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Vinicius Harfush
Publicado em 30 de setembro de 2023 às 09:00
A esquina da Avenida Mem de Sá com a Rua Gomes Freire sempre foi muito movimentada no bairro da Lapa, no Centro do Rio de Janeiro. E o destino é sempre ele: o Bar da Cachaça. Mas de umas semanas para cá o boteco de rua ganhou atenção de quem facilmente passaria reto e trocaria a simplicidade e os preços baixos das doses pelos nomes ostentosos da avenida, como o Boteco Belmonte, Boteco da Garrafa ou Bar da Lapa. E tudo isso graças ao hit ‘Chico’, da cantora Luísa Sonza, que declarou seu amor ao - agora ex - namorado Chico Veiga, mais conhecido como Chico Moedas, frequentador assíduo do local. Ou também virou ex? >
E o ato de infidelidade do rapaz - cometido no banheiro de um outro boteco carioca famoso, que não vem ao caso - deu ao Bar da Cachaça uma ‘nova cara’. Turistas que, assim como eu, não poderiam deixar de passar lá enquanto andavam pela Lapa em busca de cerveja e um bom samba. Modéstia parte, mesmo antes do sucesso, sentaria naquela mesa colada com a avenida para tomar uma gelada, experimentar umas doses e ver os ônibus tirarem um fino da calçada, quase derrubando as cadeiras.>
Mas confesso que o sucesso da composição só reforçou essa curiosidade. Não só para ver que tipo de lugar o tal do Chico Moedas frequentava, mas também para aproveitar e tirar a foto da plaquinha do bar com a música de fundo e postar nas redes sociais. E que gerou muito engajamento, vale ressaltar. “Pode fazer sua fumaça / O Bar da Cachaça vai ser nosso lar”, diz a letra da canção de Luísa e que é repetida toda vez que algum cliente novo senta na mesa do boteco.>
As mesas, aliás, todas ocupadas. Isso porque fui em uma terça-feira à noite - típico de turista. Com mais dois amigos, ficamos nos questionando como é que seria então o movimento nas sextas e nos sábados. “Será que a galera faz coro com a música aqui?”. “Como é que cabe tanta gente na calçada? Provavelmente a rua fica ocupada”. “Porra, será que o dono tá feliz com essa fama?”.>
Essa última pergunta é fácil de responder. Nas redes sociais, o Bar da Cachaça aproveitou o hype para tirar uma onda com o cliente infiel e prestar apoio à Luísa Sonza. Em tom de brincadeira, citaram em post no Instagram que estavam lisonjeados com a homenagem de Luísa e reforçaram que “não têm relação com o ocorrido e que não opinariam sobre a vida dos envolvidos”. Já em outro post, o Bar disse que ainda poderia ser a casa da cantora e que Chico foi “apenas um coadjuvante”. Tá cada vez mais difícil dele voltar para lá.>
Ao chegar, Sérgio, que administra o estabelecimento ao lado de Maria, foi quem nos atendeu e já mostrou de cara o cardápio com centenas de opções de doses. Das mais tradicionais como Seleta, Cachaça Jambu e Boazinha, até as batidas de abacaxi com coco, amendoim, milho verde, gengibre e por aí vai… Essa última foi a que mais gostei. Por cinco reais você experimenta uma dose que tem a medida certa do álcool e ardor do gengibre. Anota essa dica. Outra que experimentei foi a de cravo e canela, mas aí o tradicional Cravinho do Pelourinho dá de goleada, então dá para deixar passar. Os preços das doses variam de cinco a dez reais, achei justo. Já a cerveja sai bem gelada entre dez e 15 reais.>
O fato é que o Bar da Cachaça é bem mais tradicional do que o hit da cantora. Fundado em 1960, o local já se chamou Casa da Cachaça e, desde 2012, é tombado como patrimônio cultural da cidade do Rio de Janeiro. A casa tem uma espécie de selo que atesta quais são os bares mais tradicionais do RJ. E sempre atraiu um público mais ‘cult’ e jovem, reforçando esse papel de espaço cultural carioca. Basta dar um Google e ver as fotos mais antigas do bar, com a calçada lotada de gente.>
O ‘Bar do Chico’, como muitos passaram a chamar, na verdade, nunca foi dele. E não que ele tivesse essa pretensão, nem tenho como saber. Mas como tradição não é moda, o Bar da Cachaça vai seguir sempre cheio, seja com os turistas, cariocas, amantes da música e até os infiéis.>