Após abusos, padrasto de Eva Luana é condenado a 35 anos de prisão

Thiago Oliveira Alves, 37, foi condenado por lesão corporal no âmbito da violência doméstica, tortura e estupro de vulnerável

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  • Da Redação

Publicado em 14 de agosto de 2019 às 23:20

- Atualizado há um ano

. Crédito: Marina Silva/Arquivo CORREIO

O padrasto da jovem baiana Eva Luana, 21 anos, que comoveu o país após relatar diversos abusos sofridos durante oito anos, foi condenado pela Justiça a 35 anos e 21 dias de reclusão em regime fechado e a um ano e três meses de detenção em regime aberto. A decisão foi publicada nesta quarta-feira (14), pelo juiz Ricardo José Vieira de Santana. O processo continua em segredo de Justiça.

Ex-assessor técnico da Secretaria Municipal de Habitação de Camaçari, Thiago Oliveira Alves, 37, foi denunciado pelo Ministério Público do Estado da Bahia (MP-BA) à Justiça e teve a prisão preventiva decretada em fevereiro deste ano. Ele foi condenado pelos crimes de lesão corporal no âmbito da violência doméstica, tortura e estupro de vulnerável.  Padrasto está preso preventivamente (Foto: Reprodução)  Relembre o caso A história da estudante de Direito de 21 anos, moradora de Camaçari, na Região Metropolitana de Salvador (RMS), chocou o Brasil no dia 19 de fevereiro deste ano. Ela, que é estudante de Direito, publicou um relato em seu Instagram, dividido em cinco partes (veja abaixo), sobre o pesadelo que viveu com o padrasto nos últimos oito anos. Estupros, agressões, torturas física e psicológica eram acontecimentos diários. 

CONFIRA O DEPOIMENTO DE EVA LUANA NA ÍNTEGRA

Eva falou diversas vezes sobre as consequências que sofria quando tentava defender a mãe - e vice-versa. A mãe dela também foi vítima das agressões. "Eu tive medo porque, todas as vezes que uma defendia a outra, tomava uma proporção muito grande. A gente (ela e a mãe) se segurava e falava: uma hora a gente vai conseguir", disse, emocionada, no programa Encontro, da Globo, no dia 25 de fevereiro.  Eva participou do Encontro com Fátima Bernardes (Foto: Divulgação/TV Globo) Controle Em depoimento à imprensa, Eva contou que Thiago tomou conta de tudo. Da família, da casa, da loja de materiais elétricos que a mãe dela tem em Camaçari. Isso logo evoluiu para o controle de tudo que ela fazia na vida. Para onde ia, quando ia, com quem ia, como se vestia. Ela era obrigada a mandar fotos, praticamente em tempo real, de todos os lugares onde estava.   (Foto: Marina Silva/Arquivo CORREIO) Aos 13 anos, quando decidiu denunciá-lo, foi com a mãe à delegacia. Estavam certas de que aquele terror acabaria. Antes de ir à polícia, porém, passaram a noite na casa de uma amiga que as apoiava. “Quando a gente estava na delegacia, ele foi para a casa dessa amiga. Invadiu a casa dela armado. Deu chute no portão e entrou com vários homens. E eu percebi: não posso ir para a casa de ninguém. O único lugar que eu tenho para ir é a delegacia. Só que ele me ameaçou, me fez retirar a queixa e eu não consegui dar prosseguimento a isso”, contou, em entrevista ao CORREIO, na manhã desta quarta-feira (20).Só que, a partir dali, as coisas só pioraram. A quase denúncia não deu em nada e resultou em ainda mais sofrimento. “Ali eu perdi a minha alma. E o que eu fui denunciar,  1 ano de sofrimento, se multiplicou em mais 8 anos”, narrou Eva, em seu Instagram.  Eva foi obrigada a estudar na mesma faculdade que o padrasto, que a vigiava (Foto: Marina Silva/Arquivo CORREIO) A sociedade achava que eles formavam uma família perfeita, mas a realidade era outra. Eva conta que foi obrigada a comer uma pizza tamanho família e beber dois litros de refrigerante em 10 minutos. Como não conseguiu, levou socos no rosto. Recebeu chutes até cair no chão. “Ele enfiou as pizzas na minha boca me chamando de animal, eu vomitei e comi meu próprio vômito.  Meu gato comeu um pedaço e lambeu outro, ele me obrigou a comer o que ele havia lambido. Eu apanhei a noite toda e no outro dia eu tinha que fingir que nada havia acontecido”, escreveu. Eva não podia ter amigos, muito menos namorado. O agressor tinha total acesso ao seu celular, inclusive às mensagens do WhatsApp. Todas as suas senhas eram monitoradas por ele. Durante os estupros, era agredida. Engravidou dele e abortou mais de uma vez. “Nunca pude ir ao médico pra fazer curetagem. Todas as vezes sangrava e passava mal a noite inteira. Já vi bebês inteiros no vaso sanitário”, diz. 

