Caso Mariana Ferrer teve tese de 'estupro culposo' e réu inocentado

Primeiro promotor concluiu que houve estupro de vulnerável; o que assumiu caso mudou entendimento

Publicado em 3 de novembro de 2020 às 13:46

- Atualizado há um ano

. Crédito: Reprodução

O empresário Andre de Camargo Aranha foi inocentado da acusação de crime de estupro contra a Mariana Ferrer, de 23 anos. A denúncia era de que o abuso aconteceu durante uma festa em boate de em Florianópolis (SC), em 2018, mas em setembro desse ano ele foi considerado inocente em primeira instância.

O Ministério Público de Santa Catarina (MP-SC) afirmou  na argumentação que o réu não teria como saber que a jovem não tinha condições de consentir com o ato sexual. o que reportagem do The Intercept Brasil, que divulgou  detalhes do caso, chamou de "estupro consensual", tornando o termo, que não foi citado pelo MP nem na sentença, viral. O site também publicou vídeo da audiência mostrando Mariana sendo atacada pelo advogado defesa. 

Com a versão apresentada em juízo, o MP voltou atrás, já que havia apresentado denúcia contra o empresário em julho de 2019, acusando André de estupro de vulnerável, seguindo o mesmo entendimento do inquérito policial, de que a jovem não tinha discernimento para consentir a relação. 

No meio do caminho, houve uma mudança de promotores. O promotor de Justiça Alexandre Pizza, que fez a denúncia, saiu voluntariamente para assumir outra promotoria, diz o MP, e entrou no lugar o promotor Thiago Carriço de Oliveira, que fez as alegações finais.

Para Carriço, não houve "dolo" na ação de Aranha. Ele argumentou que não havia como provar tecnicamente que a vítima estava sob efeito de drogas, já que os laudos técnicos não apontaram nenhuma substância. 

O promotor, portanto, concluiu que o fato ocorreu de fato, mas não era possível provar que a vítima estava incapaz, nem que o réu tinha conhecimento dessa possível incapacidade.

O juiz Rudson Marcos, em sentença de 9 de setembro, também concluiu que não havia certeza sobre se Mariana estava ou não com capacidade de oferecer resistência.

“Diante da ausência de elementos probatórios capazes de estabelecer o juízo de certeza, mormente no tocante à ausência de discernimento para a prática do ato ou da impossibilidade de oferecer resistência, indispensáveis para sustentar uma condenação, decido a favor do acusado André de Camargo Aranha”, diz o texto.

Ainda cabe recurso.

Advogado O video divulgado pelo site mostra o advogado Claudio Gastão da Rosa Filho exibindo cópias de fotos sensuais de Mariana, que era modelo profissional, como maneira de fortalecer o argumento de que o sexo que aconteceu foi consensual. Ele chama as imagens de "ginecológicas". Mariana responde. “Muito bonita (a foto) por sinal o senhor disse né, cometendo assédio moral contra mim, o senhor tem idade pra ser meu pai, o senhor tem que se ater aos fatos”, disse a jovem. “Graças a Deus eu não tenho uma filha do teu nível, graças a Deus, e também peço a Deus que meu filho não encontre uma mulher feito você”, rebate o defensor.

Ele também repreende o choro de Mariana em determinado momento: “Não adianta vir com esse teu choro dissimulado, falso e essa lábia de crocodilo”.

A jovem reclamou para o juiz. “Excelentíssimo, eu tô implorando por respeito, nem os acusados são tratados do jeito que estou sendo tratada, pelo amor de Deus, gente. O que é isso?”, diz. O juiz faz poucas intervenções, mas pede em um momento pausa para Mariana se recompor e tomar água. Veja:

Procurado pelo Intercept, o defensor disse que não ia comentar um processo sob segredo de Justiça, “principalmente em face de indagações descontextualizadas que revelam má fé e parcialidade”. A OAB de Santa Catarina diz que teve acesso à cópia do processo judicial e informou que oficiou o advogado Cláudio Gastão para prestar esclarecimentos sobre sua conduta na audiência do caso de Mariana.

Com a repercussão da matéria, a tag #justicapormarianaferrer foi parar nos temas mais comentados do Twitter no Brasil. Famosas se manifestaram sobre o assunto. Bruna Marquezine republicou a matéria do caso e lamentou. "'Estupro culposo', pqp", escreveu. “'Estupro culposo' não existe", declarou a cantora IZA. "Justiça por Mariana Ferrer", pediu Deborah Secco.

Rafa Kalimann escreveu um desabafo. "'Não teve a intenção de estupra-lá'. Ahn? Isso existe? Quantas ? Quantas vezes? Quantas vezes mais? Quantos outros medos? Quantas outras agressões? Quantos outros estupros 'sem querer'? Quanto tempo nós temos? Talvez nenhum. Não dá pra esse medo continuar.Quantas escondem o estupro ou a agressão or medo de expor e ninguém acreditar?", escreveu.

Relembre O empresário André de Carmargo Aranha foi absolvido pela Justiça da acusação de estuprar Mariana Ferrer dentro do beach club Cafe da la Musique, em Florianópolis, em dezembro de 2018. Mariana denunciou o caso pelas redes sociais - posteriormente, o Instagram dela foi retirado do ar pelo Facebook. O juiz Rudson Marcos julgou como improcedentes as denúncias da jovem. (Foto: Reprodução) Foram ouvidas 22 testemunhas, além da própria Mariana e de André. Ele inicialmente havia negado ter tido contato com a jovem, mas depois disse que teve um contato sexual com ela, mas não chegou a concretizar uma relação sexual.

Foram realizados seis exames periciais e uma ação de busca e apreensão dos equipamentos eletrônicos do acusado. A conclusão das investigações, que ocorreram em sigilo, é de que “não há provas contundentes nos autos a corroborar a versão acusatória”.

O caso veio a público quando Mariana compartilhou o relato no Instagram em maio do ano passado. Ela divulgou um vídeo do circuito de segurança em que aparece entrando e saindo do local em que teria ocorrido o estupro, prints de mensagens e áudios que enviou a amigas pedindo ajuda e uma foto do vestido que usava naquela noite, manchado de sangue.

Mariana também disse que registrou boletim de ocorrência e fez exame de corpo delito no dia seguinte ao ocorrido. Ela publicou prints do laudo pericial que confirmou a presença de sêmen na calcinha que usava. O sêmen tinha DNA compatível com o de André, segundo exames.