O fenômeno BaianaSystem: coletivo arrasta multidão por onde passa

Criado em 2009, o grupo atrai milhares atrás do seu trio, o Navio Pirata, no Carnaval de Salvador

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  • Raquel Brito

Publicado em 14 de fevereiro de 2024 às 06:00

Grupo leva mar de foliões às ruas
Grupo leva mar de foliões às ruas Crédito: Paula Froes/CORREIO

Quando a guitarra de Robertinho Barreto e os vocais de Russo Passapusso encontram a avenida, o resultado é sempre uma multidão cantando e pulando em euforia. Como um mar de foliões cercando o Navio Pirata – o trio do grupo –, o público do BaianaSystem faz jus ao título de ‘pipoca’.

Neste Carnaval, em que completam 15 anos de Baiana e dez à frente do trio, não foi diferente. Tradicionalmente, a participação do grupo na folia começa ainda no pré-Carnaval, no comando do Furdunço. A banda puxa o Navio Pirata no bloco desde sua primeira edição, há dez anos.

Já na quinta-feira (8), abertura da festa, liderada por Ivete Sangalo, o Baiana participou do retorno do histórico encontro de trios na Praça Castro Alves, ao lado também de Carlinhos Brown e do cinquentenário bloco Ilê Aiyê.

Nesta segunda (12), o Navio Pirata retornou ao circuito Osmar, para a Pipoca do Baiana, enchendo a avenida de máscaras de carranca em preto, verde e branco. A banda, que nasceu em 2009 como uma iniciativa de Robertinho, Russo e SekoBass, cresceu nos corações de baianos e turistas e hoje tem um dos trios mais esperados do período momesco.

Dono de um estilo que une o soundsystem jamaicano à guitarra baiana e ao reggae, o BaianaSystem soma mensagens políticas e sociais aos arranjos, já catárticos por si só. A mescla dá mais que certo na folia.

Para Hagamenon Brito, jornalista, crítico musical e inventor do termo ‘axé music’, o sucesso do grupo, no Carnaval e fora dele, está atrelado a diversos fatores. Alguns deles são o respeito pela tradição, com Roberto Barreto honrando a guitarra baiana de Armandinho e ressignificando o instrumento, a percussão potente de Japa e os vocais de Russo, que sabe muito bem como mover o público. As letras também são um ponto importante.

"Baiana tem uma multidão democrática, tem ali uma pulsação de contestação ao sistema, porque as letras são cada vez mais bem elaboradas e não são panfletárias, mas em crítica ao sistema político, ao capitalismo e às desigualdades", afirma.

Foi isso o que atraiu a paulista Priscila Paula, médica veterinária de 32 anos, que viajou para Salvador só para ir atrás do trio da banda, o Navio Pirata. “A questão da ancestralidade e o valor dado à população são diferenciais deles. O teor das letras. E essa pipoca é uma chance de todo mundo estar junto, curtindo, com muita segurança. Dia 17 eles tocam lá em Ibirapuera e eu vou também”, antecipa.

Segundo Brito, com a união de estilos, o Baiana une também vários grupos: dos fãs de samba reggae aos admiradores de música eletrônica e rock n’ roll, o Navio Pirata arrasta todo mundo para a avenida com sua sonoridade única.

“É diferente e ousado. É afrofuturismo o que eles fazem. Eu acho BaianaSystem o maior nome artístico na música baiana neste século, ninguém tem uma capacidade de renovação como eles. Quando eles surgem em 2009, é para preencher uma lacuna na estética do axé e do Carnaval. Ainda tinha muitos blocos com abadás e eles surgem com essa pipoca poderosa”, avalia.

Desde que conheceu a banda, o médico Nestor Moreira, de 33 anos, acompanha o Navio Pirata no Carnaval. Dos dez anos de carreira do grupo, há nove Moreira está colado com eles. Para ele, o BaianaSystem mudou a história do Carnaval soteropolitano.

“Eles fazem uma mistura que é só deles. Até eles têm dificuldade em definir o estilo de som do Baiana. Só vindo e estando aqui para sentir a energia. A pipoca deles traz uma sensação de bem-estar, de pertencimento”, diz.

Na pipoca da segunda-feira de Carnaval, ao lado do Navio Pirata, o servidor público Luciano Souza, 40, segurava uma placa com a palavra “Magnata” ao lado de um desenho das tradicionais máscaras de carranca, em um pedido para que a banda tocasse sua música preferida. Pelo segundo ano consecutivo, ele saiu de Brasília para acompanhar o BaianaSystem no Carnaval de Salvador.

“Eu os conheci em 2019, num show em Brasília. Fiquei impressionado e, desde então, sou um mega fã. Para mim, eles criaram outro ritmo musical, que é específico deles. Todo mundo se encantou por isso e agora todo lugar que eles vão, lota”, diz.

Despedida

Na tarde de segunda-feira (12), a banda levou o Navio Pirata para o circuito Osmar e criou um mar de máscaras de carrancas em preto, verde e branco entre os foliões, numa despedida do trio ao Carnaval deste ano. O Baiana foi às ruas com o tema “Batukerê: Toda Fé, Toda Paz”. Com Batukerê, a banda inicia um movimento que encampará o universo dela daqui em diante.

Na despedida do Navio, eles apresentaram sucessos como Lucro, Sulamericano e Playsom, e receberam no trio as participações de Margareth Menezes, Melly, Larissa Luz e Vandal. Com a frase “Blocos Afro - 50 anos” na lateral do trio, o grupo também fez uma grande homenagem ao cinquentenário do Ilê Aiyê, primeiro bloco afro do país. Um dos tributos foi uma interpretação poderosa da canção “Depois que o Ilê passar”, na voz de Larissa Luz.

Durante o percurso, o vocalista Russo Passapusso celebrou o Carnaval como direito à cidade e protestou contra a especulação imobiliária. “Não vamos dar trela ao discurso de ganância na nossa cidade. Não faremos Carnaval debaixo de prédios, e sim de frente para o mar”, disse o cantor, em meio à performance de Lucro.

Na abertura oficial do Carnaval, até Ivete aproveitou para tietar a banda: 'Merece expandir essa energia linda'. Ela aproveitou o momento para relembrar a parceria com o guitarrista Roberto Barreto, o Beto, ainda no início da carreira. "Betão, meu amor, te amo! Lembro da gente lá atrás nos nossos ensaios na Barra. O Baiana merece expandir essa energia linda, esse novo momento", disse.

Ivete revelou que se emocionou ao ver a multidão que acompanhou o BaianaSystem no Furdunço, uma semana antes. “Chorei em casa, queria desejar muito sucesso. Que o criativo de vocês continue nessa ascendente”, disse a Russo Passapusso, vocalista da banda.

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