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Larissa Almeida
Publicado em 26 de janeiro de 2024 às 09:00
Símbolo de fé, o colar de contas branco e azul usado pelos Filhos de Gandhy passou a ser adotado na vestimenta dos associados como forma de homenagear Oxalá e Ogum. Mas, nos anos 2000, quando o afoxé teve uma alta de popularidade, o adereço ganhou nova função. Cobiçado por quem estava de fora do Tapete Branco, sobretudo o público feminino – que historicamente nunca pôde se associar ao afoxé, formado apenas por homens – o colar era dado com a condição de ter um beijo como pagamento. >
Associado há 30 anos dos Filhos de Gandhy, o aposentado João Anaclécio, 75 anos, atualmente é um dos diretores da agremiação. Na sua longa jornada junto ao grupo musical, ele reitera que o movimento do colar por um beijo surgiu no que chama de ‘modernidade’. “Na minha época, não era assim. Tinha fiscais para dizer o que estava ou não errado. Mas o bloco foi crescendo, as coisas foram dificultando e não havia condições de fiscalizar aquele grupo todo. Então, esse movimento começou, mas sabendo que era errado”, diz. >
O advogado Matheus Maciel, 31 anos, soma mais de uma década como associado do afoxé. Ele conta que, quando se vinculou aos Filhos de Gandhy, a história de trocar colar por um beijo existia. Segundo ele, até hoje é possível perceber a diferença entre quem se associa pela tradição e aqueles que vão pela ‘azaração’. “Tem gente que sequer acompanha o bloco e usa adereços que fogem do padrão da fantasia. O pessoal que sai comigo vai no bloco pela tradição, pelo que o Gandhy, de fato, representa. Então, saímos do Pelourinho. Em geral, quem se preocupa com a padronização está mais ligado à tradição do bloco”, aponta. >
Um associado, que preferiu não se identificar, conta que distribuiu colares, mas sem pedir beijo. Ele acredita que a prática é uma manifestação clara de assédio e diz que já viu outros associados assediando mulheres ao colocar o colar sobre o pescoço delas, sem que houvesse autorização ou sem que elas conhecessem a ‘tradição’. >
Gilsoney de Oliveira, presidente da associação, reconhece a existência da prática, mas nega que ela nasceu dentro da agremiação. “A troca do colar pelo beijo é assédio. O colar é a força de Oxalá e Ogun, então nós não cultivamos isso e combatemos essa inversão de valores. Isso foi algo que alguns associados criaram. É assédio a partir do momento que há a tentativa de colocar um colar a força ou querendo fazer uma troca”, ressalta.>
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*Com orientação da chefe de reportagem Perla Ribeiro>