Policial foi baleado pelas costas e morreu na frente da filha de 2 anos

'Não vai ficar de graça', diz colega. Vítima fundou bloco carnavalesco Proibido Proibir

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  • Bruno Wendel

Publicado em 29 de janeiro de 2018 às 17:35

- Atualizado há um ano

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. por Foto: Almiro Lopes/CORREIO

Luís Cláudio foi surpreendido por pelo menos cinco homens, indica investigação (Foto: Reprodução/Bruno Wendel/CORREIO) Um grupo de bandidos armados, que na gíria policial é conhecido como bonde, é apontado como responsável pela morte do policial civil Luís Cláudio Batista Lopes, 58 anos, chefe do Serviço de Investigação (SI) da Delegacia do Adolescente Infrator (DAI) de Salvador, baleado neste domingo (28) no Engenho Velho da Federação. O policial, que também foi fundador e seguia como diretor do bloco carnavalesco Proibido Proibir, estava em frente ao Beco da Rabada, próximo de casa, quando foi baleado pelas costas, de acordo com policiais que acompanham o caso.“As informações que temos é que um cinco ou seis homens armados chegaram ao local, mas somente um atirou por trás”, declarou o presidente do Sindicato dos Policiais Civis do Estado (Sindpoc) Marcos Maurício, na manhã desta segunda-feira (29), que também informou que a cena foi presenciada pela filha de 2 anos da vítima.Ele acredita que a morte de Luís Cláudio está relacionada ao fato de ele pertencer à polícia. “A prerrogativa de ser policial pode ter sido o que o levou à morte. Não pegaram nada dele. Deixaram para trás dinheiro e a arma. Foi uma execução. Ele morava num local onde é 'Faixa de Gaza' entre duas facções”, disse Maurício, na sede do Instituto Médico Legal (IML), onde acompanhava parentes da vítima que aguardavam a liberação do corpo da vítima.

Segundo Maurício, Luís Cláudio estava prestes a entrar no seu carro quando foi atingido. Ele estava acompanhado da filha mais nova, Eduarda, e da esposa, Daiane. Enquanto o policial e a criança iam entrar do mesmo lado do veículo, a mulher ia entrar do outro, no banco do carona. "No que o primeiro tiro acertou ele, a menina se assustou e saiu correndo pro colo da mãe", contou o sindicalista.O bandido acertou o policial por cima, detrás de um Palio prata que estava estacionado do outro lado da rua. "Ele não veio de peito aberto, sabia que Luís Cláudio era policial", supõe o presidente do Sindpoc. A esposa e a filha do policial não se feriram.

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Ainda conforme Maurício, os suspeitos fugiram a pé pelo Beco da Rabada. Os fundos do beco, onde Luís Cláudio morava, é a localidade da Baixa da Égua, região dominada pelo Comando da Paz (CP). A facção, que também detém o controle do tráfico no Forno, vem sofrendo ataques da arquirrival Bonde do Maluco (BDM), que tem atuação na Lajinha.

O delegado geral da Polícia Civil, Bernardino Brito Filho, presente no velório do investigador (leia mais abaixo), disse ao CORREIO que quatro suspeitos já foram identificados, pois têm "indícios fortes" de autoria. Ele disse que a polícia já trabalha com uma linha de investigação, mas que não iria divulgar para não atrapalhar as investigações."Vamos dar a resposta, mas dentro da lei. Além de policial, ele era um cidadão", afirmou Bernardino. No ano passado, o filho de Luís Cláudio foi baleado no Engenho Velho da Federação. Na ocasião, o chefe do SI da DAI conseguiu escapar. “Um dos filhos dele foi ficou ferido em um confronto entre traficantes rivais. Luís Cláudio estava junto ao filho quando aconteceu”, contou Marcos Maurício. No dia 5 de fevereiro de 2017, Luís Cláudio e o filho foram atingidos na perna por integrantes do BDM que atacavam rivais na Rua Apolinário Santana.

