Carnaval, só com o bloco da vacina

Prefeito suspende folia por tempo indeterminado e diz que festa só com vacinação

Publicado em 28 de novembro de 2020 às 07:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: Foto: Reprodução

Fevereiro sempre tem Carnaval na Salvador tropical, abençoada por Deus e bonita por natureza. Contudo, a era da pandemia transforma certeza em pausa, até mesmo para a maior folia de rua do planeta. Pela primeira vez na história recente, a festa mais esperada da capital baiana será suspensa. Não só no mês em que é realizada tradicionalmente, mas por prazo indefinido. Enquanto o bloco da vacina não estiver na frente da fila, o reinado de Momo permanecerá interrompido em 2021, anunciou o prefeito ACM Neto (DEM) na sexta-feira (27).    

"Trabalhei no limite do prazo para a tomada dessa decisão", afirmou Neto. "Pode acontecer em outro momento? Tudo vai depender da vacina", disse o prefeito, ao reafirmar que Carnaval no próximo ano está condicionado à existência de vacina acessível a todos. "Não há data prevista nesse momento", emendou. O anúncio de que o calendário tradicional da folia seria descartado não é exatamente uma novidade. Desde que a covid-19 iniciou sua trajetória ascendente no país, Neto já havia sinalizado a impossibilidade de manter o evento em fevereiro. 

A surpresa foi a decisão de suspender o Carnaval de 2021 indeterminadamente, já que existia expectativa de adiamento da data. A maior parte das especulações girava em torno do início do segundo semestre. Um dia antes de Neto anunciar a pausa na folia, a Secretaria de comunicação da prefeitura chegou a convocar a imprensa para a coletiva em que o prefeito lançaria o Carnaval, informava o texto enviado às redações por volta das 15h. Às 18h50, foi distribuído novo comunicado. Dessa vez, sem referência ao lançamento. Só ao anúncio. 

Além das incertezas sobre quando a vacina será realidade para os soteropolitanos, outro fator está ligado à suspensão do evento. Na coletiva de sexta, o balanço apresentado pela prefeitura aponta aumento de 21% no número de novos casos de covid na cidade e de 5% na taxa de ocupação dos leitos para pacientes com a doença, em comparação com a última semana epidemiológica. Para o prefeito, os dados demonstram que é preciso ter cautela e colaboração individual, especialmente  quanto às normas de prevenção e de distanciamento social.

Sinais “Por enquanto, nada sugere descontrole. A segunda onda ainda não chegou em Salvador, mas os números mostram um aumento de casos e, portanto, reforça esse cenário de atenção. O sinal amarelo continua aceso, mas ainda não há luz vermelha”, emendou Neto. Em um cenário de crescimento do vírus e de dúvidas quanto ao processo de imunização em massa na cidade, seria impossível realizar o Carnaval no início do ano e improvável que houvesse definição de datas agora, considerando a atuação do prefeito ao longo da pandemia. 

Não deu outra. Durante a coletiva, o prefeito disse que esperou até o fim de novembro para saber se haveria algum prazo de vacinação. "Ninguém será irresponsável de marcar data do Carnaval sem essa clareza", destacou Neto, que classificou a suspensão  como "duro golpe" para Salvador. Sobretudo, pelo enorme peso que a festa tem para a economia e para a geração de emprego e renda na capital.

Ao lado de Neto, o prefeito eleito Bruno Reis (DEM) também revelou tristeza com a suspensão. "Comunicar uma decisão como essa não é fácil, até porque sabemos da importância do Carnaval para nossa cidade. Só teremos como realizar (a folia) com condições sanitárias para isso", afirmou. No mesmo compasso, as festas populares de Verão, como a Lavagem do Bonfim e o 2 de Fevereiro, terão que aguardar o futuro. Mas a chegada da vacina pode salvar o Carnaval em 2021, em calendário conjunto com outras grandes capitais, como Rio de Janeiro e São Paulo, como sempre defendeu o prefeito.

Suspensão impacta negócio bilionário

A decisão de suspender o Carnaval está alinhada à principal justificativa da prefeitura para medidas duras adotadas desde o início da pandemia: salvar o máximo possível de vidas e evitar o colapso no sistema de saúde. Em contrapartida, prolonga o sacrifício enfrentado pela cadeia produtiva que gira em torno da folia.

“Carnaval é um evento único no ciclo anual. Muitas empresas têm apenas essa atividade. Para elas, a festa  é 100% da receita do ano”, afirma Joaquim Nery, diretor da Central do Carnaval, que representa diversos blocos e camarotes.

“Somente esses dois segmentos empregam 200 mil pessoas, alguns durante os dias do evento, outros desde novembro”, acrescenta Nery.

“É o período que os hotéis têm maior faturamento. Eles começam a se preparar para o Carnaval em dezembro, contratando funcionários a mais”, afirma o presidente da Associação Brasileira da Indústria Hoteleira na Bahia (Abih), Luciano Lopes.

Este ano, o Carnaval movimentou cerca de R$ 1,8 bilhão nos dias da festa. A estimativa da Secretaria Municipal de Cultura e Turismo (Secult) é de que o período atraiu 854 mil turistas para Salvador.

*Colaborou Marina Hortélio