Todo o dinheiro da casa era entregue a ele. Houve noites em que foi forçada a dormir na casa da cachorra e em que passou horas sem comer. Tinha que ficar madrugadas inteiras em pé, até o dia amanhecer. Eva foi até mesmo obrigada a sair nua pela rua, à noite. O agressor dizia que era para ela ser estuprada por outros homens. 

Seis promotoras Para investigar o caso, o MP-BA chegou a designar seis promotoras para atuar na análise do inquérito – uma delas é Anna Karina Senna, substituta na 10ª Promotoria de Justiça de Camaçari. Em entrevista coletiva, a promotora Anna Karina disse que não poderia revelar a tipificação dos atos cometidos por Thiago. Ela lembrou, no entanto, alguns dos crimes já explícitos nos relatos de Eva nas redes sociais."Abuso sexual, ameaça, tortura, lesão corporal, são muitos os crimes, todos de grande gravidade. Não podemos revelar detalhes por determinação da Justiça, principalmente pela criança. Eva foi vítima de pelo menos seis crimes, a mãe, outros três, e contra a irmã da jovem, que também está como vítima no processo", afirmou.Preso Ao CORREIO, a delegada Florisbela da Rocha, titular da Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher (Deam) de Camaçari, informou que Thiago negou que tenha cometido qualquer um dos crimes. O padrasto já está no sistema prisional desde fevereiro.

Segundo a Secretaria de Administração Penitenciária do Estado (Seap), ele foi encaminhado ao Centro de Observação Penal, no Complexo Penitenciáiro da Mata Escura, em Salvador, e depois transferido para a Cadeia Pública, no mesmo Complexo, onde permanece custodiado. 

A exoneração de Thiago da Secretaria de Serviços Públicos de Camaçari foi publicada no Diário Oficial da cidade. Na publicação, assinada pelo prefeito Elinaldo Araújo, a prefeitura destaca que a exoneração ocorreu em 31 de janeiro. 

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{1} respira ♡ / a todos que me ajudaram até aqui, seja no "desaparecimento" ou agora, com os fatos verdadeiros, a minha eterna gratidão. Aos meus amigos de infância, que eu fui obrigada a abandonar um por um, preciso pedir perdão. Não vou citar nomes, mas quem está firme comigo sabe, eu vou retribuir com todo o meu amor e relembrar até a minha velhice. / Meu caos teve início quando eu tinha 12 anos, minha mãe era agredida,abusada,violada e torturada quase todos os dias. Meu padrasto era obsessivo e ciumento com ela. Resumindo de uma maneira geral, ela era agredida com chutes, joelhadas, objetos.. Era abusada sexualmente de todas as formas possíveis. Era obrigada a tomar bebidas até vomitar e quando vomitava tinha que tomar o próprio vômito como castigo. Ele começou a me abusar sexualmente. Eu tinha nojo, repulsa, ódio e não entendia porque aquilo acontecia comigo. Me sentia uma criança estranha e diferente das outras. Achava que aquilo só acontecia comigo. Eu tentei por diversas vezes ir para a casa da minha avó, mas ele sempre ligava ameaçando todos, dizendo que iria matar e fazer várias coisas assim. Então era uma prisão sem grade, literalmente. Quando eu fiz 13 anos denunciei. Nessa denúncia eu tinha certeza que seria salva por todos. Mas não foi isso que aconteceu. O Estado falhou a tal ponto que o meu caso não chegou nem ao Ministério público. Fui obrigada a retirar a queixa por ameaças do meu padrasto. Ele utilizou o poder financeiro pra comprar a liberdade e comprar a minha alma. Porque ali eu perdi a minha alma. E o que eu fui denunciar, 1 ano de sofrimento, se multiplicou em mais 8 anos. Desde então os abusos, torturas e todo tipo de agressão foram aumentando dia após dia, ano após ano. Eu não tive mais vida social. Tudo era uma farsa. Ele nos obrigava a fingir que tínhamos uma família perfeita. As agressões eram verbais, físicas e psicológicas. Entre elas comer muito, em tempo estipulado, isso aconteceu com uma pizza família, pra comer inteira em 10 minutos. Óbvio que não conseguimos.Tb tomar 2 litros de refrigerante nesses 10 minutos.. eu levei socos no rosto e ele não me deixava me proteger com a mão. Chutes até cair no chão

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Veja onde buscar ajuda em casos de violência doméstica:

Cedap (Centro Estadual Especializado em Diagnóstico, Assistência e Pesquisa) – Atendimento médico, odontológico, farmacêutico e psicossocial a pessoas vivendo com HIV/AIDS. Endereço: Rua Comendador José Alves Ferreira, nº240 – Fazenda Garcia. Telefone: 3116-8888. 

Cedeca (Centro de Defesa da Criança e do Adolescente Yves de Roussan) – Oferece atendimento jurídico e psicossocial a crianças e adolescentes vítimas de violência. Endereço: Rua Gregório de Matos, nº 51, 2º andar – Pelourinho. Telefone: 3321-1543/5196. 

