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Luiza Gonçalves
Publicado em 22 de julho de 2024 às 14:23
Ariano Suassuna (1927-2014) é uma das referências para pensar teatro, literatura e a valorização da cultura do Nordeste brasileiro. Dramaturgo, professor, pintor e escritor, Suassuna é autor de algumas das obras mais influentes da literatura do século XX, como o Auto da Compadecida (1955). Mas, o paraibano também foi responsável por encabeçar um movimento que marcou os anos 1970 ao propor a união de artistas de diferentes domínios em prol da criação de uma arte erudita a partir de manifestações artístico-culturais do Nordeste. >
Nomeado Movimento Armorial, a corrente reunia literatura, música, artes plásticas e cênicas em torno de uma proposta desafiadora que reverbera até os dias de hoje, 50 anos após sua criação. Nesta terça-feira (23), o público soteropolitano terá a chance de imergir nas ideias de Suassuna e nas vozes do movimento na exposição Armorial 50, que será inaugurada no Museu de Arte da Bahia (MAB).>
Armorial 50 foi idealizada pela produtora cultural Regina Godoy em 2019, após assistir a um espetáculo de música armorial. “Eu não sabia o que era e, quando cheguei lá, fiquei encantada. Cheguei em casa e fui pesquisar, cheguei ao Suassuna, mas eu não conhecia o movimento. Fui vendo quem eram os artistas e percebi que em 2020 seriam 50 anos de Movimento Armorial, que fala da cultura popular. Percebi que tinha que ter uma exposição sobre isso, com diálogos, música, encontros e que retratasse essa efervescência cultural”, relembra.>
O projeto foi integralmente pensado e planejado na pandemia e teve sua estreia no CCBB de Belo Horizonte, em dezembro de 2021, com curadoria de Denise Mattar e consultoria de Manuel Dantas Suassuna, artista plástico e filho de Ariano, e Carlos Newton Júnior, biógrafo do escritor. A mostra já passou pelo Rio de Janeiro, São Paulo, Campina Grande, Recife e, após a estadia em Salvador, segue para Natal e Fortaleza.>
“A gente percebe que as pessoas não conhecem tanto o Armorial ainda. Elas conhecem o Ariano e por isso vão à exposição. E aí se impactam com toda essa beleza, com as referências que estão lá, o cordel, a xilogravura, a iluminogravura, os folguedos. Acho que o que fizemos nessa exposição toca as pessoas, porque a arte popular brasileira é muito colorida, é maravilhosa e traduz uma linguagem de vários territórios, comunidades e povos se encontrando”, defende Godoy.>
Fases do Armorial>
“A coisa mais difícil foi juntar as diferentes facetas do Armorial. Mas, acho que a exposição conseguiu traçar um percurso muito rico dentro dessa produção, com variados artistas e características que marcam as fases do Armorial, seu imbricamento com a literatura, a continuidade hoje e suas principais referências”, pondera a curadora Denise Mattar.>
A exposição, que possui mais de 135 obras, está dividida em núcleos. O primeiro abriga o pré-Armorial, que já conflui com suas tendências, a partir dos figurinos criados pelo artista pernambucano Francisco Brennand (1927-2019) para a primeira adaptação de O Auto da Compadecida, em 1969, e da primeira fase do Armorial, chamada de experimental, com artistas como Aloísio Braga e Miguel dos Santos, em obras que foram escolhidas e compradas pelo próprio Suassuna e depois doadas à Universidade Federal de Pernambuco.>
O núcleo conta ainda com peças do Museu de Arte Moderna Luiz Magalhães e com sala especial dedicada ao pintor Gilvan Samico. “O grande representante do Armorial nas artes plásticas. Acho que Samico foi o artista que compreendeu profundamente o que Ariano estava propondo”, pontua Denise.>
No núcleo Segunda Fase do Movimento Armorial encontram-se obras de Zélia Suassuna, Manoel Dantas, do próprio Ariano em suas iluminogravuras, com direito a uma escultura de 4 metros de comprimento da Onça Caetana, um dos elementos constantes em suas imagens. Há ainda o núcleo Vida e Obra de Ariano Suassuna, com manuscritos, alfabeto sertanejo, capas de livros e cronologia completa; e o núcleo Armorial Hoje e Sempre, focado no audiovisual com as aulas espetáculo do autor, do grupo Grial de Dança, fundado por Suassuna com a bailarina Maria Paula Costa Rêgo, e trechos do filme O Auto da Compadecida (Guel Arraes/2000).>
Encerrando a exposição está o núcleo Referências. “Ariano se referenciava no cordel, que ele amava, e nas festas populares. Então, a gente tem um conjunto dos artistas mais importantes do cordel, como Mestre Dila e J. Borges, e também os folguedos, como o Reisado do Cavalo- Marinho e, naturalmente, o maracatu, que são espetaculares”, diz a curadora.>
Para Denise, além de simbolizar uma homenagem à cultura brasileira e a Suassuna, a exposição marca um momento merecido do protagonismo das artes populares nos espaços de cultura: “Depois de ter passado por um período muito árido, eu acho que a gente está vivendo uma retomada muito interessante de olhar para as produções populares e isso é tendência em todos os países. O mundo das artes plásticas está com esse olhar menos antipático, elitista e mais voltado a enxergar as coisas extraordinárias que temos na produção das artes populares”.>
SERVIÇO - MOSTRA MOVIMENTO ARMORIAL 50 | de 22/7 a 20/10, no Museu de Arte da Bahia (MAB), na Vitória | Visitação: terça a domingo das 10h às 18h | Gratuito, com retirada do ingresso pelo Sympla e no local>