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Donaldson Gomes
Publicado em 20 de agosto de 2023 às 05:00
O Sul da Bahia demorou quase três séculos para descobrir o chocolate. Hoje a região vive o início de um novo ciclo do cacau, finalmente trazendo para a cadeia de produção conceitos como verticalização, inovação e sustentabilidade, não apenas ambiental, mas social e de gestão – pescando propostas da agenda ESG. O uso das amêndoas do cacau para produzir chocolate, até mesmo dentro das fazendas, está se tornando cada vez mais comum na região.
“O verdadeiro chocolate nasce na fazenda”, diz a Mari Paraíso, agrônoma na Agrícola Conduru, base da Dengo Chocolates na Bahia. Mas o que hoje é quase óbvio em Ilhéus e nas cidades vizinhas ficou por muitos anos obscuro no antigo ciclo do cacau. Embora nem sempre a finalização do produto aconteça na propriedade rural, está se fortalecendo a consciência de que o produto é mais saboroso, ambientalmente sustentável e economicamente inclusivo quando as amêndoas do cacau são devidamente tratadas ainda no campo.
Um dos grandes responsáveis por esta virada, por incrível que pareça, é um publicitário, de Guanambi, que chegou à região no auge da crise da vassoura de bruxa, que dizimou 90% da produção baiana do fruto. “A cidade não sabia nada sobre cacau”, lembra Marco Lessa, criador do Chocolat Festival, que chegou em julho à sua 30ª edição como o maior evento da cadeia do chocolate na América Latina.
Marco Lessa
Criador do Chocolat FestivalExiste um abismo cultural, social e econômico tão grande entre o novo ciclo do cacau e o que aconteceu nos últimos três séculos que a turma nova precisou refazer praticamente tudo do zero. Sabe a música Drão, de Gilberto Gil, quando ele compara o amor entre ele e a ex-mulher Sandra Gadelha ("Sandrão", ou apenas "Drão") com um grão que precisa morrer pra germinar? É isto que está acontecendo na região de Ilhéus. Morreu na década de 90 um modelo de produção concentrador e excludente para dar lugar a novos formatos – muitos ainda sendo testados.
Esqueça a imagem dos coronéis em seus grandes latifúndios, nascidos em tempos de escravidão, sucedidos por décadas de servidão, numa estrutura social que se mantinha de pé com a ajuda de jagunços. A reinvenção da cultura do cacau está sendo bancada por netos de quem quebrou na década de 90, mas também por micro, pequenos e médios investidores da região, ou mesmo de fora.
Um exemplo deste perfil é o casal Carlos e Tais Tomich, novos donos da centenária Fazenda Capela Velha. Naturais de Belo Horizonte, chegaram a Ilhéus para administrar o lendário Bataclan, famoso cabaré dos barões do cacau. Após uma ampla reforma, venderam e compraram a fazenda, onde estão há doze anos.
“Os coronéis teriam quebrado mesmo se não houvesse a vassoura de bruxa”, acredita Taís. “Toda cultura agrícola enfrenta pragas, eles quebraram porque queriam continuar produzindo do mesmo modo que há centenas de anos, carregando o cacau no lombo de burro”, completa. Pois bem, inovação é o que não falta na Capela Velha, mas não apenas lá. Os produtores estão testando novas maneiras de produzir e é comum ver aqui ou ali um toque particular que faz toda a diferença no resultado final.
O que segue intocada é a ligação do cacau com a Mata Atlântica, num modelo de produção agroflorestal conhecido como cabruca. Trazido do Norte do Brasil para a Bahia, por ordens da Coroa Portuguesa, em 1746, o cacau encontrou nas sombras das árvores do litoral baiano o ambiente ideal para o seu desenvolvimento. A produção no regime de cabruca faz do Sul da Bahia uma das regiões do Brasil com a maior concentração de Mata Atlântica preservada no país.