Cras (Centro de Referência de Assistência Social) – Atende famílias em situação de vulnerabilidade social. Telefone: 3115-9917 (Coordenação estadual) e 3202-2300 (Coordenação municipal) 

Creas (Centro de Referência Especializada de Assistência Social) – Atende pessoas em situação de violência ou de violação de direitos. Telefone: 3115-1568 (Coordenação Estadual) e 3176-4754 (Coordenação Municipal) 

Creasi (Centro de Referência Estadual de Atenção à Saúde do Idoso) – Oferece atendimento psicoterapêutico e de reabilitação a idosos. Endereço: Avenida ACM, s/n, Centro de Atenção à Saúde (Cas), Edifício Professor Doutor José Maria de Magalhães Neto – Iguatemi. Telefone: 3270-5730/5750. 

CRLV (Centro de Referência Loreta Valadares) – Promove atenção à mulher em situação de violenta, com atendimento jurídico, psicológico e social. Endereço: Praça Almirante Coelho Neto, nº1 – Barris, em frente a Delegacia do Idoso. Telefone: 3235-4268. 

Deam (Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher) – Em Salvador, são duas: uma em Brotas, outra em Periperi. São delegacias que recebem denúncias de violência contra a mulher, a partir da Lei Marinha da Penha. 

Deam Brotas – Rua Padre José Filgueiras, s/n – Engenho Velho de Brotas. Telefone: 3116-7000. 

Deam Periperi – Rua Doutor José de Almeida, Praça do Sol, s/n – Periperi. Telefone: 3117-8217. 

Deati (Delegacia Especializada no Atendimento ao Idoso) – Responsável por apurar denúncias de violência contra pessoas idosas. Endereço: Rua do Salete, nº 19 – Barris. Telefone: 3117-6080. 

Derca (Delegacia de Repressão a Crimes Contra a Criança e o Adolescente) Endereço: Rua Agripino Dórea, nº26 – Pitangueiras de Brotas. Telefone: 3116-2153. 

Delegacias Territoriais – São as delegacias de cada Área Integrada de Segurança Pública. Segundo a Polícia Civil, os estupros que não são cometidos em contextos domésticos devem ser registrados nessas unidades. Em Salvador, existem 16 (http://www.policiacivil.ba.gov.br/capital.html). 

Disque Denúncia – Serviços de denúncia que funcionam 24 horas por dia. No caso de crianças e adolescentes, o Departamento de Ouvidoria Nacional dos Direitos Humanos oferece o Disque 100. Já as mulheres são atendidas pelo Disque 180, da Secretaria de Políticas Para Mulheres da Presidência da República. Fundação Cidade Mãe – Órgão municipal, presta assistência a crianças em situação de risco. Endereço: Rua Prof. Aloísio de Carvalho – Engenho Velho de Brotas. 

Gedem (Grupo de Atuação Especial em Defesa da Mulher do Ministério Público do Estado da Bahia) – Atua na proteção e na defesa dos direitos das mulheres em situação de violência doméstica, familiar e de gênero. Endereço: Rua Arquimedes Gonçalves, 142,  Jardim Baiano - Nazaré. Telefones : 3321- 1949/ 3328-0417 / 3266-4526

Iperba (Instituto de Perinatologia da Bahia) – Maternidade localizada em Salvador que é referência no serviço de aborto legal no estado. Endereço: Rua Teixeira Barros, nº 72 – Brotas. Telefone: 3116-5215/5216. 

Nudem (Núcleo Especializado na Defesa das Mulheres em Situação de Violência Doméstica e Familiar da Defensoria Pública do Estado) – Atendimento especializado para orientação jurídica, interposição e acompanhamento de medidas de proteção à mulher. Endereço: Rua Pedro Lessa, nº123 – Canela. Telefone: 3117-6935. 

Secretaria Estadual de Políticas Para Mulheres Endereço: Alameda dos Eucaliptos, nº 137 – Caminho das Árvores. Telefone: 3117-2815/2816. 

SPM (Superintendência Especial de Políticas para as Mulheres de Salvador) – Endereço: Avenida Sete de Setembro, Edifício Adolpho Basbaum, nº 202, 4º andar, Ladeira de São Bento. Telefone: 2108-7300. 

Serviço Viver – Serviço de atenção a pessoas em situação de violência sexual. Oferece atendimento social, médico, psicológico e acompanhamento jurídico às vítimas de violência sexual e às famílias. Endereço: Avenida Centenário, s/n, térreo do prédio do Instituto Médico Legal (IML) Telefone: 3117-6700. 

1ª Vara de Justiça Pela Paz Em Casa – Unidade judiciária especializada no julgamento dos processos envolvendo situações de violência doméstica e familiar contra a mulher, de acordo com a Lei Maria da Penha. Endereço: Rua Conselheiro Spínola, nº 77 – Barris. Telefone: 3328-1195/3329-5038.