Anestesista que dopou e estuprou parturientes também tirou delas direito de ver filhos nascerem

E do trauma dessas mães, quem é que vai cuidar?

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  • Da Redação

Publicado em 16 de julho de 2022 às 07:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: Reprodução

As mulheres estupradas pelo anestesista Giovanni Quintella Bezerra, além da violência sexual, também sofreram outras formas de agressão que deverão deixar sequelas em suas vidas. Elas foram sedadas e por isso dormiam durante o nascimento das próprias crianças, sendo privadas de ter o registro do momento. Também terão de abrir mão de amamentar para prevenir a possível contaminação de seus bebês por HIV, o vírus da Aids, ou outra doença transmossível pelo leite materno e que elas podem ter adquirido do agressor; além de sofrerem efeitos colaterais do coquetel profilático que evitará que elas próprias se contaminem. 

Uma das pacientes estupradas foi orientada a tomar o combinado de medicamentos e parar de aleitar o filho. A polícia, até a sexta-feira (15) já investigava 50 suspeitas de estupro cometidos pelo anestesista. Até a tarde de quinta-feira (14), eram 30. Os casos aparecem quase em progressão geométrica enquanto mais mães e seus familiares comparecem às delegacias para relatar as situações ocorridas nos plantões de Giovanni Quintella, a quem a delegada Bárbara Lomba, da Delegacia da Mulher de São João do Meriti (RJ), chama "criminoso em série". 

Quem vai cuidar do trauma dessas mães? É a pergunta que fica sem resposta enquanto mais casos suspeitos surgem. Giovanni só foi descoberto no dia 10 de julho porque a equipe de enfermagem do Hospital da Mulher de São João de Meriti gravou uma das cirurgias. A gravação foi feita depois que uma das enfermeiras, ao precisar trocar um bisturi, se deparou com a cena de um dos estupros cometidos por ele.

O Hospital da Mãe de Mesquita enviou à polícia uma lista de 44 nomes de mulheres que possivelmente fizeram parto com a participação do anestesista Giovanni Quintella. No início das investigações, foi dito que ele atuou em pelo menos 10 hospitais e em uma clínica de ginecologia e obstetrícia. Quantas mulheres de fato sofreram as agressões? Quantas mães esse médico privou de desfrutar o momento do nascimento das suas crianças? A maternidade, que já é um desafio em si, não deveria ganhar cores tão sombrias para essas mulheres.

Na sexta-feira (15), Giovanni Quintella Bezerra foi denunciado pelo Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (MPRJ), pelo crime de estupro de vulnerável, praticado contra uma das mulheres violentadas por ele no domingo (10), no Hospital da Mulher. Naquela noite foram três cesarianas que tiveram  a assistência desse anestesista e em pelo menos dois casos o estupro ocorreu: naquele que foi filmado pela equipe e no parto anterior, quando a enfermeira viu a cena e a partir daí a equipe resolveu gravar a cirurgia seguinte para ter provas na denúncia contra o médico.

Para os promotores do MPRJ, o crime contra a mulher grávida representa “violação do dever inerente à profissão de médico anestesiologista”. Como forma de preservar e resguardar a  vítima, o MPRJ pediu sigilo no processo e a fixação de indenização em favor da mulher em valor não inferior a 10 salários-mínimos. “Considerando os prejuízos de ordem moral a ela causados, em decorrência da conduta do denunciado”. 

Qual juiz vai estabelecer os prejuízos também de ordem psicológica dessas mães que, certamente, podem desenvolver algum tipo de estresse pós-traumático que afete, inclusive, a maternagem delas?

No texto da denúncia, os promotores entenderam que Giovanni Quintella Bezerra agiu de forma livre e consciente. “Com vontade de satisfazer a sua lascívia, praticou atos libidinosos diversos da conjunção carnal com a vítima, parturiente impossibilitada de oferecer resistência em razão da sedação anestésica ministrada”. Os promotores sustentam ainda que o denunciado “abusou da relação de confiança que a vítima mantinha com ele, posto que, se valendo da condição de médico anestesista, aproveitou-se da autoridade/poder que exercia sobre ela, ao aplicar-lhe substância de efeito sedativo”.

O Cremerj do Rio suspendeu o registro do médico e considera a cassação definitiva.

Marido questionou ordem para sair da sala

O marido de uma das mulheres que passou por uma cesariana enquanto o anestesista Giovanni Quintella Bezerra trabalhava no domingo (10), no Hospital da Mulher de São João de Meriti, questionou o motivo da esposa ficar sedada após o nascimento do filho.

A delegada Bárbara Lomba, titular da Deam, revelou que o homem ficou na sala de parto até o nascimento do filho, mas que depois, Giovanni Quintella disse que a mulher iria dormir um pouco e que esse procedimento era 'padrão'.

Ao receber a informação, o marido questionou por que ela iria dormir. “Ela vai dormir por quê? Ela estava falando comigo há pouco”, teria dito o marido ao anestesista.

"Então, ele [o marido] se manteve no corredor, já que ele conhece muitos de seus direitos. Mas, em seguida ele desceu para a enfermaria. Só na segunda-feira que ele viu o que aconteceu e disse que 'realmente estava desconfiando de alguma coisa estranha' — explicou a delegada Bárbara Lomba na quinta-feira (14), ao dar detalhes sobre o andamento das investigações.