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Pobres Criaturas é um espetáculo de excentricidade e descobertas

Emma Stone brilha em releitura de Frankenstein que concorre em 11 categorias do Oscar

  • R
  • Raquel Brito

Publicado em 1 de fevereiro de 2024 às 06:00

Pobres Criaturas tem onze indicações ao Oscar
Pobres Criaturas tem onze indicações ao Oscar Crédito: Reprodução

Bella Baxter (Emma Stone) é uma criança que ocupa um corpo de mulher numa jornada de autodescobrimento em Pobres Criaturas, que chega às telonas de Salvador nesta quinta (1º). Adaptação do livro de mesmo nome, escrito por Alasdair Gray em 1992, o novo filme de Yorgos Lanthimos une uma trama ‘frankensteiniana’ a um fascinante ‘coming-of-age’ surrealista.

Indicado ao Oscar deste ano em onze categorias, incluindo filme e atriz, a história acompanha a jornada de descobertas da jovem criada como um experimento pelo cientista Godwin Baxter (Willem Dafoe). Bella nasce quando o personagem de Dafoe encontra o corpo de Victoria Blessington, mulher grávida que acabou de cometer suicídio, e decide ressuscitá-la, implantando o cérebro do bebê no cadáver da mãe.

No início do filme, acompanhamos a protagonista, fisicamente adulta, aprendendo a falar, fazendo lambanças com comida e birras típicas da primeira infância. Os planos do cientista são manter Bella em casa e estudar seu desenvolvimento, tarefa para a qual recruta a ajuda do jovem Max McCandless (Ramy Youssef). Juntos, criam condições para que ela nunca precise sair da propriedade. Entretanto, conforme aprende sobre o que há lá fora, o que Bella quer é cruzar os limites do conhecido.

Quando ela sai da casa de Godwin, a quem se refere como God (Deus), e tem a sua primeira relação sexual com o advogado de caráter questionável Duncan Wedderburn (brilhantemente interpretado por Mark Ruffalo), o longa passa dos tons de cinza para as cores vibrantes do prazer. Com Wedderburn, ela vai para cidades como Lisboa e Paris e explora sua sexualidade. A partir daí, o amadurecimento de Bella acontece rapidamente.

No reencontro com Yorgos Lanthimos, após A Favorita (2017), Stone entrega uma performance memorável. A atriz nos guia de forma cristalina pelas fases de Bella. Desde a criança em desenvolvimento da linguagem até a mulher consciente e capaz de tomar suas próprias decisões, passando pela jovem de ideias aventureiras.

No estilo extravagante característico do diretor, com direito a porcos com corpo de galinha e gansos com corpo de cabra, Pobres Criaturas conduz o espectador até a alta sociedade vitoriana pelos olhos de uma personagem que não entende os preconceitos ao seu redor e não segue as regras impostas, falando abertamente sobre órgãos genitais durante um jantar pomposo ou dançando freneticamente enquanto casais performam seu dois-pra-lá-dois-pra-cá.

A cenografia do filme também é estonteante. Essencial para a construção da narrativa surrealista e retrofuturista da obra, a direção de arte ficou nas mãos de James Price e Shona Heath, que trazem uma composição com referências claras a artistas como o pintor Hieronymus Bosch: no espelho de Bella e no teto de um quarto vemos orelhas gigantes que, assim como a parte externa da casa do cientista, parecem ter saído diretamente do quadro Jardim das Delícias Terrenas.

O Jardim das Delícias Terrenas, de Bosch
O Jardim das Delícias Terrenas, de Bosch Crédito: Reprodução

Amadurecimento

Ao almejar a liberdade e o descobrimento do mundo ao seu redor, a Frankenstein feminina de Lanthimos experiencia o prazer (do sexo à emoção de ouvir música), mas também se depara com uma série de novos tipos de aprisionamento. Desde a possessividade dos homens às dinâmicas de poder envolvidas nas relações.

Numa de suas viagens, o cínico Harry Astley (Jerrod Carmichael) a leva para ver crianças mortas e pessoas em condições miseráveis, o que faz com que Bella perceba uma realidade de desigualdades da qual a vida na torre de Godwin a protegia. “O dinheiro é uma doença por si só, e a escassez dele também”, reconhece a personagem, aos prantos.

Consegue ser ao mesmo tempo refrescante e angustiante assistir a jovem em suas primeiras experiências, com seu olhar atento (e ingênuo) sobre o mundo. Isso porque, enquanto sentimos a diversão de vê-la experimentar ostras ou passear sozinha pela cidade, também é fácil se projetar nestas etapas do amadurecimento - e baques da vida adulta -, como a necessidade de conseguir dinheiro para se manter e de fugir da expectativa de reprodução e obediência colocada sobre as mulheres. Nas anotações da produção, Stone questiona: o que uma mulher seria se pudesse começar do zero?

Nenhuma das vivências, entretanto, faz com que Bella se arrependa de ter saído do ninho. Ela conseguiu viajar pelo mundo, aprender de forma empírica e ter as suas próprias ideias. Cruzou os limites do que conhecia, mesmo com o risco de dar errado. Afinal, como Godwin antecipa nos primeiros minutos de filme, este é o único jeito de viver.