“A cabruca não é um sistema de preservação, até porque estamos falando de uma área em que já aconteceu a ação humana”, ressalta o produtor rural da Fazenda Yrerê, Gerson Marques, que é também presidente da Chocosul, uma associação que reúne produtores de chocolate da região. O que o sistema permite é a conservação da área, dando-lhe uma utilidade econômica que estimula os produtores a cuidarem da floresta.
Da semente ao chocolate
A 15 minutos de Ilhéus, a Fazenda Yrerê oferece um passeio pela história. Há quase 300 anos, ali funcionou a sede de uma sesmaria, provavelmente um dos muitos locais na região em que, por ordem da Coroa Portuguesa, foram plantadas mudas de cacau. Numa das trilhas disponíveis para os visitantes, é possível conhecer o cacaueiro que é apresentado como o mais antigo da região, com os seus 130 anos. Próximas a ele, árvores mais recentes marcam a renovação em uma propriedade que estava abandonada há apenas 26 anos era uma das muitas flageladas pela vassoura de bruxa.
Talvez a Trilha do Saci, na Yrerê, seja o maior símbolo do que está acontecendo lá e em muitas outras propriedades na região Sul da Bahia. Por mais difícil que seja de acreditar, o caminho cercado por árvores frondosas, marcado pelo som dos pássaros, e outros bichos se movendo no chão e nas árvores, além daquele cheiro de terra molhada – típico da Mata Atlântica, conhecida como uma floresta hidrófila –, era um pasto há 25 anos. “Tudo que a natureza precisa é de tempo e espaço para se recuperar”, diz Gerson Marques, sócio da propriedade.
Na centenária sede da fazenda, a responsável pela recepção é Dadá Galdino, sócia e ex-mulher de Gerson. Com ela, os cinco cães festivos: Fubá, Paçoca, Amora, Jujuba e Farofa, além da gatinha Mel. “Fomos os primeiros a abrir para o turismo rural aqui na região”, lembra. As primeiras trilhas começaram a acontecer há 12 anos. “O foco era a agricultura familiar, eu comprei para viver”, diz. Na época, nenhum dos 100 hectares produzia cacau. O fruto estava lá, mas ninguém se interessava em tirá-lo do pé.
Do cacau ao chocolate
"Plantar cacau não era rentável na época", conta Dadá. Para a conta fechar, o turismo de visitação à Mata Atlântica surgiu como alternativa e foi se transformando em algo mais específico à medida em que a produção foi sendo retomada em um novo formato. “Passamos a oferecer um roteiro para apresentar a cultura do cacau, mas faltava o chocolate”, lembra, sorridente.
Ela contabiliza atualmente 40 hectares produzindo o fruto, que é totalmente aproveitado na Yrerê até a secagem da amêndoa, um protótipo de chocolate 100% cacau, que é enviada a uma fábrica modelo no Centro de Inovação do Cacau (CIC) apenas para a etapa final de produção. Por enquanto, uma vez que o projeto de Dadá e Gerson para fabricar o produto na própria fazenda já está bastante adiantado, numa das antigas barcaças usadas para secagem das sementes.
Turismo sensorial
Atualmente, a Fazenda Yrerê recebe por ano mais de 4 mil visitantes. Em sua maioria, são famílias, que receberam a indicação de quem já esteve lá e quer mergulhar no mundo do cacau, explica Gerson Marques. Na caminhada pela mata, ele explica o significado da palavra “cabruca”, tão presente e característica na produção do chocolate genuinamente baiano. “Os coronéis mandavam que pessoas na condição de escravizadas penetrassem na floresta para ‘cabrucar’, que era o ato de colher produtos silvestres”, conta.
Segundo Marques, que é presidente de uma associação que representa os produtores locais, a Chocosul, tanto na Yrerê, quanto em outras fazendas do Sul, há uma preocupação em trazer para quem visita o contexto histórico.
