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Prefeitura de Brumado diz que vai recorrer da suspensão das aulas pela Justiça


 

Retomada ocorreu nesta segunda (21) com baixa adesão dos alunos, mas desembargadora suspendeu

  • Daniel Aloísio

Publicado em 21/09/2020 às 22:07:00
Atualizado em 21/04/2023 às 15:13:05
. Crédito: Foto: leitor CORREIO

Durou menos de um dia a reabertura das escolas municipais de Brumado. Após uma manhã de baixa adesão dos alunos às salas de aulas, o Tribunal de Justiça do Estado da Bahia (TJ), por meio de decisão da desembargadora Carmem Lúcia Santos Pinheiro, deferiu na tarde dessa segunda-feira (21) o recurso do Ministério Público (MP-BA) que pedia o adiamento da retomada das aulas presenciais na cidade de pouco mais de 67 mil habitantes, localizada no centro-sul baiano.  

Segundo a desembargadora, o município não pode flexibilizar “as regras de distanciamento social e das restrições à abertura das escolas, até que seja divulgado o estudo técnico-científico que ampare sua decisão, a ser tomada com base nas diretrizes estaduais e nacionais e após a realização de plano de retomada das atividades escolares, conforme parecer do Conselho Nacional de Educação (CNE)”. 

A decisão veio quatro dias depois do juiz Antônio Carlos do Espírito Santo Filho, em primeira instância, negar o pedido do MP-BA, alegando não haver comprovação de nenhuma ilegalidade do ato de retomar as aulas. O recurso foi feito pelo promotor de Justiça Millen Castro, autor da ação civil pública contra o município.

Como foi o primeiro (e único) dia de retorno às aulas em Brumado? Confira o podcast especial:

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“Já estamos sabendo dessa decisão e estamos entrando com um agravo de instrumento. Vamos tentar derrubar isso aí. Queremos reverter a decisão. Amanhã claro que não pode ter aulas presenciais. Teremos que esperar esse tempo, acredito que cerca de cinco dias, até que volte tudo ao normal”, disse, esperançoso, o prefeito de Brumado, Eduardo Vasconcelos (PSB), que não pensa em desistir da retomada das aulas presenciais. “Nossas pesquisas mostram que 30% das nossas crianças não tem internet em casa. Elas não estão assistindo aulas. Muitos pais, sobretudo os mais carentes, precisam das aulas até mesmo para as refeições. Na escola os alunos comem quatro vezes por dia, pois o ensino é 100% integral em toda a cidade”, explicou Vasconcelos sobre a necessidade da volta às aulas. No entanto, foi baixa a quantidade de pais que permitiram que seus filhos fossem para as escolas municipais reabertas nessa segunda-feira. “A adesão realmente foi baixa. Houve um trabalho muito forte por parte do sindicato que quer que as aulas não comecem, pois os professores não querem trabalhar. Eles fizeram campanha para os pais não levarem os filhos”, disse o prefeito.   Para o prefeito de Brumado, a retomada das aulas presenciais já deveria ter acontecido (Foto: divulgação) “Campanha”  Uma das professoras que sentem orgulho em dizer que “fez campanha” para que os pais não mandassem seus alunos para a creche onde ensina foi Elianar Guimarães, que também é mãe de uma aluna autista que ficou em casa. “Eu tive que vir trabalhar, mas felizmente na minha turma não veio ninguém dos 22 alunos. E se viessem, não estaria ninguém cumprindo protocolo de segurança, pois não tem estrutura física na sala para isso”, disse a docente.  

Mesmo assim, antes da decisão da desembargadora que suspendeu as aulas presenciais, Elianar já tinha aceitado que, nos próximos dias, a quantidade de alunos iria aumentar, como também imaginava o prefeito. “Eu trabalho em um bairro de vulnerabilidade, o mais pobre da cidade. Hoje não vieram, mas acho que eles vão vir nos próximos dias, por uma questão de pobreza, que vai forçar os pais a mandarem os filhos irem para a escola. Aqui eles terão refeições quatro vezes ao dia”, afirmou.  A professora Elianar Guimarães não acredita que a sua sala tenha estrutura para a retomada das aulas (Foto: arquivo pessoal) Já para as mães Vania Aguiar, 45 anos, e Luciane Martins, 40 anos, a questão da merenda não será um problema. Elas preferem que as filhas estudem em casa até o fim da pandemia. “Só sentiria a vontade de mandar a minha filha quando tivéssemos uma vacina”, disse Vania. “O aprendizado em casa não é o mesmo do que na escola, mas se for preciso perder de ano por isso, não será problema. Aprendizado se recupera e vida não”, disse Luciane.  

