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Publicado em 31 de dezembro de 2025 às 18:35
A democracia é um arado. Arado diário. Terra boa onde plantamos nossos sonhos de liberdade, semeadura e alimento. >
Trago essa imagem do roçado da terra porque para quem semeia aquilo que, logo ali, na curva do tempo, no percurso da natureza, será alimento e nutrição, sabe que quem não planta hoje, não colhe amanhã.>
O trabalho, neste sentido, é sabedoria e é ciência, caminho e imaginação. E enquanto houver imaginação, haverá caminhos possíveis. >
A promessa de profetas mercadores de facilidades, que produz crises para vender soluções e que tem tomado conta do desejo social, nos retira natureza e tempo próprio, cultivo e corpo-sujeito, processo e política. >
Mas a consciência de que não há alimento - e portanto vida - quando não se planta, vai conduzindo o árduo do arado às inteligências coletivas, partilhadas e comunitárias, uma engrenagem do comum onde habitam saberes e ciências, tecnologias, práticas que mobilizam invenção, imaginação onde habitam o impossível e aí estão sonhos, descanso, cuidados, linguagem, desejo, libido, festas, brincantes, brincadeiras, arte, essa ofensiva sensível.>
É dessa matéria de que somos feitas. De uma sabedoria ancestral que desarma os poderes que des-matam as liberdades. Uma natureza também chamada cultura, que articula o sujeito à sua dimensão coletiva, fortalecendo a conjugação dessa primeira pessoa do plural, o tal “nós”. É a convicção de que essa é a nossa terra, esse é o nosso chão comum e solo fértil, que a democracia é esse arado, essa trincheira permanente que nos coloca em movimento.>
Neste ciclo que se inicia, sejamos partilha, de partição de alimento, de nutrição, reparação, regeneração e em qualquer lugar onde houver coletividade pelo bem comum, estaremos todas e todos. Sejamos fazedoras e fazedores de uma cultura democrática, na defesa radical da vida e do bem viver, porque não é livre quem vive com medo. >
O Brasil do amanhã, construído agora mesmo, será feito com a letra, com o som, com as existências, as vozes e urgências e com aquilo que somos nesse imenso país, nos levando adiante, mais alto, mais justos, iguais. >
Plantemos a semente desse amanhã que não demora. Em 2026, altivas e atentas, com festa e luta, reflorestaremos o sonhar.>
Maria Marighella é presidente da Fundação Nacional de Artes (Funarte)>