AmarElo resgata personagens que o Brasil fez questão de omitir da sua história

Documentário é publicado na NetFlix nesta terça (8); CORREIO assistiu de forma antecipada

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  • Da Redação

Publicado em 8 de dezembro de 2020 às 06:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: Foto: Jef Delgado

Uma história muito bem contada e que vale a pena assistir. A Netflix lança nesta terça-feira (8) o documentário AmarElo: É Tudo pra Ontem, que será disponibilizado em 190 países.  A obra dirigida por Fred Ouro Preto tem o show de Emicida no Theatro Municipal, em 2019, como espinha dorsal e explora a produção do projeto de estúdio AmarElo - último disco do rapper - ao mesmo tempo em que conta a história da cultura negra brasileira nos últimos 100 anos. 

No trabalho, estabelece-se um elo importante entre três momentos relevantes da história negra brasileira: a Semana de Arte Moderna de 1922; o ato de fundação do Movimento Negro Unificado (MNU), em 1978, pela valorização da cultura e de direitos do povo negro; e o emblemático espetáculo de estreia de AmarElo, que aconteceu no mês da consciência negra, em novembro, no imponente teatro paulista.

O CORREIO teve acesso ao documentário antes do lançamento oficial e as impressões que ficaram são muito positivas. O projeto vai muito além de um registro de bastidores e dá a oportunidade de conhecer a história de verdadeiros heróis do movimento negro do Brail - esquecidos por apagamento histórico ou por um desinteresse, um dos aspectos questionados dentro do filme.

Nomes como o de Tebas, um negro escravizado que é responsável por marcos importantíssimos da arquitetura de São Paulo até os dias atuais. Ele e outras figuras ganham a oportunidade de ter suas histórias resgatadas e  contadas com carinho. Mais do que isso, o documentário cumpre uma importante função de questionar o porquê desse arquivamento histórico e qual o peso da cor de suas peles nesse esquecimento.“Meus sonhos e minhas lutas começaram muito tempo antes da minha chegada, mas pra isso fazer sentido tem que contextualizar algumas paradas”, afirma Emicida.Apagamento Durante os 90 minutos de documentário, os espectadores têm a oportunidade de conhecer um pouco mais de Emicida: suas descobertas, referências e a condução de uma estética de rap que vai de encontro com o que é produzido de uma forma majotária hoje e não é visto com bons olhos pelo artista. “Estamos resgatando uma estética que tinha ficado para trás, com objetificação de corpos femininos, armas e drogas. Em todos os projetos de AmarElo, seja o disco ou os shows ou os documentários, eu falo sobre a importância de livros, de como eles mudam vidas e também são acessíveis para nós, pessoas pretas”, destaca Emicida, que lançou no mês passado seu segundo  livro infantil, E Foi Assim que Eu e a Escuridão ficamos Amigas.

Por mais contraditório que seja, os questionamentos intensos não trazem exatamente um desconforto a quem assiste. Com o seu carisma, Emicida faz com que a pessoa do outro lado da tela se sinta instigada e curiosa a responder as questões que ele levanta. Se temos um nome como Lélia Gonzalez, que deixou um legado tão grande para a nossa história e nosso entendimento  aqui no Brasil, por que motivos temos Angela Davis como a grande referência do femininsmo negro do nosso país? Essa pergunta, inclusive, é feita pela própria Davis.

No final das contas, assistir ao documentário AmarElo é bater de frente com uma dose generosa de carinho e amor para entender as vidas e as histórias pretas que contribuíram para a formação do Brasil e acabaram sendo apagadas em detrimento de outras mentes brancas - ou embranquecidas.  Uma série de tensões fortes, que embrulham o estômago em algumas ocasiões, mas no final das contas soa como aquelas broncas de pai e mãe: é para o nosso bem, e feito com muito amor.