Cadastre-se e receba grátis as principais notícias do Correio.
Da Redação
Publicado em 15 de outubro de 2022 às 11:00
- Atualizado há 2 anos
Apesar de tudo, a interação entre gêneros continua me interessando demais. Daí que, há algum tempo, venho percebendo o surgimento de certo tipo de personagem nesse cenário. Primeiro, eram raríssimos. De repente, aumentou a quantidade e eles aparecem cada vez mais. Assim, confirmei a minha desconfiança e registro aqui. Depois dos bajuladores de gente famosa, bajuladores de gente rica, bajuladores de jornalistas (ui!) e outros tipos bem comuns, a trend do momento é "bajulador de mulher retada".>
Que o homem cis hetero tradicional faz qualquer miséria pra "pegar mulé" a gente já sabe e aceita quando quer, né? Normal. Pois o bajulador de mulher retada é um movimento dissidente desse grupo aí. Idêntica base ideológica, só que fundaram um partido novo. Mais "atual". O objetivo é o mesmo, mas mudou o método e a especificidade do público alvo. Eles investem em mulheres que julgam "fortes", "independentes" e "resolvidas" porque percebem as (inclusive financeiras) vantagens. Daí, decoraram dois conceitos básicos da feminilidade contemporânea e ajustaram o conteúdo das falas para o que acham que tá "vendendo mais" nesse segmento do mercado.>
Um ajuste até inteligente já que os transporta para um ambiente de concorrência mais baixa, porque a maioria dos homens continua parada. Só que não é o suficiente pra convencer um eleitorado mais informado. Pelo menos, não a mim e acho que não sou a única a ter matado a charada. É tudo "quase" bom, tipo margarina e "mistura láctea". Problema é que falta um mínimo de sustentabilidade. Em pouco tempo, as insuficiências vão se instalando por toda parte. Sabe o "desculpa por ser homem"? É, basicamente, o lastro. Completado pelo fato de que basta ser mulher para, no texto de lá eles, estar em condição de superioridade. Veja que negócio enjoado.>
Na fala desse tipo de homem, toda mulher é iluminada e genial. Tudo que vem de nós é massa. A ele, resta apenas a humildade de "aprender", admirar e labutar pra fazer um maravilhoso (na opinião dele) sexo oral. Isso porque, de tanto a gente falar do clitóris (ô arrependimento), eles tomaram conhecimento do órgão e agora acham que pilotam o danado com a maior destreza que há. Estão obcecados por demonstrar essa habilidade. A mulher goste ou não goste, queira ou não queira. Ele precisa se "amostrar".>
(Trocaram o pinto pela língua.)>
(Mantiveram a presunção.)>
(Não vi vantagem.)>
(Tudo isso sem, jamais, invadir nosso "lugar de fala", mas aproveitando todas as oportunidades para dizer o quanto ele é diferente dos que vieram antes, e afirmar que a masculinidade dele não nos intoxicará jamais.)>
Tudo muito óbvio, porém, se a pessoa tá carente, já era. É tanta "admiração", tanto "respeito", que a vivente cai. Quando vê, adotou o cruzamento de poodle toy com shih-tzu e tá ali passeando com o bicho no colo, pra cima e pra baixo. Corrigindo os comportamentos inadequados e entregando biscoitinhos a cada ordem bem executada. Não me ocorre outra comparação: esse tipo é cachorrinho de madame, né? Fofo e submisso pra desfrutar de um ambiente seguro e confortável.>
(Mulher retada que nunca fez essa adoção que dê a primeira gargalhada. Cada uma tem seu tempo, a gente amadurece é devagar.)>
Quanto mais a gente é "maravilhosa", mais eles elogiam e mais a gente quer ser e mais a gente trabalha e mais a gente se lasca. Quando vê, a gente tá pagando as contas, cuidando do cachorro, arrumando a casa (a dele, inclusive), propondo os programas, dando aula de sociologia aplicada e ajudando no trabalho dele, com nosso "cérebro privilegiado". Tudo sozinha e de graça. Ele, descansadíssimo, aplaudindo, que é a única coisa que ele faz desde o começo e a mulher não percebeu porque tava rezada.>
A armadilha é essa: mulher foda atrai homem encostado. Desde sempre, aliás. Agora só mudou o palavreado deles porque já não somos as mesmas e eles só não mudariam se fossem muito abestalhados. Esses, mudaram. Mas foi no texto e na malandragem. Aí, a gente cai por carência, mas também por vaidade. Vigia. O bom é estar lado a lado. No coletivo e no individual.>
Sabe lavar banheiro? Fazer xixi dentro do vaso? Fazer mercado? Propor programas legais? Ganha o próprio dinheiro? Tem seu próprio trabalho? Se movimenta no mundo? Sabe o que significa ombro a ombro? É disso que se trata. Tem algo a oferecer além da "vergonha de ser homem", da subserviência e da fragilidade? Vê mulher como gente? Nem menos nem mais, nem acima nem abaixo? Com menos presepada e mais praticidade, estaríamos em melhor lugar.>
Quem quiser entrar nessa de "musa máxima" que fique à vontade. Aqui, quando acontecem as investidas, me sinto alvo de tentativa de estelionato. Seja quem for o bajulador - e o/a bajulado/a - o significado disso continua sendo lisonjear para obter vantagens. Então, já traduzo qualquer adulação do tipo "as mulheres que mandam", "quero aprender com você" ou "todo poder às mulheres" para: "gostaria de ouvir a palavra do bajulador de mulher retada?".>
É só isso que eu escuto, no lugar das "belas falas". Aí, posso até ficar uns dias, rir de umas gracinhas, aceitar uns rapapés, me divertir no corpinho, mas, no fim das contas, encho o saco. Em resumo e definitivamente, eu passo.>