Natural da Amazônia, o cacau chegou ao Sul da Bahia por ordem da Coroa Portuguesa, no início do Século XVIII. Inicialmente, a percepção foi que a cultura não prosperou, porém anos depois foi se tornando cada vez mais frequente a presença da árvore embrenhada na Mata Atlântica, espalhada, principalmente pela ação do jupará, uma espécie de macaco que experimentou o doce do fruto e não vive mais sem ele, e da formiga caçareira, caracterizada por seus gigantescos formigueiros montados no alto de árvores.
“Reinvenção” é a palavra escolhida pelo produtor para descrever o processo em curso no Sul. A turma copia a ideia do ‘bean-to-bar', um processo que surgiu na Califórnia, de fazer o chocolate apenas com a amêndoa do cacau e açúcar, sem separar a manteiga – uma pasta branca com o cheiro característico – do líquor, o que dá a coloração escura ao chocolate. Ah, nada de aditivos artificiais! Leite? Em alguns casos, sim, mas há quem torça o bico para ele, que jamais é aceito como o principal ingrediente da barra.
Para o chocolate ser gostoso assim, só se for muito bem-feito, reconhece Marques, respeitando uma série de processos, que muitas vezes acabam atropelados na grande indústria. O passo a passo é simples, porém trabalhoso. A fruta deve ser retirada da árvore madura, mas deixada no chão por quatro dias para um processo de fermentação anaeróbica – sem oxigênio. Depois, as amêndoas são retiradas para fermentar por mais ou menos o mesmo tempo (cada produtor tem a sua contagem própria...). Por fim, o produto é secado, tradicionalmente nas barcaças, mas há quem utilize estufas e até geringonças especialmente criadas para dar conta do processo nos dias sem sol.
A partir daí, o processo pode acontecer na própria fazenda, se ela possuir uma estrutura de produção do chocolate, ou numa fábrica externa. No primeiro caso, temos o chocolate tree-to-bar (da árvore à barra), enquanto o segundo é o tal do bean-to-bar. Nos dois casos, o produtor deixa de entregar uma commoditie e passa a oferecer ao mercado um produto de alto valor agregado. A simples semente produzida seguindo a receita acima chega a valer quase três vezes mais que o produto comum.
Taís Tomich, proprietária da Capela Velha, junto com o marido Carlos, explica que a fazenda produz dois tipos de cacau, o comum, direcionado para a indústria, e o fino, cuja produção é 100% dedicada à fabricação do chocolate, o sugestivo Do Cacao. Há 12 anos à frente do negócio, Carlos e Taís implementaram uma série de inovações de processos para otimizar os ganhos e viabilizar a operação. A fazenda de 142 hectares está ocupada por 80 há de lavoura, sendo que 60% da área produz apenas cacau fino.
“Nós começamos a fazer o chocolate para mostrar o efeito do nosso processo de fermentação”, conta Taís. O marido dela desenvolveu um método que permite atingir 100% de fermentação das amêndoas, algo até então raro neste negócio. A fábrica, que ficou pronta na pandemia, produz apenas o suficiente para atender à demanda dos visitantes da Capela Velha e do comércio local. “Ainda não conseguimos mandar para fora e temos a determinação de usar apenas o nosso próprio cacau porque temos o controle de qualidade dele”, explica.
Novos tempos
No km 26 da rodovia que liga Ilhéus a Uruçuca está a entrada de um projeto que é visto como um dos grandes sinais dos novos tempos na terra do cacau. Da estrada asfaltada até a sede da Agrícola Conduru, são 6 km de um caminho de terra, sinuoso e esburacado, que obriga o veículo a andar devagar. “Quando passarmos pela porteira da ‘Dengolândia’, até a estrada melhora”, brinca um dos passageiros que já esteve antes no local. A expressão dele indica que a comitiva está a caminho da “Disney dos chocolates”.
A fazenda é a base de um negócio de impacto social liderado por Guilherme Leal, fundador da Natura, adquirida em 2011. Além de produzir cacau com o mais elevado padrão de qualidade, a Dengo, que surge em 2017, ainda se dispõe a comprar o produto de outros agricultores, pagando prêmios de até 240% no valor da arroba. Tudo lá tem uma simbologia. Conduru é uma madeira que dá nome ao parque estadual que abraça os municípios de Ilhéus, Uruçuca e Itacaré. Era muito usada na fabricação de veleiros, explica Mari Paraíso. “Queremos criar um modelo de produção propagável de cacau de qualidade que estimule as pessoas a deixarem de entregar o fruto do seu trabalho como simples commodities”, diz.
