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Michês: Anulando a sexualidade por dinheiro

Ser tratado como “coisa” não é problema para quem trabalha com sexo, ou pelo menos não deve ser

  • D
  • Da Redação

Publicado em 29 de abril de 2014 às 08:50

 - Atualizado há 2 anos

Uma tarde no shopping mudou a vida de Ramon Menezes. O analista de sistemas, que à época tinha 20 anos, passeava, quando percebeu que era observado por uma mulher mais velha. Ele se aproximou e começaram uma conversa que o levou ao quarto de um hotel, no centro de Salvador. O encontro terminou de um jeito inédito. Apesar de não ter tido essa intenção, Ramon saiu dali com R$ 100. “Era para tomar cerveja com meus amigos”, diz sobre o “agrado” recebido. Aquelas cédulas abriram caminho para outras, e pelo mesmo motivo.                  

“Eu fiquei curioso. Queria saber como era receber em troca de sexo”, conta Ramon que hoje anuncia no site Elite Boys e há oito anos se divide entre um emprego “formal” e a informalidade da prestação de serviços sexuais remunerados que lhe rende, no mínimo, R$ 250 por hora.

Fabrício – que usa este “nome de guerra”, mas não tem um sobrenome – foi apresentado ao mundo da prostituição aos 22 anos. O incentivo veio da própria namorada, que também era garota de programa e viu que ele tinha potencial. Hoje ele é o único anunciante do site Garota de Elite.  Antes da prostituição, ele ganhava R$ 3 mil na empresa onde trabalhava. Na primeira semana, após fazer fotos sensuais, a conta dele engordou: ganhara R$ 4 mil com programas que custam R$300, mas são “negociáveis”. “Meu telefone tocava demais. Saí do emprego para me dedicar só à vida de GP [sigla para garoto de programa]”, relembra Fabrício, que trabalha no ramo há mais de um ano e diz não recusar uma saída por R$ 50 a menos do que o preço pedido.

Vagnner Alexandre, 24 anos, foi seduzido pela mesma tentação financeira da vida de michê que atraiu Ramon e Fabrício. Nascido em família pobre, no Recôncavo baiano e criado em Salvador, ele viu na prostituição um meio de subir na vida. O ex-estudante de Direito, que hoje mora na Itália, abandonou tudo o que tinha para buscar a independência fora do país.

“Ganhava pouco e trabalhava muito no Brasil. Queria me formar e não tinha como renovar a matrícula da faculdade, pois faltava dinheiro. Aqui, no mês, eu ganho de R$ 18 a R$ 30 mil. Não queria ter o mesmo futuro que a minha família”, desabafa.

Gay por dinheiroAo colocar o primeiro anúncio no jornal, Ramon não sabia, mas estava prestes a ter a primeira relação homossexual. “Tive dificuldade de ereção, mas depois eu me soltei”, conta. Mas ele não topa tudo por dinheiro, não. “Não sou passivo, não faço sexo oral em homens, mas beijo. Não sou mecânico”, defende-se.

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Reafirmar a posição de heterossexual, segundo Murilo Arruda, doutorando em Ciências Sociais pela Universidade Federal da Bahia (Ufba), pode ser uma jogada. “Eles colocam nos perfis: 'hétero’. Acaba sendo um atrativo para ele”, interpreta.

Há três anos no ramo, Alexandre não acha seu trabalho natural. “Sei que é uma mancha na minha trajetória, mas vou apagar com o sucesso”, aposta. A naturalidade de Ramon com os clientes também não é regra na prostituição. “Não beijo e não abraço. Eles pagam quase que por um pênis de plástico”, ironiza Alexandre.

Homem-ObjetoCom problemas de relacionamento com outras pessoas e dúvidas sobre a sua sexualidade, Paulo*, que trabalha como autônomo, teve sua primeira relação sexual aos 30 anos, com uma garota de programa. Hoje, aos 34, soma apenas três envolvimentos nessas três décadas vívidas e todos comprados com dinheiro. “Contratei por necessidade. Tenho medo de paquerar, então me sinto seguro quando pago. Assim eu não acho que vou ser morto”, conta o rapaz que teve as suas outras duas relações com homens e assumiu a homossexualidade.

Depois do prazer, a frustração. “Você fica apressado por conta da hora. Uma vez eu esqueci e o GP levou R$ 700. Quanto termina, você pensa: 'Tive que pagar para transar com alguém bonito'. É triste”,confessa Paulo, que passou da hora e gastou muito além dos R$ 250 que havia programada para o período de uma hora que iria usar na tentativa de unir o “útil” ao “agradável” na procura por corpos perfeitos. 

Ser tratado como “coisa” não é problema para quem trabalha com sexo, ou pelo menos não deve ser. Para entrar na profissão, além de músculos e da lábia para conquistar o cliente, é preciso preparo psicológico. “Estamos quase em uma vitrine. Eu me considero objeto e isso não preocupa. Estou lá para quem pode pagar”, define Ramon.

Menos experiente, Fabrício ainda se assusta com alguns atendimentos. “Hoje eu saí com um cara muito gordo, que usava calcinha fio dental e cheirava cocaína. De vez em quando aparecem uns tipos exóticos”, conta.

A carreira de garoto de programa tem vida curta. O envelhecimento do corpo acende o sinal vermelho sobre a hora de parar. Ramon, Fabrício e Alexandre sabem que quando o vigor muscular e sexual diminuírem, seus clientes vão procurar outros mais jovens. Por isso, os três fazem planos: querem ter uma família e levar uma vida confortável. Ramon, por medo do futuro, mantém o emprego formal, como ele mesmo chama. Fabrício e Alexandre juntam o dinheiro que conseguem com a prostituição, mas não pagam um fundo de garantia. Questionados sobre o futuro, todos ficaram reticentes. O que nenhum deles hesitou em dizer foi que o celibato está fora dos planos.