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Sora Maia
Publicado em 18 de janeiro de 2025 às 02:00
Mais “enfetchado” que jegue na lavagem do Bonfim. Se para você essa frase não tem nenhum sentido é provável que sua relação com a festa seja recente. Até 2010, carroças puxadas por jegues ornamentados eram uma das tradições mais identificadoras da parte profana do cortejo que liga a Basílica da Conceição da Praia à Igreja do Bonfim. >
Dócil e forte, o jumento nunca foi o grande malandro da praça. Historicamente carregou muita pedra e pau, inclusive a madeira que chegava de navio no Porto da Lenha, logo atrás da Igreja do Bonfim, aquela onde hoje se come feijoada e leva aos barcos que fazem a travessia de volta com mais festa e folia. >
Uma das hipóteses para a introdução do animal no cortejo e o costume posterior de enfeitá-lo atrelado a carroças vistosas foi o aumento do percurso, quando os populares se espalharam para além do entorno da Colina Sagrada e atingiu o quilômetro e pouco que a separa do Largo de Roma, atual Irmã Dulce. >
O crescimento exponencial da participação popular duplicou a extensão da festa que passou a sair do Largo dos Mares, até chegar aos atuais 6.878 metros em linha reta da Conceição da Praia até a Igreja do Bonfim. >
O século XX sedimentou a imagem romântica das carroças enfeitadas, com famílias e grupos de amigos pairando sobre os devotos que até hoje vão a pé. >
Os entusiastas afirmavam um amor controverso aos animais que ao levarem o peso de tanto sacolejo, também recebiam nomes cheios de dengo como morena, carinhoso, demolidor, pagode, catarina. Na contramão, o jumento tb distinguia seu dono, como o popular Bira do Jegue, figura folclórica nas festas, sempre caracterizado de Chaplin no lombo do seu jeguinho. >
Os anos 2000 chegaram descortinando esse amor abusivo. Roberto Carlos desde 1981 clamando pelas baleias e nós ignorando que o jumento é nosso irmão, como Gonzagão já espalhava há mais de 50 anos. >
A partir de 2008 e depois de muita pendenga, as ONGs Terra Verde Viva, Animal Viva e Célula Mãe entraram junto ao Ministério Público com o pedido de retirada dos animais do circuito. A primeira decisão foi favorável à permanência dos animais, com a exigência de uma fiscalização mais rigorosa dos órgãos públicos. >
Em 2011, contrariando donos de jegues, proprietários de carroças, artistas (só Luiz Caldas se pronunciou a favor da retirada dos animais do circuito), devotos e até o pároco da Igreja do Bonfim à época, as Ongs com o apoio da OAB conseguiram uma liminar que proibiu a presença do bichinho e estabeleceu multa para quem a contrariasse >
No ano seguinte outra liminar foi concedida barrando a presença dos equinos, sob o argumento que “Não pode haver cultura ou tradição sobre a crueldade e a ilegalidade”.>