Hoje a Dengo já compra o cacau da fazenda própria e de mais 180 outros produtores brasileiros, muitos do Sul da Bahia. Além disso, as lojas da marca ainda abrem espaço para outros produtos bean-to-bar. Mas o processo de valorização da cultura do cacau passa pelo estímulo a um uso maior do produto. “Quando se pensa no fruto apenas para a produção de chocolate, é como se alguém pegasse uma maça e utilizasse apenas as suas sementes, jogando todo o restante fora”, compara Mari.
Produtos como o mel do cacau – na verdade um néctar que escorre da polpa –, melaço, geleia, chás com a casca da semente e mesmo a casca do fruto para a suplementação humana estão entre os possíveis exemplos de uso. Existem produtores trabalhando na pasteurização do mel, que tem vida útil curta em seu estado natural e precisa ser mantido congelado. Com a pasteurização, o produto pode ser preservado por até 120 dias.
Caminhando pela cabruca, é fácil notar que a vassoura de bruxa ainda é frequentemente encontrada nos cacaueiros. Hoje quem ainda está no mercado aprendeu a conviver com a praga. Em 1989, quando chegou com toda a força, não se sabia como lidar com o problema, que leva ao apodrecimento dos frutos infectados. Além da praga, a região Sul da Bahia enfrentou um período de crise hídrica e o aumento da concorrência africana no mercado.
Muitos produtores deixaram o mercado, outros reduziram a produção. Há registros de propriedades em que houve quedas de até 90% no volume de cacau. Os problemas no campo se refletiram em uma crise social que ainda hoje pode ser vista em alguns municípios da região. Por outro lado, nas lavouras começaram a surgir novas variedades de cacau, resistentes à vassoura de bruxa.
A vontade de fazer diferente, de melhorar, se tornou uma busca contante para quem vive da cacauicultura. Por este motivo, entre produtores rurais e fabricantes de chocolate, a sigla CIC ganhou lugar especial na dinâmica econômica da região. Partem do Centro de Inovação do Cacau diretrizes para adequação da produção brasileira aos mais elevados padrões de qualidade mundial.
Além de atuar como um serviço de inteligência voltado para o cacau e seus derivados, o CIC criou uma pequena fábrica onde produtores têm a possibilidade de transformar as próprias sementes em chocolate, desde que estejam dentro dos padrões de qualidade local. A estrutura produz cerca de 50 quilos do produto por dia.
No centro de inovação são feitos laudos de qualidade, avaliação do nível de umidade, fermentação das sementes e classificação do produto. “Estamos dando sustentação para um mercado que demanda um cacau com qualidade superior ao comum”, explica Cristiano Santana, que coordena o laboratório de qualidade do CIC. Quando um produto recebe o selo de qualidade de lá, o produtor tem a certeza de que vai conseguir vender o seu produto com um prêmio.
Com o aumento de demanda, o CIC desenvolveu a primeira máquina de classificação automática de cacau no mundo. A estrutura física é a mesma de equipamentos usados para soja e milho, entretanto, os pesquisadores desenvolveram um software que faz em três segundos uma análise que durava entre 40 e 50 minutos, quando realizada manualmente.
O próximo passo do CIC é a criação de um padrão de identificação do cacau produzido no Sul da Bahia. Apenas produtos com, no máximo, 3% de defeitos serão elegíveis. “O CIC foca em qualidade para promover um salto. Hoje já se paga bem pelo cacau produzido aqui, que antes era visto como um produto ruim”, conta Adriana Reis, coordenadora do laboratório de análise sensorial do CIC. Ela lembra que o centro nasceu para atender 10 produtores, mas hoje já são 1,5 mil. “Ainda atendemos um universo pequeno porque existem cerca de 60 mil”, analisa.