O pai e tio Fábio Henrique, 27 anos, não permitiu que seu filho e sobrinho fossem para as salas de aula. Ele reclama que na cidade os bares estão lotados e não tem fiscalização para evitar aglomerações. "Mas não é por isso que tem que abrir tudo. Defendo que a prefeitura tenha que multar os estabelecimentos que estão descumprindo as regras, mas não dá para obrigar as pessoas que estão se isolando a porem suas vidas em risco indo para a escola”, disse.  Fabio Henrique afirma que as salas ainda não tiveram as cadeiras devidamente distanciadas (Foto: arquivo pessoal) Todos esses pais disseram não conhecer outros genitores que permitiram que os filhos fossem para a escola. “Essa não foi a primeira vez que a prefeitura decidiu retomar as aulas. Por isso, a gente tem segurança em dizer que não há preocupação com a educação e sim, talvez, com interesses individuais. Só que essa baixa adesão foi uma resposta que a comunidade deu de não aceitar essa volta às aulas", disse o presidente municipal da APLB de Brumado, o sindicato de professores da cidade.  

Segundo a secretária de educação da cidade, Edineia Ataíde, alguns colégios não receberam sequer um aluno no dia todo. “Mas outras chegaram a ter 15. Com os alunos que foram, fizemos marcação de distanciamento e o recebemos com toda segurança. Os professores compareceram em massa, exceto os que são do grupo de risco. Eles receberam Equipamentos de Proteção Individual (EPIs)”, explicou. Segundo a secretária, todas as salas vão funcionar com até 15 alunos distantes 1,5m. 

Retomada  Para o infectologista da S.O.S. Vida, Matheus Todt, esse período de redução do número de casos e mortes é o ideal para as flexibilizações. No entanto, ele lembra que não há um protocolo nacional de retorno das aulas, o que ele classifica como um problema. “Não há um protocolo mínimo: regras que mostrem o que a escola tem que ter, tem que fazer, como ela deve se comportar. Não há diretrizes básicas. Um protocolo bem definido faria diferença nesse momento”, disse.  

Todt lembrou ainda que, em alguns países, como a Inglaterra e França, escolas tiveram que ser fechadas, pois a reabertura esteve associada com o aumento na taxa de transmissão da cidade. “A sala de aula é um local de contato próximo e alta possibilidade de transmissão. Há o medo das crianças voltarem para casa e transmitirem o vírus para seus familiares, que podem ser de grupo de risco”, lembrou.  

Na semana passada, o governador da Bahia, Rui Costa (PT), afirmou que 10% dos estudantes do subúrbio de Salvador que fizeram testes de coronavírus estavam com a doença. Segundo Rui, o índice é o mesmo registrado em outras capitais e cidades, o que demonstraria que um em cada 10 estudantes que retornarem às aulas podem estar contaminados com o vírus.  “Isso sem contar a possibilidade dos erros do teste. A criança tem mais chance de ser assintomática. As vezes ela não tem o sintoma, tem a doença, mas o teste dá falso negativo. E ela pode na escola ajudar a espalhar o vírus. Então, há um risco real de ter, mesmo com todas preocupações, um aumento no número de casos, principalmente entre os contatos dos estudantes”, afirmou o infectologista.  Brumado é a primeira e única cidade da Bahia que anunciou e chegou a colocar em prática a retomada das aulas presenciais. Outras cidades fora do estado também já fizeram o mesmo, como Manaus, Campo Grande e Fernando de Noronha. “Outros prefeitos do estado entraram em contato comigo me consultado sobre abertura, mas eles estão com medo de fazer. Só que o medo não é uma característica minha”, finalizou o prefeito de Brumado, Eduardo Vasconcelos.   

* Com orientação da chefe de reportagem Perla Ribeiro