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Gil Santos
Publicado em 6 de setembro de 2024 às 05:00
Toda quinta-feira, o ostensório da Paróquia Nossa Senhora da Conceição, no Tororó, deixa o armário e é carregado pelo padre do altar até a porta do templo. No catolicismo, a peça serve para expor a hóstia consagrada, sendo usada em momentos de adoração, bênção do Santíssimo Sacramento e procissões de Corpus Christi. Ela é tão especial que é apresentada ao público apenas uma vez por semana. Essa foi uma das obras furtadas por bandidos, na madrugada de quarta-feira (4). >
O ostensório é banhado a ouro e estava guardando com outros objetos de valor, como quatro castiçais também banhados a ouro, dois cálices de prata e mais dois de ouro. Todos foram furtados. Os bandidos levaram cinco microfones, uma mesa de som com oito saídas e um aparelho de som. Antes de fugir, eles carregaram ainda um ventilador e deixaram outro cair na porta da igreja. >
Por volta das 16h, Letícia Coelho, 62 anos, foi abrir a igreja para preparar o espaço para a única missa do dia, às 17h, e levou um susto. Ela é católica, mora há 40 anos ao lado do templo e faz um trabalho voluntário de cuidar do local. A porta da frente estava encostada e, no interior, havia objetos revirados pelo chão. >
"Eu acredito que foi mais de uma pessoa, porque eles levaram muita coisa. Não teria como uma pessoa levar tudo sozinha e eles devem ter tido ajuda de um carro ou algo assim. Não sabemos se eles invadiram durante a madrugada ou se entraram durante a última missa, se esconderam no mezanino e esperaram a gente ir embora para agir", disse. >
Ela contou que o aparelho de som que os bandidos levaram era antigo e que o maior prejuízo foi o furto do ostensório. A peça era banhada a ouro e, no mercado formal, pode custar mais de R$ 10 mil, mas Letícia frisou que o principal prejuízo é simbólico. O ostensório tinha 52 anos no templo e é tão importante em uma igreja que o padre sequer pode tocar com as mãos. Na igreja do Tororó é usada uma capa específica, com luvas, para evitar o contato da pele com o objeto. >
O padre responsável pela paróquia João Eduardo Paiva assumiu o cargo há seis meses. Por conta dos furtos do ostensório e dos cálices, as missas foram suspensas por tempo indeterminado. >
"Não acredito que esse crime foi cometido por usuários de drogas, porque essas pessoas levam todos os objetos de valor que veem pela frente. Quem cometeu esse crime escolheu o que levar. Somos uma paróquia carente, então, a gente fica triste com essa situação", disse o padre. >
Depois do furto, as portas receberam uma nova trinca e bancos foram colocados para bloquear o acesso. A suspeita é de que os bandidos não chegaram ao salão Irmã Dulce, espaço de eventos e onde fica um microondas e outros objetos de valor. Já o mezanino, onde os criminosos podem ter se escondido, está ocupado com materiais diversos. >
Essa foi a segunda vez que a Paróquia Nossa Senhora da Conceição foi alvo de furto. A primeira tem mais de dez anos. Nesta quarta-feira, os moradores não ouviram os criminosos, mas uma câmera de segurança registrou um homem caminhando na lateral do templo, por volta das 1h30. A Polícia Civil informou que o crime foi registrado na 1ª Delegacia Territorial (DT/Barris) e que o caso está sendo investigado. >
Ataques >
Um ano e dois meses depois de ser roubada, a imagem de Nossa Senhora do Rosário dos Quinze Mistérios, que ficava na Igreja do Santo Antônio Além do Carmo, segue desaparecida. O padre responsável pelo templo Jailson de Jesus conta que prestou depoimento duas vezes, mas que as investigações não avançaram. Ele contou que tem adotado medidas para proteger as obras históricas. >
"Colocamos câmeras, aumentamos o número de cadeados e o acesso a igreja é controlado. Não houve arrombamento, por isso, a gente acredita que a imagem foi levada por alguém que tinha acesso à igreja, mas nenhum funcionário foi ouvido pela polícia. É uma imagem importante, do século XVIII, e que ficava no altar mor", contou o padre. >
A suspeita é de que a peça foi furtada entre a internação e a morte do frei Ronaldo Marques Magalhães, antigo padre do templo, em julho de 2023. O caso foi denunciado ao Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), à Polícia Federal e encaminhado para a Polícia Civil. >
O furto a templos religiosos é um crime recorrente na Bahia, independentemente da religião. No começo da semana, uma igreja evangélica foi invadida e teve equipamentos eletrônicos roubados, em Teixeira de Freitas, no Extremo-Sul da Bahia. O bandido levou uma televisão, duas caixas de som, notebook, guitarra, violão e teclado. Um suspeito foi preso e material foi recuperado. >
Em dezembro do ano passado, pouco antes do natal, a Casa de Iemanjá, que fica na Colônia dos Pescadores, no Rio Vermelho, foi invadida e furtada. Os bandidos entraram no local pelo telhado e, durante o crime, imagens da orixá acabaram sendo quebradas. Em maio, a Igreja Nossa Senhora da Ajuda, no Centro Histórico de Salvador, foi invadida três vezes no período de duas semanas. >
Procurada, a Polícia Civil informou que o furto da imagem do Santo Antônio Além do Carmo está em investigação e afirma que ouviu outras pessoas, além do padre responsável pela igreja. >
"A 1ª Delegacia Territorial (DT - Barris) prossegue com as investigações no sentido de localizar uma imagem sacra furtada do acervo da Igreja de Santo Antônio Além do Carmo, em meados de julho de 2023. O tempo entre a ação delituosa e o registro do Boletim de Ocorrência na Polícia Civil, realizado apenas em fevereiro de 2024, atrapalharam as investigações, levando-se em consideração que as imagens captadas pelas câmeras de segurança do Centro Histórico ficam armazenadas por um período médio de 30 dias", diz a nota. >