A campanha para modificar a imagem do cacau brasileiro é árdua e passa por algumas regras bastante rígidas. O Brasil é um dos poucos mercados que ainda tolera cheiro de fumaça no cacau, exemplifica Adriana Reis. Mas não nos produtos certificados pelo CIC. Por muito tempo, quando o cacau era colocado para secar em períodos chuvosos, produtores usavam lenha para fornecer o calor necessário à secagem.
“Pegou fumaça, não entra aqui. O Brasil é o único país que tem percentual de tolerância à fumaça”, lamenta a pesquisadora. Mas, então, o que acontece com o produto enfumaçado? “Vai para a grande indústria e recebe uma série de aditivos para perder o cheiro”, diz.
De ‘Renascer’ para um novo florescer do cacau
Quando o publicitário Marco Lessa foi convidado para buscar locações e figurantes da novela Renascer, de 1993, acabou descobrindo uma região “encantadora, cheia de riquezas, mas muito pobre”. E este não foi o único paradoxo. “A terra do cacau não conhecia o chocolate”, diz ele, que alguns anos depois se tornaria o criador do Chocolat Festival – evento que é apontado como um impulsionador no processo de retomada da cultura do cacau no Sul baiano.
“Sinceramente, eu acho que essa retomada iria acontecer mais cedo ou mais tarde, porque tinha muita gente pesquisando, buscando alternativas. O máximo que eu aceito é você dizer que nós contribuímos para acontecer mais cedo”, aponta Lessa, sócio da MVU, responsável pelo festival, e da marca de chocolates Chor – nascida depois, para que ele pudesse “sentir as dores de quem faz o chocolate”, como faz questão de dizer.
Marco Lessa conta que sempre passava pelo parque moageiro, que reúne as três grandes empresas responsáveis pela produção da manteiga de cacau e do líquor para a grande indústria, enviando o produto para todo o mundo a partir de Ilhéus, fazia para si próprio a mesma pergunta: “por que essa produção não é verticalizada”.
Foi dessa inquietude que surgiu o Chocolat Festival, que completou em julho a sua 30ª edição, reunindo em Ilhéus desde pequenos produtores a grandes marcas, representantes setoriais, de governo e até o público final. “É um festival de cacau bem tropicalista mesmo”, ri Lessa, quando questionado sobre essa mistura, que resultou no maior evento de cacau da América Latina, que tem entre alguns dos seus feitos, ter ajudado a levar o cacau baiano para o Salão do Chocolate de Paris, maior evento mundial do tipo.
O produtor de cacau Guilherme Moura, que é também vice-presidente administrativo e financeiro da Federação da Agricultura da Bahia, acredita que a Bahia possui condições únicas para a produção de cacau e chocolate. “Temos uma grande região produtora de cacau, proximidade com empresas e uma estrutura de fomento, através do Sistema S”, enumera.
Guilherme acredita que, mesmo sem causar o mesmo impacto econômico do passado, o fortalecimento da produção da planta até a finalização da barra é importante para o reposicionamento da cacauicultura no Sul da Bahia. “O produtor de cacau não tinha conexão com o chocolate”, conta.
O mais importante deste movimento é que os produtores estão percebendo que qualidade ajuda a melhorar os preços, avalia Claudiana Figueiredo, coordenadora regional do Sebrae-Ba, em Ilhéus. “Nós temos um produto que é sustentável na mais completa extensão desta palavra”, diz. Ela conta que o Sebrae está ajudando os produtores no processo de identificação geográfica dos produtos. “Nós trabalhamos para que a marca Cacau da Bahia ganhe o mundo”, afirma.
Para Jaime Recena, presidente executivo da Associação Brasileira da Indústria de Chocolates, Amendoim e Balas (Abicab), os produtos com designação de origem ainda têm bastante espaço para crescer. Segundo ele, os chocolates feitos nas fazendas respondem por 0,01% do mercado nacional atualmente. “Nos Estados Unidos, estes produtos representam 4% do mercado, o que nos indica que há bastante espaço para crescer”, ressalta. Segundo ele, a grande indústria olha para este mercado com bastante atenção.
