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Publicado em 12 de outubro de 2025 às 08:00
Licença, agora sou mãe. O filho nasce e a vida da mulher nunca mais vai ser a mesma. O mundo vira de ponta-cabeça e o centro das atenções é o pedaço de gente que brotou da gente. >
Dias e noites confundem-se no choro miúdo, na mamada interminável, na vigília de cuidados. Entre banhos, golfadas, vacinas, as mães vão tentando se ajustar à nova rotina. O primeiro sorriso banguela desmonta o cansaço. O dente que desponta traz na carona viroses. E o tropeço das primeiras palavras? Cada fase exige entrega, e cada entrega tem um custo invisível: noites mal dormidas, banhos aligeirados, comida fria, reuniões adiadas, projetos engavetados. Um corpo que já não se governa sozinho.>
As fases de crescimento não entram nas estatísticas, mas moldam destinos. No torno do ser, as mães vão se refazendo. Recentemente, me tornei dinda-avó. Vi minha única afilhada se tornar mãe e escolher acompanhar integralmente o desenvolvimento da filha no primeiro ano de vida. Privilégio viver esse início com a inteireza que o momento merece. Poucas mulheres recebem o bebê no colo nas condições ideais. Muitas carregam o filho mole nos braços com a dureza da vida. Com os boletos a pagar. Como vou dar conta?>
Não é apenas um bebê que nasce, mas uma mulher que renasce – e que precisa de tempo. Tempo para se refazer da travessia do parto. Tempo para aprender a ser colo. Tempo para se reconciliar com o espelho, com o mercado – o das compras e o de trabalho. Com o lazer, a atividade física. Consigo mesma.>
As relações amorosas clamam por paciência, cumplicidade e participação ativa. Na vida pessoal, a negociação é constante com os próprios desejos. Há períodos em que eles são silenciados. Amordaçados. Os filhos crescem, ficam independentes e a gente continua tentando se organizar tendo outro coração batendo fora do corpo.>
Há leis que parecem nascer do coração antes mesmo de ganharem tinta e papel. O projeto de lei que amplia a licença-maternidade em até 120 dias, a contar após a alta hospitalar de mães e bebês, é um gesto de reconhecimento do óbvio: a maternidade não cabe em calendários estreitos.>
A medida anunciada durante a 5ª Conferência Nacional de Políticas para Mulheres altera a Consolidação das Leis do Trabalho e a Lei de Benefício da Previdência Social. É fruto de muita luta feminista. O que esse projeto de lei traz é o reconhecimento de que cuidar de uma nova vida não é tarefa que se esgota a curto prazo. É um ciclo de dedicação sem fim. Que a sociedade, enfim, entenda o peso e a beleza do maternar.>
Fernanda Carvalho é jornalista, escritora, autora do Livro A Luz da Maternidade – Relatos de Parto sem Dor conduzidos por Gerson de Barros Mascarenhas>