Ainda no IML, parentes de Luís Cláudio também disseram acreditar que a morte dele está ligada à profissão que exercia há três décadas.“Ele nasceu e se criou lá, no Engenho Velho da Federação. Todo mundo sabia que ele era policial. Tudo mundo respeitava ele. Meu tio ficava de boa. Lá, na área, ele era um morador comum. Vestia roupa de policial quando chegava no trabalho. Agora, se alguém mexesse com a família, era outra coisa”, contou um sobrinho do policial, que não quis revelar o nome.Luís Cláudio tinha mais de 30 anos na Polícia Civil e se orgulhava disso. “Meu pai sempre quis ser policial. Ele foi do Exército, quando começou sua paixão. Passou por várias unidades e amava o que fazia. Sentia orgulho”, contou um dos seis filhos do agente durante a liberação do corpo. 

Além da DAI, o policial trabalhou na Delegacia de Repressão a Furtos e Roubos (DRFR), 4ª Delegacia (São Caetano), 11ª Delegacia (Tancredo Neves), Depom (Departamento de Polícia Metropolitana), dentre outras unidades.

Revolta Pela manhã, o clima era de revolta na DAI. “A polícia está acuada. Luís Cláudio era um policial atuante. Estamos arrasados. Ele era o primeiro a chegar para trabalhar. Chegava às 7h todos os dias. Isso é uma desgraça!”, desabafou um dos agentes.“O que não vai ficar é de graça”, emendou outro policial.Policiais de outras unidades estão junto com agentes da DAI fazendo diligências no Engenho Velho da Federação, reforçando a suspeita de que os autores são pessoas que estão no bairro. “Forças da Polícia Civil estão concentradas nos principais pontos de tráfico da região, mas ainda estamos sem rumo. Não temos ainda autoria”, disse um dos agentes da 7ª Delegacia (Rio Vermelho), unidade responsável pelo Engenho Velho da Federação.

Comoção na despedida O enterro de Luís Cláudio, no final da tarde desta segunda, no Cemitério Campo Santo, na Federação, reuniu centenas de pessoas, entre parentes, amigos e colegas de trabalho da vítima. Em certos momentos, a sala do velório estava tão lotada que era difícil entrar. Uma multidão se encolhia no corredor onde ficam as salas do velório.

Colegas voltaram a falar que Luís Cláudio era um policial correto e que cumpria bem o seu trabalho. "Ele era um bom amigo, não se envolvia com coisa errada. A dor é irreparável", disse o também policial Roberto Conceição. Um primo da vítima conta que ele era visto sempre de bom humor. "Isso aí é uma surpresa para todo mundo. Ele era um cara alegre, tranquilo. Nunca vi ele exaltado. Ele não tinha medo de nada", comentou o primo Nildo Oliveira, 44.

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Luís Cláudio deixa dez irmãos, a esposa e cinco filhos. Sua mãe, Leda dos Santos, 79, também estava no enterro. Abalada, preferiu não conversar com a imprensa. Uma de suas irmãs, Avanyr Alves, 53, conta que a família morava na Ilha de Itaparica, mas ele foi criado com uma tia no Engenho Velho. "Ele era um grande irmão. Sempre tinha uma palavra amiga para todo mundo", lembra. 

Aos gritos de "Viva Lula" (apelido de Luís Cláudio) e palmas, o corpo foi enterrado no final da tarde em uma gaveta do Campo Santo. Vizinhos, amigos, policiais civis e militares, funcionários da Vara da Infância e Juventude, lotaram o corredor apertado do cemitério. Uma salva de tiros foi disparada em homenagem ao homem após a gaveta ser fechada. 

Carnaval comprometido O assassinato pode comprometer o desfile do Bloco Proibido Proibir, que está com desfile marcado para a quinta-feira de Carnaval, no Circuito Osmar (Campo Grande), com Ju Moraes e Denny Palma.

Além de fundador, Luís Cláudio seguia como diretor da agremiação, cargo que também é exercido por seu filho. Após o enterro, diretores do Proibido Proibir irão decidir se o bloco de samba irá desfilar na folia este ano. 

“Estamos com o projeto todo pronto para este Carnaval. Já foram vendidos mais 70% dos abadás, mas não podemos negar que essa tragédia atingiu a direção e os foliões do bloco. Entraremos numa reunião e decidiremos”, declarou Arisson Santana, um dos diretores do Proibido Proibir, que costuma sair com 2 mil associados.

Segundo amigos e parentes de Luís Cláudio, era comum que ele desse camisas a quem não podia pagar para sair no bloco. "Ele não perguntava nem quem era", falou o primo de Luís, acrescentando que ele costumava ajudar quem precisava.