O cacau tem uma característica peculiar: o fruto não cai do pé – mesmo quando adoece, apodrece ou já está morto há muito tempo. Se não for derrubado, segue lá, agonizando aos olhos de todos, inútil. Só quando morre, dá vida ao chocolate. Assim como o grão, da música de Gil.
Uma história deliciosa
1750 A. C.
Há indícios do consumo de chocolate por parte da civilização Olmeca, em 1750 antes de Cristo. Estudos indicaram a presença de cacau fermentado em potes de cerâmica encontrados em Vera Cruz, no México.
Século XIII
Os maias desenvolvem o costume de beber as sementes do cacau torradas e misturadas com milho e pimenta em ocasiões especiais. Há registros do cacau pintado em templos e artefatos maias. Em muitas ocasiões, reis foram retratados bebendo o chocolate.
Século XV
Os astecas dominam os maias e assimilam o hábito de ingerir o chocolate, visto como uma bebida dos deuses e destinada aos nobres, sacerdotes e guerreiros. O cacau é visto como um símbolo de vida e se torna tão valorizado que passa a usado como moeda.
1519
Quando o espanhol Fernando Cortez aporta no continente americano em busca de metais preciosos, percebe que o cacau poderia ser quase tão valioso quanto ouro. Ele ordena que sejam realizadas novas plantações do fruto.
1521
O primeiro navio carregado com cacau chega à Europa.
1527
Cortez leva à Europa a primeira receita do chocolate quente, já com a adição de açúcar. Posteriormente, baunilha e canela também passam a ser utilizados.
1615
O Rei Luiz XIII define o chocolate como a bebida da corte francesa.
1659
David Chaillo abre a primeira chocolateria de Paris. Já havia registros de casas do tipo na Inglaterra, como uma alternativa ao café.
Século XVIII
Com a Revolução Industrial, o chocolate vai deixando de ser feito de acordo com as tradições maias e sendo adaptado aos processos fabris disponíveis na época. Um francês chamado Doret cria a primeira máquina para esmagar as sementes do cacau. Posteriormente, um contemporâneo dele, Dubuisson, cria um moinho de chocolate à vapor, permitindo, pela primeira vez, a produção de grandes quantidades.
1746
Por ordens da Coroa Portuguesa, Antônio Dias Ribeiro introduz o cultivo de cacau na Bahia, na Fazenda Cubículo, atual município de Canavieiras.
1820
O cacau começa a ser cultivado em Ilhéus no sistema de cabruca – com os cacaueiros plantados sob a sombra da Mata Atlântica. Hoje, o método é usado por 70% dos 45 mil produtores baianos.
1829
O holandes Van Houten cria uma máquina que permite separar a manteiga e o pó do cacau.
1847
A fábrica inglesa Fry Company produz a primeira barra de chocolate do mundo.
1860
Bahia realiza a sua primeira operação de exportação de cacau, pelo Porto de Salvador, enviando uma carga de 67 toneladas para os Estados Unidos.
1876
Depois de oito anos, tentando adicionar leite ao chocolate, o suíço Daniel Peter pede a ajuda do farmacêutico Henry Nestlé, que tem a ideia de misturar o chocolate com o leite condensado. Nasce o primeiro chocolate ao leite.
1891
Imigrantes alemães fundam a Neugebauer, primeira fábrica brasileira de chocolates.
1914
Brasil se torna maior exportador de cacau do mundo.
1937
O chocolate passa a fazer parte da alimentação oferecida para soldados.
1970
Produtores do Oeste do Pará começam a desenvolver técnicas e culturas de cacau para produzir chocolates finos.
1989
Primeiros registros de presença da vassoura de bruxa na Bahia. Produtividade cai rapidamente.
Década de 2010
Técnicas de manejo e novas variedades passam a ser introduzidas nas fazendas baianas.