A Banda estreita da Bahia

Por Gesil Sampaio Amarante Segundo*

  • D
  • Da Redação

Publicado em 16 de julho de 2018 às 10:28

- Atualizado há um ano

. Crédito: .

Não há como minimizar a importância da conectividade digital para o bom funcionamento de diversos serviços públicos, em particular para a educação e a pesquisa científica, mas também para a saúde, a segurança e todas as outras atividades típicas do estado. A própria gestão de processos administrativos de todas as áreas, inclusive a Justiça, depende fortemente ou, ao menos, pode beneficiar-se muito da existência de uma infraestrutura de comunicações robusta e eficaz, isso para citar apenas a esfera pública, sendo inegável a importância desta infraestrutura para a atração, criação e manutenção de empresas competitivas no território.

A Bahia é o estado com maior território, maior população e maior economia do Nordeste, e um dos mais mal servidos em infraestrutura de conexão em banda larga da região.

Salvador foi pioneira nacional, há aproximadamente dez anos, na criação de uma rede comunitária baseada em fibra óptica, a ReMeSSA, iniciativa da UFBA apoiada pela Rede Nacional de Ensino e Pesquisa (RNP, ligada ao Ministério de Ciência, Tecnologia, Inovação e Comunicações). No interior, o acesso dos serviços públicos à banda larga depende essencialmente das teles, que notoriamente cobram os olhos da cara, aproveitando a ausência de alternativas.

Como exemplo, a Universidade Estadual de Santa Cruz (UESC, situada entre Ilhéus e Itabuna) tem licitado serviço transporte de dados a 200 Mbps junto à Oi, pelo que paga a quantia aproximada de R$ 700 mil anuais, preço absurdo em outras regiões do país, por uma banda absolutamente insuficiente para as necessidades de uma universidade do porte da UESC. Outras instâncias da administração estadual no interior passam pela mesma limitação.

Outros estados da região têm atacado esta questão há mais tempo e colhem seus frutos. O Cinturão Digital do Ceará, iniciado há sete anos, cobre 90% dos municípios daquele estado, com 3.500 km de fibra óptica, devendo chegar à totalidade dos municípios em 2019. O CDC foi custeado predominantemente com recursos do Tesouro Estadual, mas também contou com aportes de emendas da bancada federal do Ceará, que já tem 138 escolas conectadas a 60 Mbps (compare com os 2Mbps oferecidos pela Oi). O investimento de R$ 78 milhões se pagou de diversas formas, seja nos custos dos serviços públicos prestados, na dinamização da economia e na própria arrecadação mais eficiente. Sim, a Secretaria da Fazenda do Ceará é uma das beneficiárias diretas do Cinturão. Na Bahia, a secretaria equivalente vem continuamente asfixiando a área de ciência e tecnologia. 

Pernambuco lançou a Rede Pernambucana de Pesquisa e Educação (RePEPE), com 1.175 km de fibra óptica (percorrendo 10 das 12 regiões de desenvolvimento do Estado) para atender os municípios do interior a velocidades entre 1 a 10 Gigabytes. Há outras histórias interessantes em estados igualmente carentes de infraestrutura no Norte e no Nordeste. Um dos estados de menor expressão na economia regional, o Piauí lança o programa Piauí Conectado, baseado em uma parceria público-privada que instalará uma rede de 5.000 km  de fibras ópticas, num investimento de 1 bilhão de Reais (!).

A Bahia recebeu, no final de 2016, proposta da RNP de participação em acordo por ela firmado com a CHESF (Companhia Hidrelétrica do São Francisco) que envolve a atualização dos equipamentos da rede desta última em troca da permissão de uso dos 3.000 km da rede que passa por 24 pontos de presença (POPs) no nosso estado. Esta infraestrutura vai de Salvador até Teixeira de Freitas, no Extremo Sul, até Paulo Afonso e Juazeiro, no Norte ,e até Barreiras no Oeste.

Por volta de 6 milhões de habitantes estão a uma distância máxima de 50 km dos PoPs (10 milhões a 100 km) e podem ser beneficiados por esta rede que atingiria 100 Gbps, podendo aumentar posteriormente. O investimento total da administração estadual seria de aproximadamente R$ 20 milhões (menos de 1 milhão por PoP) e o custo no rateio da manutenção de aproximadamente R$ 1 milhão por ano.

Muito pouco comparado ao que outros estados têm investido e com retorno em termos de diminuição de custos do próprio estado em, no máximo, dois anos. Com acesso a esta rede, cuja fibra já está instalada, só dependendo da instalação dos equipamentos novos, seria possível estabelecer parcerias com os provedores locais (sem a dependência das grandes teles), rapidamente beneficiando aproximadamente 10 milhões de baianos, 80% no interior.

A alternativa de criação de uma estrutura paralela a esta consumiria várias centenas de milhões de reais e demoraria anos.

Por alguma razão, apesar dos esforços da Secretaria de Ciência, Tecnologia e Inovação (SECTI), e apesar do tema conectividade já ter sido objeto de apelo à administração estadual em mais de uma oportunidade no ano de 2017 por lideranças do Sul da Bahia, citando explicitamente esta oportunidade, até agora nada foi firmado. E a Bahia vai ficando para trás.

* É  Professor Titular  ​do​ ​ ​ Departamento de Ciências Exatas e Tecnológicas (DCET) da  Universidade Estadual de Santa Cruz.  [email protected]