ainda provoca muito desconforto. >
Apesar de não ser uma doença nova - ela foi descrita pela primeira vez na renomada Clínica Mayo, localizada nos Estados Unidos, em 1940 - ainda há muita desinformação sobre ela. “Até mesmo muitos profissionais de saúde não têm informações sobre o lipedema”, lamenta o cirurgião plástico Fabio Kamamoto, pioneiro no seu tratamento e diretor do Instituto Lipedema Brasil, criado com o intuito de difundir a doença.>
A gordura do paciente com lipedema é diferente daquela que temos no nosso organismo. “Ela causa dor, peso, muita sensibilidade ao toque e o surgimento de hematomas espontâneos e, em casos mais avançados, o mal pode evoluir para limitação da mobilidade física e danos no sistema linfático”, explica o cirurgião vascular Sergio Belczak, do Hospital Israelita Albert Einstein.>
Quais as causas do lipedema?>
Os especialistas ainda não sabem explicar exatamente o que causa o problema, mas já se sabe que há influência genética em 2/3 dos casos e que os hormônios femininos, como o estrogênio e a progesterona, são gatilhos para o seu desenvolvimento. Por essa razão, 90% dos casos acontecem em mulheres e surgem normalmente quando elas passam por alterações hormonais, como o uso de anticoncepcionais, gestação, tratamento de infertilidade e menopausa. >
Além do prejuízo físico, o lipedema pode desencadear problemas emocionais e psiquiátricos. Isso porque a paciente normalmente não consegue ter resultados com atividade física e/ou dietas, o que costuma deixar muitas pessoas frustradas ao não ver mudanças mesmo com bons hábitos de saúde. “Mesmo as pacientes magras ou as que perderam muito peso mantêm o quadro de dor e deformação progressiva dos membros até o ponto de perder a capacidade de locomoção”, diz Kamamoto. >
“De 5 %a 20% das mulheres atendidas na nossa clínica já fizeram cirurgia bariátrica e apresentaram reduções de peso de até 40 quilos, mas mantiveram a gordura nas pernas e o quadro de dor e inflamação”, acrescenta. Além disso, explica o cirurgião plástico, a maioria sofre com distúrbios de imagem e insatisfação corporal. Todos esses fatores associados podem desencadear a anorexia, bulimia, depressão e crises de ansiedade.>
Dificuldade no diagnóstico>
Infelizmente, ainda não há um protocolo padrão para o diagnóstico da doença e nem exames específicos para a sua detecção. Por isso, é muito importante que seja feita uma avaliação por um médico especialista no assunto que vai analisar o histórico familiar da paciente, como o mal se desenvolveu e fazer um exame físico para averiguar se existem nódulos, hipersensibilidade e perda de elasticidade do tecido adiposo, fatores que indicam que o quadro não está ligado à obesidade. >
Os especialistas dizem que a falta de protocolo e o desconhecimento do assunto por parte de muitos médicos atrapalham o fechamento do diagnóstico e o início do tratamento, o que é arriscado, pois o quadro não para de evoluir.>
Assim que a paciente consegue o diagnóstico, ela é acompanhada por uma equipe multidisciplinar com endocrinologista, ginecologista, nutricionista, cirurgião vascular, cirurgião plástico, psicólogo e psiquiatra, entre outros. O indicado é que a paciente evite ganhar peso e faça exercícios de baixo impacto, de preferência com o auxílio de um profissional de educação física. As atividades realizadas na água são muito bem-vindas, pois, além de não causarem impacto, dão uma força para a circulação. >
O trabalho de um fisioterapeuta também ajuda bastante. Ele pode utilizar técnicas como drenagem linfática, enfaixamento compressivo e uso de meias de compressão e botas pneumáticas para melhorar a circulação linfática e o retorno do sangue ao coração. As terapias de ondas de choque também podem auxiliar, pois favorecem a circulação e ainda quebram as fibroses formadas pela gordura. >
Alimentação anti-inflamatória>
A alimentação é um capítulo à parte para quem sofre com lipedema. Não basta reduzir as calorias, é preciso investir em uma dieta que ajude a contornar todos os aspectos do problema. “É indicado que ela seja anti-inflamatória, com baixo índice glicêmico pois, muitas vezes, pode haver resistência à insulina. A alimentação deve ajudar a melhorar a retenção hídrica e recuperar o tecido conjuntivo”, explica a nutricionista Adriana Kachani, que é colaboradora do Programa da Mulher Dependente Química do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas de São Paulo, especialista em imagem corporal e transtornos alimentares. >
A nutricionista costuma adotar a dieta mediterrânea que é baseada no consumo de alimentos frescos e naturais, como azeite, frutas, legumes e cereais, já que ela conta com gorduras saudáveis, carnes magras e itens antioxidantes e anti-inflamatórios. Alguns chás que aumentam a circulação e são anti-inflamatórios, o de cavalinha, hibisco e gengibre, entre outros, também ajudam bastante, assim como a ingestão de colágeno, vitaminas, como a C e a A, e prebióticos e probióticos para melhorar a flora intestinal. “Restringir bebida alcoólica e produtos industrializados também é muito importante nesse caso”, destaca. >
Quando a enfermidade chega a um estágio mais avançado, o tratamento também pode incluir cirurgias. “Algumas medidas ajudam a melhorar os sintomas, mas, segundo o Consenso Americano de Tratamento de Lipedema publicado em 2021, a única técnica capaz de remover as células doentes é a operação", afirma o cirurgião plástico Kamamoto. “A cirurgia reduz o volume dos membros em até 40%. Algumas pesquisas demonstram muitos ganhos de qualidade de vida com menos desconforto. O acompanhamento de pacientes até oito anos após o procedimento mostra que esses benefícios se mantêm”, acrescenta. >
“O procedimento é um tipo de lipoaspiração específico feito por especialistas no tratamento da enfermidade. Ele é feito com cânulas que aspiram a gordura associadas a fontes de calor, como o laser, que estimulam a aderência da pele ao corpo, pois com a retirada do tecido adiposo pode sobrar bastante excesso de tecido”, explica Belczak, cirurgião vascular do Einstein. >
Se para quem tem recursos para pagar um plano de saúde ou um atendimento particular não é fácil chegar ao diagnóstico e ao tratamento da doença, para quem depende da saúde pública fica ainda mais difícil. Por isso, o Instituto Lipedema Brasil e outras instituições têm desenvolvido pesquisas sobre o tema e levado mais conhecimento a todos. “Assim como eles, existem muitas pessoas trabalhando no assunto e desenvolvendo estudos sobre ele, o que aumenta os argumentos e subsídios para exigir um tratamento adequado no Sistema Único de Saúde (SUS)”, diz Belczak.>