Antes de ser morta, menina demonstrou alívio com prisão do pai

Em mensagens para amigos, ela também contou que presenciou o pai estuprar a tia

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  • Da Redação

Publicado em 17 de outubro de 2018 às 14:39

- Atualizado há um ano

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A estudante Letícia Tanzi, 13 anos, morta a facadas pelo pai no interior de São Paulo, falou com amigos sobre seu alívio quando ele chegou a ser preso, em junho deste ano. Horácio Lucas Nazareno matou a filha logo após sair da prisão, onde cumpria pena por estupro cometido em 2010. Ele ganhou direito de recorrer em liberdade quatro meses depois, voltou para casa e cometeu o novo crime. O suspeito segue foragido. 

"Isso aconteceu em 2010. Ele estuprou a minha tia, que é especial, irmã da minha mãe. A irmã da minha mãe, a outra, fez o processo do meu pai. Demorou, demorou e ninguém fez nada. Só fez e parou. Aí, depois de sete, oito anos, nem sei, tavam falando que meu pai tava foragido. Não, eles vieram aqui, não acharam meu pai e falaram que ele tava fugido. Mas não tava, ele tava sempre aqui. Mas não vieram mais procurar. Aí foi preso sexta-feira", diz Letícia, em áudio enviado para uma amiga na época em que o pai foi preso. O áudio foi divulgado pelo G1.

A adolescente conta que tinha 4 anos quando o pai estuprou a tia e que ela presenciou tudo. "Ele nem reagiu, ele sabe que é bosta, o que ele fez. Na época ele confessou depois. Eu tinha 4 anos e eu vi tudo. Ele fez na minha frente. Eu tenho ódio gigantesco dele por outros motivos também, não vem ao caso. Minha mãe me ligou de madrugada me contando. Na hora foi meio que um choque, mas ao mesmo tempo alívio (...) Minha mãe vai ter que gastar R$ 11 mil para tirar ele de lá. Eu não quero que ele saia, não quero, por mim ele que fique lá. Não sei se ele vai sair, porque vai ser um processo bem demorado, capaz dele ficar alguns anos lá. Eu sinceramente não quero morar mais em casa se ele voltar", conta.Quando o pai foi preso, Letícia fez nova acusação, afirmando que também foi estuprada por Horácio. Ao ser solto, o pai exigiu que ela tirasse a queixa. Como a adolescente se recusou, ele agrediu a mulher, que conseguiu fugir, e matou a filha.

Abusos Em outras conversas, Letícia conta para uma amiga que começou a ser abusada pelo pai em 2017, mas que sua mãe não desconfiava de nada. A amiga pergunta desde quando ela sofria os abusos e ela responde: "Ano passado". Depois, ela quer saber se "aconteceu tudo" e Letícia diz que sim. "Sua mãe nunca desconfiou?", quer saber a amiga. "Ela diz que não". 

Outro amigo conversa com ela e diz que Horácio parece ser uma boa pessoa. Letícia rebate. "Não é. Pode ter certeza. Tão legal que tá preso (...) Mas ele tem muito motivo para tá preso. Pedófilo", diz a jovem. Quando o amigo quer saber mais, ela revela que era abusada desde o ano passado. "Na frente dos outros ele era um amor comigo, mas quando minha mãe saia e eu ficava em casa sozinha com ele aí né...". Ela explica que o pai foi preso por outro caso, mas que depois disso foi procurada pelo Conselho Tutelar e revelou que também era vítima dele.

Dias depois da prisão do pai, em outra conversa, Letícia diz que se sente em paz com a prisão dele. Ela conta que muitas vezes Horácio chegava bêbado e batia na mãe. "Aqui em casa tá uma paz sem ele. Na moral. Pelo menos para mim tá. Ele quase me matou já. Eu já passei por tanta coisa. Ele nunca prestou", conta. Ela revela também que ainda não tinha contado para a mãe, nessa ocasião, que era estuprada pelo pai. "Eu não sei como contar para ela. Porque ela já muito mal". 

Vejas as mensagens:

O crime Um homem que foi solto após passar quatro meses preso por estupro é suspeito de matar a filha de 13 anos a facada na madrugada desta quarta-feira (3), em São Roque, no interior de São Paulo. Horácio Nazareno Lucas, 28 anos, estava preso desde julho como cumprimento da pena por estuprar a cunhada em 2012. Ele foi solto na terça (2), voltou para casa e matou a filha, segundo a polícia. O suspeito fugiu.

A polícia foi chamada até a casa da família para atender a uma situação de violência doméstica. No caminho, a equipe encontrou um menino de 6 anos pedindo socorro, afirmando que o pai tinha matado a irmã. Os PMs seguiram então com o menino até o local e já encontram Letícia Tanzi Lucas ferida na sala. Ela estava inconsciente e, mesmo socorrida, não resistiu aos ferimentos e morreu.

Horácio foi preso em julho, condenado por estuprar a cunhada, que tem problemas mentais. O crime aconteceu em 2012. O advogado pediu à Justiça para que ele respondesse em liberdade. A família também acusou Horário por abusos sexuais à própria Letícia - um boletim de ocorrência foi registrado depois que ele foi preso. Nas redes sociais, Horário postava muitas fotos com a família (Foto: Reproduçao) Na terça, o juiz deferiu o pedido da defesa e permitiu que o suspeito recorresse em liberdade. Ele voltou para casa ontem mesmo e ao chegar começou a brigar com a mulher por conta do boletim de ocorrência que ela registrou contra ele pelo abuso à filha. Horácio deu socos na mulher e ainda tentou esganá-la. Ela conseguiu fugir e foi buscar socorro na casa de um vizinho.

Horácio então trancou o filho de 6 anos no quarto e partiu para atacar Letícia, que estava na sala. Ele deu várias facadas na adolescente e depois fugiu por um matagal nos arredores. Assustado com os barulhos, o garoto conseguiu sair do quarto para a rua, onde se encontrou com a viatura da polícia que já seguia para o local e pediu socorro. A polícia entrou na casa, mas já achou Letícia sem vida.

Relato da mãe Tamires Tanzi, mãe da menina, falou sobre o crime. "Ele não pode ficar impune de novo, não. Matar a própria filha? Isso não se faz", afirmou. 

Logo que voltou para casa após ser solto, Horácio arrombou a porta para entrar. Apesar disso, ele não estava ameaçador, chegou tranquilo e pediu até desculpas à filha."Ele estava calmo, conversando. Até pediu desculpa para a filha dele. Eles se abraçaram e até choraram juntos", contaSó depois Horácio pediu que a filha retirasse a denúncia contra ele e quando ela se negou a calma dele foi embora. "Ele queria que ela mentisse, que ela falasse que ele não tinha feito nada com ela. Nisso ele foi ficando nervoso", lembra. A própria Tamires foi a primeira a ser agredida por Horácio. "Ele estava atrás de mim, com medo que eu ligasse para a polícia. Ele ficou nervoso porque eu tinha escondido o celular e, quando encontrou, ficou mais nervoso ainda. Ele me grudou pela garganta e depois me deu um murro no nariz", diz.

A mãe conseguiu fugir e foi para a casa de uma vizinha, onde chamou a polícia. Com ela fora da casa, o agressor trancou o filho de 6 anos em um quarto e partiu para cima da filha, que foi esfaqueada várias vezes. O menino ouviu que a irmã estava sendo atacada. Ele conseguiu escapar por outra porta do quarto que dá para uma área externa da casa. "Ele saiu e se deparou com a irmã em cima da cama. Ele saiu para a rua e encontrou a polícia, que já vinha subindo a rua. Foi ele que contou que a irmã estava ensanguentada em cima da cama que tem na sala. Eu cheguei depois e não me deixaram entrar", diz Tamires.

Ela diz que nem chegou a ver a filha ferida. "Nem vi a minha filha ferida. Agora meu sentimento é de culpa porque se eu não tivesse saído correndo de lá...não sei. Na hora do nervosismo a reação da gente não se explica. A minha reação foi sair correndo para pedir ajuda", afirma.

Ameaças Letícia tinha contado semanas antes do crime para a tia que o pai a ameaçou de morte caso ela denunciasse o estupro. Ela tinha medo de um possível retorno dele para casa. Mãe foi agredida mas conseguiu fugir A primeira denúncia contra Horário é de 21 de junho de 2010, quando, segundo a ocorrência, ele estuprou a cunhada, que tem problemas mentais, na frente de Letícia. A filha tinha então apenas 5 anos. Mesmo depois dessa denúncia, Tamires conta que ficou com Horário e o perdoou. Ele foi preso somente oito anos depois do caso. "Quando a polícia o prendeu fiquei até mal porque tinha passado tanto tempo já essa história. Mas, depois de um mês mais ou menos, eu descobri que ele estava abusando da minha filha, que era filha dele também", conta.

Quando descobriu os abusos contra Letícia, o Conselho Tutelar foi envolvido. "O Conselho Tutelar foi até a escola e lá ela contou tudo direitinho o que ele fazia. Ela tinha medo dele. Tinha medo de contar e ele fazer alguma coisa. Depois que fui chamada, fizemos a denúncia contra ele. Pensei que ele ia ficar um bom tempo lá. Continuei morando no mesmo lugar. Ele foi condenado, mas ficou quatro meses (preso)", lamenta.

O abuso contra Letícia foi descoberto depois de denúncia anônima durante o período de prisão do suspeito.